Tóquio — A pequena Rayssa não parava quieta. No Ariake Urban Sports Park, ela brincava, dava risadas com as amigas e ia de um lado para o outro enquanto não podia ocupar a pista de skate. “Arigatô”, agradecia, entre risos e num japonês improvisado, quem lhe ajudava. De tão à vontade que estava, parecia andar em casa — ou, quem sabe, nas ruas de Imperatriz, cidade do interior do Maranhão onde nasceu. Aos 13 anos, a pressão por ser a única brasileira na final do street não a incomodava. Ela se divertia, aproveitava cada momento. E foi assim, leve, que a Fadinha voou até o segundo lugar do pódio e conquistou a prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Ninguém nascido no Brasil foi medalhista com tão pouca idade.
“Não caiu a ficha ainda de poder representar bem o Brasil, de ser uma das mais novas a ganhar uma medalha. Estou muito feliz. Este dia vai ser marcado na história”, disse, sorridente, minutos depois de receber a medalha. Acima dela estava apenas a tímida e introspectiva japonesa Momiji Nishiya, apenas cinco meses mais velha. Aos 16, Funa Nakayama, também do Japão, completou o pódio ao ficar em terceiro lugar.
“Eu tento me divertir ao máximo. Tenho certeza de que, quando você se diverte, as coisas fluem. Deixa acontecer naturalmente, se divertindo, estar dançando ali, é muito engraçado. A gente fez um TikTok, ficou dançando ali, se divertindo. Eu tento, ao máximo, ficar mais leve, não pegar toda essa pressão”, contou Rayssa, quase tão familiarizada às câmeras e microfones quanto com as pistas.
A garota tem 13 anos e 203 dias e agora detém o recorde de atleta brasileiro mais jovem a subir num pódio olímpico. Antes, a marca era de Rosângela Santos, que foi bronze no atletismo nos Jogos de Pequim, em 2008, aos 17. A Fadinha também é a mais jovem do Brasil a disputar a Olimpíada. Ela superou Talita Rodrigues, finalista no 4x100 livre em Londres (1948), quando estava prestes a completar 14.
A história olímpica é recheada de incongruências e incertezas, especialmente nos primeiros anos, em que os registros não eram tão precisos. Oficialmente, porém, Rayssa se tornou a 10ª medalhista mais jovem dos Jogos Olímpicos da Era Moderna, iniciada com as competições de Atenas, em 1896. A brasileira superou a estadunidense Elizabeth Ryan, que, aos 13 anos e 221 dias, conquistou o bronze na natação em Berlim (1936).
O feito se torna ainda mais significativo, já que os nove medalhistas mais jovens que Rayssa alcançaram o pódio em edições realizadas até a década de 1930, quando os Jogos Olímpicos ainda não tinham o nível de competitividade atual. A maranhense, portanto, é a mais nova a ir ao pódio nos últimos 85 anos.
São vários os casos de crianças ou adolescentes no principal evento esportivo do planeta. O mais jovem medalhista da história foi o grego Dimitrios Loundras, que, aos 10 anos e 218 dias, ajudou o time a conquistar o bronze nas barras paralelas nos Jogos Olímpicos de 1896, em Atenas. Ele serviu o Comitê Olímpico Grego, mas nunca mais voltou a disputar a competição.
Representatividade
O skate feminino brasileiro chegou a Tóquio com outras duas candidatas a medalha no street: Pâmela Rosa e Letícia Bufoni. A dupla, porém, foi eliminada ainda na fase preliminar. Coube a Rayssa a missão de representar as mulheres brasileiras na final.
“É muito importante pra mim saber que minha história e de outras skatistas quebraram o preconceito e a barreira de quem falava que skate era só para menino. Saber que a gente está aqui... Eu posso segurar uma medalha olímpica!”, vibrou, segurando-a para que não batesse em lugar algum. “Misericórdia, não arranha não!”, riu.
A agora amiga e adversária Letícia Bufoni, aliás, foi a primeira inspiração da Fadinha, anos atrás. “Saber que todas as meninas mandaram mensagem no Instagram falando que começaram a andar de skate ou que os pais deixaram andar de skate por causa de um vídeo meu... Eu fico muito feliz, porque foi a mesma coisa comigo. Eu mostrei um vídeo da Letícia andando de skate ao meu pai e ele me deixou andar”, contou.
Rayssa ganhou o mundo muito antes de conquistar a prata. Em 2015, quando tinha apenas sete anos, a garotinha apareceu num vídeo, fantasiada de fada azul, tentando executar um heelflip, manobra considerada difícil no esporte. Após várias tentativas, ela conseguiu. E as imagens ganharam o mundo muito em função de uma lenda viva do skate: o estadunidense Tony Hawk, que está em Tóquio.
