Golfe

Conheça Bella, a brasiliense de oito anos que é fera no golfe

Colecionadora de títulos nos Estados Unidos, a menina iniciou no esporte aos dois anos de idade, e hoje compete com crianças da faixa etária dela em busca de sonhos: a profissionalização para disputar LPGA e ir aos Jogos Olímpicos de Brisbane-2032

Júlia Mano*
postado em 16/10/2021 08:00 / atualizado em 20/09/2022 17:40
 (crédito: Arquivo Pessoal)
(crédito: Arquivo Pessoal)

Chupeta na boca, fralda, uma boneca nos braços e um taco de plástico na mão. Foi assim que a brasiliense Bella Simões entrou pela primeira vez em um campo de golfe. Ela tinha apenas dois anos. A paixão foi à primeira vista. Depois das primeiras tacadas, a pequena pediu ao pai, que lhe apresentou o esporte, para continuar nos gramados.

No fim de semana passado, a jovem atleta de oito anos faturou o título do PGA Invitation 2021, na Flórida, Estados Unidos. Mais uma conquista para o seu jovem, mas extenso currículo de conquistas. Ostenta dois títulos mundiais, duas Floridas Champion, Georgia Champion, Texas Regional Champion, Jekyll Island Champion, UA Regional Champion e UA National Runner Up.

Os treinamentos da menina começaram no Clube do Golfe de Brasília. À época, o professor Vicente Pereira travou uma batalha para dar aula a uma criança de dois anos. Quando Bella foi pela primeira vez ao Mundial, em 2019, Bruno Freitas assumiu o posto. Ao verem o futuro promissor da golfista, e com o objetivo de oferecer ainda mais oportunidades para se aprimorar no esporte, os pais de Bella decidiram levá-la para os Estados Unidos. A família vive entre o Distrito Federal e Miami.

A pequena treina no Don Law Golf Academy, clube especializado em formar Future Stars (futuras estrelas na tradução livre) e mantém uma rotina regular de quatro horas diárias de treinamento. Além disso, nos Estados Unidos, Bella tem a oportunidade de assistir de perto aos grandes torneios de golfe do país.

A brasiliense acompanhou de perto um campeonato que a marcou bastante: o Ladies Professional Golf Association (LPGA). “Eu estava atrás da Alexis Thompson quando ela foi bater, virou para trás e falou: 'Fica aí, que você me dá sorte'. Ela me deu um abraço depois e pude pegar a assinatura dela e de outras meninas”, conta Bella ao Correio sobre o dia em que esteve perto da mais jovem golfista a competir no U.S. Open.

Metas

A trajetória de Bella deixa a estante de conquistas cada vez mais cheia e a torna uma promessa do golfe. Inspirada nos astros Nelly Corda, número 1 do ranking mundial feminino, e Tiger Woods, a jovem brasiliense gostaria de representar o país nos Jogos Olímpicos de Paris-2024, quando estará com 11 anos, mas é muito nova.

“As Olimpíadas são mais complicadas. Usam o ranking profissional. Então, não é o amador que é bom, é a primeira jogadora da LPGA e são poucas vagas. Alguns países participam se estiverem dentro do ranking. Se não tiver jogadores ali dentro, o país fica fora. O Brasil não tem nenhum jogador perto de se classificar para os Jogos. Só teve na Rio-2016 porque o país-sede tem direito a uma vaga”, pondera o pai de Bella, Rodrigo Simões.

Antes dos Jogos Olímpicos, a golfista de Brasília tenta fazer história no U.S. Open, no Masters Tournament e no LPGA. Quando questionada sobre outros desejos no esporte, Bella aponta: “Quero muitas crianças jogando e quero incentivar muitas pessoas a jogarem golfe”.

>> Entrevista/// Rodrigo Simões, pai de Bella

A Bella disse que conheceu o golfe por você, como você descobriu?

