A mais longa Copa Libertadores da história terá a final, hoje, às 17h, no Maracanã, para recompensar com o título o sobrevivente de uma temporada muito conturbada e desafiadora. O fôlego e a preparação física de Palmeiras e Santos serão fundamentais para suportar o calor de quase 40ºC do Rio de Janeiro e definir quem será capaz de conquistar o título mais importante da América do Sul. Campeão em 1999, o Palmeiras luta pelo segundo troféu. Tricampeão em 1962/63 e 2011, o Santos pode se tornar o clube brasileiro com mais títulos continentais.
A decisão coloca frente a frente rivais bastante íntimos. As duas equipes se enfrentaram três vezes na temporada e fazem, agora, um confronto inédito pela competição continental.
O novo coronavírus fez a atual edição Libertadores ter mais de um ano de duração. A fase prévia da competição teve início em 21 de janeiro do ano passado. A pandemia levou o torneio a ser paralisado por seis meses, tempo suficiente para jogadores saírem, treinadores mudarem e clubes terem problemas. Os dois finalistas encararam todas essas duas situações, com a agravante de passarem por surtos de covid-19.
Os técnicos Abel Ferreira, do Palmeiras, e Cuca, do Santos, foram infectados pela doença. O santista teve um quadro mais grave e chegou a ficar internado. Ambos assumiram os cargos durante a competição e tiveram de lidar com desfalques rotineiros e a agenda apertada de compromissos.
Nos bastidores, problemas financeiros causados pelos portões fechados, redução salarial e até um impeachment no Santos fizeram da caminhada até a final ser uma campanha de sobrevivência. “Dentro de todos os problemas que tivemos, e não foram poucos, até financeiros, mas ficamos alheios. Tivemos paciência e confiança nas pessoas sem nunca reclamar de nada”, disse Cuca, ontem, no Maracanã, em referência ao atraso salarial encarado pelo clube.
O português Abel Ferreira pode conseguir o primeiro título da carreira e afirmou que, diante dessa possibilidade, não pretende mudar de estratégia. “Não vou me preparar de forma diferente. Vou seguir os mesmos rituais e acreditar naqueles que tenho que acreditar: os jogadores”, disse.
Chance única
Para os jogadores, estar na final depois de tantos percalços significa a chance de entrar para a história. O título rende outros benefícios. Em uma temporada de tanta crise financeira, a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) vai pagar o prêmio de R$ 81 milhões ao campeão. Quem vencer, poderá ainda disputar o Mundial de Clubes, no mês que vem, no Catar, e a Recopa Sul-Americana.
Nos últimos dias, as equipes intensificaram os treinos de cobranças de pênaltis. A decisão pode ir para as penalidades em caso de empate no tempo normal e na prorrogação. Nos três clássicos entre Santos e Palmeiras, em 2020, foram dois empates e uma vitória alviverde.
Os capitães vivem a expectativa de erguerem a taça e se eternizarem nas fotos do título. O zagueiro paraguaio Gómez, do Palmeiras, afirmou que quer ser campeão para prestar uma homenagem ao país natal. “Quando cheguei ao Palmeiras, meu sonho era ganhar a Libertadores. E vou fazer o melhor para deixar em evidência também o meu país”, disse.
O volante Alison, do Santos, recuperou-se há poucos dias da covid-19 e quer coroar o retorno ao time com o título. “Somos privilegiados. Olhando para essa final, a resposta é que vale a pena acreditar em um sonho, por mais difícil que seja”, afirmou.
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Vozes contra o racismo no futebol
Depois de um ano em que esportistas se engajaram na luta antirracista em todo o mundo, a final da Copa Libertadores, provavelmente, será decidida por artilheiros que também falam grosso contra o racismo. Vítima de injúria racial no ano passado, o atacante santista Marinho tornou-se quase um ativista contra a discriminação. A luta dele está até nas chuteiras que calça. O centroavante palmeirense Luiz Adriano usa as experiências dolorosas que viveu no Leste Europeu para marcar posição, principalmente nas redes sociais.
Para Marinho, a ferida ainda não cicatrizou. Em julho do ano passado, o alagoano de Penedo foi vítima de injúria racial na derrota do Santos para a Ponte Preta, por 3 a 1. Durante a transmissão da partida pela rádio Energia 97 FM, o repórter Fabio Benedetti disse que falaria “você está na senzala” ao jogador como castigo pelo cartão vermelho ainda no primeiro tempo. Por conta do episódio, o radialista acabou demitido.
Marinho desabafou nas redes sociais. “Fiquei muito mal com isso, chorava muito. Nunca tinha sentido isso tão forte assim. Aconteceu comigo quando não tinha voz ativa. Quando aconteceu esse episódio, agora, doeu. Sei que tem muita gente sofrendo no oculto, gente que não pode falar, não tem voz. É um crime”, afirmou o santista em vídeo. Marinho disse que perdoou o radialista, mas que o profissional ainda terá de “pagar pelo que fez”.
Luiz Adriano tem uma atuação antirracista mais centrada nas redes sociais. Reserva no título mundial do Internacional em 2006, ele se transferiu para o Shakhtar Donetsk, em 2007, onde atuou a maior parte da carreira. Foi no Leste Europeu que o centroavante, 33 anos, uma das principais estrelas do futebol russo, aprendeu a lidar com o racismo.
Em 2014, quando defendia o Shakhtar Donetsk, marcou cinco gols na goleada por 7 x 0 diante do Bate Borisov pela Liga dos Campeões. A torcida adversária passou a imitar macacos quando o brasileiro pegava na bola. Como punição, o clube foi obrigado a jogar a partida seguinte com portões fechados. Quatro anos depois, o próprio Shakhtar o comparou a um chocolate derretendo, quando o atacante estava treinando e suando, sob o sol.
“É inadmissível passar por qualquer tipo de preconceito e é inadmissível qualquer ser humano sofrer isso na pele. O mundo ainda precisa mudar muito e as pessoas precisam aprender que não existem diferenças, sejam elas raciais, de gênero ou classe social. Nada justifica. Fico feliz em ver que as pessoas estão falando, sendo mais conscientes e defendendo a causa”, declarou o palmeirense.