“Toninho, meu amigo. Nós nos vimos só duas vezes hoje (segunda). Ele estava passando de skate e a gente deu ‘oi’. Eu tinha pedido uma água para um carinha da água e ele chegou, deu e falou ‘good Luck (boa sorte)’ e falou para eu quebrar a pista. Acho que quebrei ali, não sei (risos). Fico muito feliz por ter a lenda, que me inspira todos os dias, saber que ele gosta muito de mim e postou meu vídeo. É muito gratificante para mim”, disse.
Passados seis anos, Rayssa saiu das pistas de Imperatriz para brilhar no Japão. Em terras nipônicas, ela conquistou a prata e o carinho do público brasileiro com vídeos divertidos e carismáticos. Depois de receber a medalha, a garota se assustou com o número de seguidores que havia ganhado nas redes sociais. Em 24 horas, passou de 1 milhão para 2 milhões de fãs.
“Quê!? O que é que é isso, minha gente!? Não sabia não”, assustou-se ao ser avisada da marca por um repórter. “Eu quero ter um tempinho para olhar e falar com os meus pais, que alugaram uma chácara para poder assistir. Colocaram um telão para me ver andando de skate. Quero muito ver. Desde que eu comecei nas minhas redes sociais, sempre foi um sonho ter o meu primeiro milhão (de seguidores). Ontem, ganhei meu primeiro milhão. Hoje, já tenho dois!? O que é isso!?”.
Com a medalha no pescoço e um sorriso sem tamanho, Rayssa se despediu dos jornalistas com a naturalidade que lhe caracteriza: “Beijinho para vocês, tenho que ir para o (exame de) doping”. Saiu leve, voando, pronta para contar aos seus amigos de escola como foram as brincadeiras do outro lado do mundo.
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Bronze de Scheffer encerra jejum da natação
O brasileiro Fernando Scheffer surpreendeu ontem à noite, pelo horário de Brasília, ao faturar a medalha de bronze na prova dos 200m livre nos Jogos de Tóquio. O nadador gaúcho, da cidade de Canoas (RS), não estava entre os favoritos, mas cresceu nos metros finais e conquistou o terceiro lugar, com o tempo de 1min44s66.
Ele só ficou atrás da dobradinha britânica, formada por Tom Dean e Duncan Scott, que era o grande favorito. Os medalhistas de ouro e prata completaram a distância em 1min44s22 e 1min44s26. Scheffer registrou o melhor tempo de sua carreira, cravando o novo recorde brasileiro e sul-americano da prova. Nas semifinais, ele havia anotado 1min45s71.
“Não pensei em tempo ou colocação. Só queria fazer a minha prova. Tentar colocar na água tudo o que treinei e nadar feliz, em cada braçada, aproveitando cada metro. É uma sensação muito especial. Parece que eu estou sonhando ainda”, disse o novo medalhista brasileiro, em entrevista ao canal SporTV.
“A gente sempre se prepara pensando na medalha, mas eu tento, quando chega na competição, tirar toda a cobrança possível. Nadar sem me cobrar, sem querer me botar essa pressão de resultado. Nado querendo fazer o meu melhor na hora. E realmente é muito difícil colocar isso na hora certa. Mas treinamos para isso e conseguimos fazer na hora que era para fazer”, disse.
O brasileiro nadou na raia número 8, a pior da piscina por sofrer mais com as ondulações criadas pelos demais nadadores. Mesmo assim, ele manteve um bom ritmo desde o começo da prova, apesar de ser conhecido por fazer inícios mais lentos e finais mais explosiva na distância.
De fato, ele aumentou o ritmo nos últimos 50 metros e fez duelo parelho com os rivais britânicos. A prova foi decidida na batida da mão, com ligeira vantagem para os nadadores ingleses. Com o resultado, Scheffer conquistou a primeira medalha da natação brasileira em Tóquio, encerrando um jejum que durava desde os Jogos de Londres-2012. Isso porque o Brasil ficou sem pódio na modalidade no Rio-2016.
Aos 23 anos, Scheffer faz sua estreia em Olimpíadas na capital japonesa. No Rio-2016, o índice olímpico não veio por apenas 80 centésimos. Mais maduro, ele fez valer a experiência adquirida no novo ciclo olímpico. Em 2018, no Mundial de Hangzhou, na China, participou do revezamento 4x200 metros livre que bateu o recorde mundial de piscina curta e faturou o ouro. Em Tóquio, ele chegou como o dono do recorde sul-americano da prova, que voltou a superar na prova de ontem.