Driblando dificuldades

Com aulas em regime on-line, muitos estudantes tiveram problemas de acesso à internet e buscaram diferentes alternativas

Maria Eduarda Cardim
postado em 14/11/2021 01:00
 (crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)
(crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)

Em meio à pandemia da covid-19, a preparação para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que será realizado pela segunda vez este ano, agora em 21 e 28 deste mês, também mudou. Dificuldades extras foram adicionadas na rotina dos estudantes, que tiveram que driblar os desafios para se preparar para uma das principais provas do final do terceiro ano.

Um dos problemas enfrentados por candidatos que pretendem fazer o Enem deste ano foi a falta de internet ou dispositivos para acessar as aulas on-line. Foi o caso do aluno do terceiro ano do Centro de Ensino Médio Setor Leste Douglas Antunes Costa, 19 anos, que em 2020 teve praticamente apenas uma semana de aula presencial. "Moro com meu tio, que é militar, e viemos transferidos para Brasília. Cheguei em fevereiro do ano passado e tive apenas uma semana de aula presencial", conta.

Diante do ensino remoto, começaram as dificuldades. Sem acesso à internet e ao computador, Douglas teve que recorrer ao material impresso entregue pela escola. "A gente ficou esperando a liberação do apartamento funcional e morávamos com um colega do meu tio, que não tinha internet e nem computador", relembra. Na avaliação do estudante, o acesso ao material impresso ajudou na preparação para o Enem, mas o estudo por conta própria ficou prejudicado.

Em busca de uma vaga nos cursos de matemática ou de engenharia civil na Universidade de Brasília (UnB), Douglas contou com a ajuda de amigos, da família e da escola. "Peguei apostilas com amigos e estudei por elas. Contei com a ajuda do meu tio e este ano foquei nas matérias em que tive mais dificuldade no ano passado, como matemática, física e química", afirma. Além disso, ele acredita que o retorno do ensino presencial na reta final para o exame ajudará a dar mais confiança para realizar a prova.

A professora de língua portuguesa de turmas do segundo e terceiro ano do Centro de Ensino Médio Setor Leste, Carolina Ramos, 27 anos, relata que mesmo com acesso ao ensino remoto, os estudantes encontraram outras dificuldades no processo de estudo para o Enem. "Não basta só ter acesso à plataforma. Muita gente descobriu que não consegue prestar atenção tão bem sem estar ali na sala de aula, que não consegue fazer as atividades de maneira tão independente", observa.

Concentração

Mais de um ano afastada das salas de aulas presencialmente, a estudante do terceiro ano do Centro de Ensino Médio Setor Leste Barbara Gurgel Maurer, 18 anos, afirma que o maior desafio foi encontrar um espaço adequado para os estudos e ter concentração durante as aulas remotas. "Moro na Asa Sul, mas a minha casa é muito pequena e não tinha um local ideal para estudar como tenho na escola. Além disso, foi muito difícil por causa da concentração", disse.

Até mesmo a programação dos estudos ficou prejudicada. "Acho que com a pandemia aumentaram as incertezas sobre o futuro. Muitas provas foram canceladas, adiadas e ficamos muito inseguros com isso. Eu senti que fiquei muito perdida na programação dos estudos, e todos os meus amigos relataram isso também", analisa a estudante.

No ano passado, a prova do Enem foi adiada em decorrência dos casos de covid-19, e a edição de 2020 só foi realizada este ano. Para tentar se organizar, já que o ensino presencial só voltou a acontecer nas escolas públicas em agosto, Barbara relembra que utilizou ajuda de lives realizadas por cursinhos e conteúdos da internet. "Uma coisa boa desse período de ensino remoto é que tinha muitas lives. Antes, a gente já tinha acesso, mas aumentou muito o conteúdo dentro da internet e das redes sociais, e isso ajudou bastante", avalia a aluna, que pretende cursar Biologia na Universidade de Brasília (UnB).

Ajuda

Para amparar os alunos que sofreram com as dificuldades encontradas na preparação para o Enem, a professora Carolina se concentrou no preparo para a realização do exame. "Como professora de língua portuguesa, eu foco muito na ideia de que eles têm que saber ler e interpretar as questões. A prova do Enem não é tão conteudista, mas é uma prova cansativa, então, ensino técnicas para responder questões de múltipla escolha, entre outras coisas", contou.

A escola também se programou para realizar uma adaptação do currículo deste ano e realizar um reforço do conteúdo que os alunos podem ter perdido no ano passado. Além disso, uma preparação mental para a prova também foi foco das aulas da professora, que relembra aos alunos que todos passaram pela pandemia da covid-19 e tiveram diferentes dificuldades.

"Procuro estar presente e conversar com eles para saber como estão. A gente já teve aulas que foram quase sessões de terapia, onde eu perguntava como eles estavam, e quando começamos a fazer isso, eles foram percebendo que o que estavam sentindo era algo em comum com outros colegas", relatou Carolina.

 

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  • Barbara Gurgel considera que o maior desafio foi encontrar um espaço adequado para os estudos e ter concentração durante as aulas remotas
    Barbara Gurgel considera que o maior desafio foi encontrar um espaço adequado para os estudos e ter concentração durante as aulas remotas Foto: ED ALVES/CB/D.A.Press
  • desafio internet
    desafio internet Foto: Maurenilson Freire

Ensino remoto x dificuldades de acesso

Dificuldades encontradas pelos estudantes no ensino remoto durante a pandemia da covid-19.

No Brasil, cerca de seis milhões de estudantes, desde a pré-escola até a pós-graduação, não têm acesso à internet banda larga ou 3G/4G em casa e, consequentemente, não conseguem participar do ensino remoto.



Dos 780 mil adolescentes do ensino médio que não dispõem de internet em casa, 740 mil são da rede pública

Perfil dos estudantes sem internet

Dos 6 milhões de estudantes sem internet, a imensa maioria, 5,8 milhões, é aluno de instituições públicas de ensino

Os estudantes sem acesso são, majoritariamente, pessoas negras ou indígenas. Nos estabelecimentos públicos da educação básica, as crianças e os jovens negros e indígenas são mais de 70% dos estudantes sem acesso domiciliar à internet em banda larga ou 3G/4G

*O estudo foi feito com base na análise de dados da Pnad Contínua de 2018 (IBGE)

Fonte: estudo Acesso Domiciliar à Internet e Ensino Remoto Durante a Pandemia, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

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