Na trilha da carreira "certa"

Às vésperas do exame, especialistas reforçam que estudantes precisam ter calma e autoconhecimento para definir o futuro

Ana Maria Pol
postado em 14/11/2021 01:00
 (crédito: Maurenilson Freire)
(crédito: Maurenilson Freire)

Quando se é criança, tudo se torna bem mais simples. Nessas horas, a imaginação abre portas e cria infinitas possibilidades: viajar até a Lua, ter um emprego dos sonhos ou construir o próprio patrimônio. São expectativas que podem virar realidade, mas muitas continuam apenas sonhos. O fato é que os desejos só se realizam se a desafiadora pergunta que todos, cedo ou tarde, enfrentam, é respondida: "O que você quer ser quando crescer?". Para quem está no ensino médio, encontrar a melhor resposta para essa indagação não é uma tarefa fácil. Isso porque a proximidade de vestibulares e o medo da escolha não ser acertada podem gerar frustração ou desânimo. Às vésperas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), especialistas reforçam que a decisão não deve ser desesperadora. É preciso calma e autoconhecimento por parte dos estudantes.

A professora adjunta do Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB) Renata Muniz Prado explica que o processo de escolha diverge de pessoa para pessoa. "Uns têm mais facilidade, muitas vezes fundamentada em experiências prévias e maior conhecimento de suas características, interesses e planos de futuro. Conseguem lidar bem com as expectativas externas e não se influenciam por pressão de colegas ou familiares na escolha de um curso", diz. "Outras pessoas não tiveram tantas oportunidades para explorar as diversas opções de carreiras, refletir sobre o exercício de determinada profissão e sobre o seu impacto nas diversas dimensões da própria vida, portanto, podem ter mais dificuldade para tomar uma decisão, o que poderá gerar insegurança", acrescenta.

O recomendado é que o estudante busque, na hora de escolher a carreira, conciliar aspectos pessoais, da profissão e do mundo do trabalho. De acordo com Renata, a tomada de decisão pode ser influenciada por crenças que afetam o planejamento do futuro. "O conhecimento de características pessoais vai além de fatores relacionados a personalidade e habilidades, mas é importante identificar os aspectos motivacionais que envolvem interesses, cultura, valores pessoais e analisar crenças que podem influenciar as escolhas no dia a dia", ressalta.

A professora explica, ainda, que também é necessário discutir sobre expectativas em relação ao futuro e ao estilo de vida. "Busque conhecimento das carreiras e profissões atuais, mas sem desconsiderar uma reflexão sobre as profissões do futuro, das "infinitas" possibilidades de atuação em uma mesma área, além das habilidades e competências necessárias para exercer determinada profissão", explica. "Por exemplo, você pode estudar medicina e não atuar na clínica, mas, sim, trabalhar com pesquisa. Tanto as competências exigidas quanto o ambiente de trabalho e o estilo de vida são muito diferentes nesses dois casos, e estamos falando da mesma profissão", exemplifica.

Estudante do Centro de Ensino Médio Escola Industrial de Taguatinga (Cemeit) Raíssa Ribeiro Santos, 18 anos, conta que está no terceiro ano do ensino médio e que planeja cursar Design de Moda no Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb). "Desde muito nova gostei de desenhar vestidos, e a moda sempre me chamou a atenção. Sempre me vi trabalhando com isso. No ensino médio fiquei em dúvida entre outras coisas, mas a moda ainda é mais forte dentro de mim", pontua.

O sonho de Raíssa é poder abrir o próprio ateliê de vestidos de noiva. Para iniciar a busca por esse sonho, a estudante fará o Enem com o intuito de conseguir uma bolsa na instituição de ensino superior. "Acho que é importante ter em mente que você não precisa escolher o que quer imediatamente. Afinal, não é tão fácil assim. Mas conhecer a si mesmo e saber do que você gosta ajuda bastante. Entender que mesmo que não saiba fazer tudo, é possível. Basta gostar da área e ter dedicação", defende.

