ELIMINATÓRIAS

Nota de repúdio

Seleção divulga "Manifesto de Assunção" contra a condução da realização da Copa América pela Conmebol, diz que não pretendia tornar a discussão política e jogará torneio no Brasil. Estreia será em Brasília

A promessa foi cumprida. Após dias de suspense e silêncio, os jogadores da Seleção Brasileira manifestaram-se, ontem, sobre a transferência da Copa América para o país. Depois do apito final da vitória sobre o Paraguai, por 2 x 0, os convocados publicaram texto nas redes sociais. Em síntese, fizeram críticas à Conmebol sobre a forma como a competição veio parar no país e não se negaram a disputar o torneio.

Na madrugada de domingo, o Blog Drible de Corpo, do Correio, revelou que fontes da CBF bancavam a participação do Brasil na Copa América sob a batuta de Tite, que não seria demitido. Informava, ainda, que os jogadores fariam manifesto inspirado no velho movimento Bom Senso FC.

Inicialmente, a principal competição de clubes do futebol sul-americano seria realizada em conjunto por Argentina e Colômbia. Os argentinos desistiram devido ao quadro da pandemia de covid-19 no país. No caso colombiano, a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) decidiu retirar a Copa América do país devido à convulsão social promovida pela população nas últimas semanas. Os protestos começaram por causa do aumento de impostos.

No Brasil, o torneio será disputado em cinco estádios: Mané Garrincha, em Brasília, Olímpico, em Goiânia, Arena Pantanal, em Cuiabá, Nilton Santos e Maracanã, ambos no Rio de Janeiro. A competição será disputada de 13 de junho a 10 julho. A partida inaugural será entre Brasil e Venezuela, na capital federal. Além da estreia, a cidade receberá sete jogos da Copa América: quatro serão válidos pela primeira fase, enquanto outros três serão na etapa mata-mata.

Nas Eliminatórias, o Brasil segue na liderança isolada. O time do técnico Tite soma 18 pontos, com 100% de aproveitamento. A vitória de ontem, com gols de Neymar, aos três minutos do primeiro tempo, e Lucas Paqueta, aos 47 do segundo, quebrou tabu de 35 anos. O último triunfo brasileiro sobre o Paraguai em Assunção havia ocorrido em 1985. Na ocasião, venceu os paraguaios por 2 x 0, gols de Casagrande e Zico. O desempenho invicto da Seleção alcançou, ainda, outra marca histórica. As seis vitórias seguidas igualaram a campanha inicial do time canarinho na seletiva para a Copa do Mundo do México, em 1970.

A convocação da Seleção para a disputa da Copa América será hoje. O técnico Tite pretende manter os 23 nomes envolvidos na disputa da rodada dupla das Eliminatórias Sul-Americanas para a Copa do Mundo. Somente imprevistos ocasionados por lesões alterarão a lista. Cortado por lesão muscular, Thiago Silva pode voltar ao grupo se estiver recuperado. Neste caso, Rodrigo Caio, em observação por dores no joelho direito, seria cortado.

“Por diversas razões, sejam elas humanitárias ou de cunho profissional, estamos insatisfeitos com a condução da Copa América pela Conmebol, fosse ela realizada tardiamente no Chile ou no Brasil. Todos os fatos recentes nos levam a acreditar em um processo inadequado para sua realização. Somos contra, mas nunca diremos não à Seleção”

Manifesto dos jogadores da Seleção Brasileira

Argentina vacila
Em jogo com público de 10 mil torcedores que tinham de exibir o comprovante de vacinação contra a covid-19 na entrada do Estádio Metropolitano, a Argentina abriu
2 x 0 contra a Colômbia, em Barranquilla, mas cedeu empate por 2 x 2, em Barranquilla. Cristian Romero e Paredes marcaram para os bicampeões mundiais e Muriel e Borja igualaram o placar. Em casa, a Venezuela arrancou 0 x 0 com o Uruguai. Depois de perder para o Brasil na última sexta, o Equador amargou mais um revés, agora diante do Peru, por 2 x 1. Em Santiago, Chile e Bolívia empataram por 1 x 1. Pulgar e Marcelo Moreno marcaram.


"Reflexos podem ser severos"

A Fifa monitora possíveis inteferências do presidente da República, Jair Bolsonaro, na CBF, entre elas, a suposta pressão pela troca do técnico Tite por Renato Gaúcho e para que a Seleção Brasileira dispute a Copa América, a partir de domingo. O presidente afastado da entidade máxima do futebol brasileiro, Rogério Caboclo, nega, mas teria prometido a Bolsonaro, no último domingo, mudanças no comando da Seleção. Qual seria o castigo imposto ao Brasil se houver prova da intervenção? Por que a Fifa está acima dos diferentes sistemas de governo dos 209 países filiados e não aceita intromissões? Este é o tema da entrevista com Marcio Suttile, advogado trabalhista especializado em futebol da Suttile & Vaciski Advogados.