Além do interesse pela área, a estudante conta que decidiu fazer um teste vocacional, por indicação de amigos. "Tenho mais aptidão em ciências humanas e linguagens, códigos e suas tecnologias, e muita dificuldade em matemática e ciências da natureza. Decidi fazer um teste vocacional por indicação de alguns amigos que disseram que os ajudou e que fez com que tivessem certeza do que queriam", conta.

Ajuda vocacional

Assim como Raíssa, diversos estudantes recorrem a testes vocacionais, também conhecidos como orientação profissional, que têm como objetivo descobrir qual carreira tem mais a ver com o estudante e promover o autoconhecimento. Trata-se de um teste com uma série de perguntas objetivas e de múltiplas escolhas, que trabalha com estímulos na hora de pensar valores pessoais, interesses e talentos.

A professora de psicologia do Iesb e orientadora de carreira Camila Costa Torres explica que o teste não tem efeito em apenas uma sessão. "Os testes são uma ferramenta, não devem ser aplicados isoladamente. Eles devem compor um processo de avaliação e análise para orientação profissional. Então, não é interessante que o estudante faça um teste isolado. É importante que seja um processo, com orientadores profissionais na escola, ou psicólogos", explica.

A psicóloga oferece esse tipo de orientação e explica que é um trabalho realizado em mais de uma sessão. "Eu trabalho com um processo que dura entre seis e sete semanas, para a pessoa fazer uma análise de si mesmo, um aprofundamento no autoconhecimento. A partir daí, buscamos as possibilidades de escolha, segundo os interesses, possibilidades e perspectivas da pessoa e do mercado. Eu sigo uma abordagem de carreira como construção de vida", conta. De acordo com Camila, o processo pode ser acompanhado tanto com profissionais da pedagogia/educação ou psicologia. "Os testes, geralmente, são de personalidade, interesses e aptidões e são aplicados exclusivamente por psicólogos, mas a orientação pode ser feita por profissionais da educação", ressalta.

Segundo Camila, o estudante deve compreender que a escolha de profissão não é algo definitivo. "Hoje, já se sabe que o ser humano pode atuar em mais de uma profissão ao longo da vida e ter uma carreira diversificada. Os jovens devem compreender que isso é apenas uma fase e que essa escolha não é um caso de vida ou morte, por exemplo. É preciso calma, serenidade, e cabe à família, aos pais, ajudarem nesse processo de escolha, sem depositarem seus anseios e sonhos de carreira em cima desse jovem", completa.

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    Professora Renata Muniz ressalta que uma profissão pode ter "infinitas" possibilidades de atuação Foto: UnB Pesquisa
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    Raíssa Ribeiro Santos planeja cursar design de moda no Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb) Foto: Arquivo Pessoal

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Antes de decidir, avalie o que você sabe sobre si, suas opções dentro da diversidade de opções de carreira em uma mesma profissão, como se dá o seu processo decisório, como se sente e o que pensa ao tomar uma decisão;

Busque oportunidades para aprofundar o conhecimento de si e desenvolver habilidades para tomada de decisão;

Reflita sobre a sua cultura, pensamentos, emoções e relacionamentos e de que forma eles estão influenciando as tomadas de decisões;

Explore as áreas de interesse por meio de atividades culturais, sociais e extracurriculares;

Além do projeto de vida ou de futuro, exercite as habilidades necessárias para desenvolver e implementar um plano de ação que envolva sua escolha profissional com metas de curto, médio e longo prazo;

Avalie o plano após sua execução e verifique o que aprendeu com as consequências dele;

Busque ajuda, se necessário, pois essa reflexão pode ser enriquecida pela sua rede de apoio com familiares, educadores e orientadores escolares;

*Fonte: Renata Muniz Prado, professora adjunta do Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB)

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