Por que a Fifa não aceita interferência estatal nos filiados?
A Fifa está presente em mais de 200 países e tem sua sede na Suíça. Imagine que esses mais de 200 países tenham seus mais diversos regimes: democráticos, monárquicos, ditatoriais, teocráticos… Ela (Fifa) existe como um instrumento em um órgão só. Único. Ela se autoadministra. Tem que existir independentemente de onde está fixada.

É um mecanismo de proteção.
A forma que ela tem para se proteger e continuar existindo da forma como ela é, prevista em seu estatuto, é coibindo qualquer tipo de ingerência de qualquer tipo de governo que seja. Isso não quer dizer somente o nosso (sistema) de governo. Recentemente, tivemos algumas punições a seleções que foram excluídas de competições, campeonatos e jogos eliminatórios da Copa do Mundo. A Espanha, em 2018, correu risco de não disputar a Copa da Rússia.

Qual é o contra-ataque da Fifa quando sente-se invadida?
No momento em que a Fifa implementa essa norma nesses mais diversos países, e ela coíbe qualquer tipo de ingerência, influência ou pressão dos governos, ela pune as federações ou confederações que são extensões dela de duas formas: suspendendo a federação ou a confederação ou excluindo conforme a gravidade do que acontece.

O mandatário afastado da CBF, Rogério Caboclo, teria prometido, ainda no cargo, ao presidente Bolsonaro, a troca de Tite por Renato Gaúcho. O dirigente nega. Outros governistas fizeram pressão, como o vice-presidente Hamiton Mourão. Qual é o impacto?
No caso em que o Bolsonaro estaria pressionando o presidente (Rogério Caboclo) para que retirasse o Tite depois da declaração de achar inoportuna a realização da Copa América, em vista do momento pandêmico em que vivemos, existem muitos indícios a respeito disso, mas não há prova contundente de que o presidente (Bolsonaro) exigiu essa alteração de técnico.

E se a prova aparecer?
Se vier à tona por meio de uma gravação ou de uma própria declaração que o Tite dê, ou ter ouvido do presidente Caboclo que estaria sendo pressionado pelo Bolsonaro a substituí-lo, por exemplo, não tenho dúvida de que a Fifa poderia punir a CBF.

Qual seria o castigo?
A exclusão não é o caso, porque teria de ser um ato muito grave. A suspensão é uma punição que fica em aberto. O grau e a forma não estão bem definidos no estatuto. A intensidade será definida depois pelo conselho, conselho de ética, por quem vai julgar. Ela pode, sim, resultar na exclusão da Seleção das Eliminatórias, consequentemente da Copa do Mundo, e pode afetar os clubes, proibindo-os de participar de Libertadores, Copa Sul-Americana…

Tudo com base em provas.
A punição vai decorrer necessariamente de uma prova, de um fato que tenha a base dele como forma concreta. Indícios não são suficientes. No caso da declaração do presidente Caboclo de que trocaria, a mando do presidente ou a pedido, Tite por Renato Gaúcho, nós não temos uma prova concreta. Se vier, sim, e os reflexos podem ser bastante severos e drásticos para o futebol brasileiro. A Fifa faz isso para manter-se uníssona, igual em todos os países. Justa, portanto, pois aí ela atua sob uma mesma legislação em todos os países do mundo e aplica uma autogestão.

A Fifa é praticamente imune ao judiciário…
Tanto é que ela foge do judiciário. Ela evita, proíbe que as questões que envolvam os clubes sejam levadas à Justiça comum. Tem órgãos próprios de julgamento, toda uma estrutura que prevê o processo legal: levantamento de prova, contestação, defesa, sentença e recurso.

Quais federações ou confederações foram castigadas recentemente?
A gente já viu recentemente países que sofreram punições por interferência política com sua suspensão dos campeonatos, inclusive das Eliminatórias que estavam disputando, e com consequências drásticas. O futebol para um país, em última instância, é a Copa do Mundo. Chade e Mali por interferência governamental e o Paquistão por violação a outros artigos do estatuto da Fifa.

Aquele argumento antigo, batido, de que o Brasil é o país do futebol, o único pentacampeão do mundo, que a camisa pesa e por aí vai, amenizaria a barra?
O fato de o Brasil ser o Brasil, ao contrário do que se pense, não aliviaria a pena, multa ou tamanho do tipo de suspensão ou de exclusão. A Fifa utilizaria o Brasil com efeito acadêmico para mostrar a mais de 200 países que estão de olho nesse fato que a permissividade a qualquer membro de governo na instituição gera punições, inclusive, no Brasil. A Espanha, por muito tempo, não foi punida (o Conselho Superior do Esporte teria influenciado na eleição da Federação Espanhola).