Cheguei no golfe em Brasília por meio de amigos. Gostei e pratico até hoje, mas jogo mal. “Eu ganho dele”, interrompe Bella. Uma vez, fui bater umas bolas, à noite, e a levei. Bella era pequenininha, tinha dois anos e meio e a gente arrumou um taquinho de plástico. Ela começou a brincar e fui atrás do professor para ver se ele queria dar umas aulinhas a ela. O professor Vicente ajudou bastante. Topou a guerra de ensinar uma criancinha de dois anos e meio, porque muitas vezes ele teria que ficar quase como babá. À época, o clube só aceitava crianças a partir de sete anos. Foi uma quebra de tabu. Quando ela entrou no Clube de Golfe tinha apenas duas crianças. Depois que ela ganhou o Mundial pela segunda vez, aumentou para 40, 50 crianças jogando lá. 

Como incentivam o sonho?

Não programamos nada. Não somos de uma família de golfistas ou de atletas. Tudo foi acontecendo. Ela jogou, gostou e passou a treinar bastante. Vieram as competições pequenas, que deram resultados. O povo falava: “Essa menina joga muito”. Falavam da capacidade dela e pensamos em focar nisso. Como ela estava gostando, nós demos corda. Tentamos deixar tudo pronto para ela. Era a parte de “Ah, precisa de um treinador”, vamos arrumar. “Preciso de tempo”, vamos arrumar. “Ah, precisa de bola”, vamos arrumar. “Precisa de campeonato”, vamos ver. O que surgisse no meio do caminho desse sonho. Pouco a pouco, vamos indo. Hoje, estamos nos Estados Unidos, nessas idas e vindas. Vou ao Brasil direto. Fico meio lá e meio cá para subsidiar esse sonho dela. 

A Bella tem patrocinadores?

Não, mas estamos procurando. Começa como esporte do filho e vai crescendo. Os valores multiplicam, porque ela se transforma em “miniatleta profissional”. Custos de viagem e de equipamentos ficam mais caros. Temos que buscar patrocínios para aguentar esse tranco aí. Deixamos de participar de torneios importantes por serem mais longe. Por exemplo, um torneio na Califórnia, para ir lá vai custar “x”, aí multiplica por uns R$ 5,50 e se pensa: “Não, não, vamos mais devagar, porque o buraco é mais embaixo”.

Vocês fizeram essa transição para os Estados Unidos por causa do Mundial?

Não só pelo Mundial, mas por toda a estrutura de golfe que tem aqui fora. O Mundial é um torneio que ocorre no último fim de semana de julho ou no primeiro fim de semana de agosto. É o maior torneio de golfe do mundo, entre adultos e crianças, por causa da quantidade de jogadores envolvidos. O problema são todos os outros torneios que têm em volta. No Brasil, quando falamos de torneio de crianças, falamos de uma liga que terá de quatro a cinco campeonatos por semestre. Aqui, em um fim de semana, tem dois torneios no mínimo e, durante a semana, pode ser que tenha mais um. Daqui para o fim do ano, a Bella disputará 20 torneios. Dá uma outra perspectiva no sentido de ganhar ritmo de jogo, experiência e saber se você está acompanhando o nível dos outros jogadores. Por exemplo, conhecemos uma menina que disputou com a Bella no fim de semana e ficou em primeiro ou em segundo. Vamos acompanhar essa menina para saber o que está sendo feito, fazer ajustes e melhorar o treinamento da Bella. 

Quantos torneios mais ou menos a Bella participou?

Nossa... Ela participou de bem mais de 100. Se pensar que daqui para o fim do ano tem 20 torneios, então ela participou bem de uns 100 para mais. Só neste ano vão ser uns 50 torneios. É coisa! A gente brinca que nesse nível de golfe que ela está jogando, deixa de ser aquela criança fazendo esporte e vira um miniatleta profissional, só que amador e com oito anos, porque, na verdade. Tem treinamento, rotina, cronograma de viagens, agenda.

Como foram os dois últimos Mundiais que a Bella participou?

O Mundial da U.S. Kids é sempre feito em Pinehurst, na Carolina do Norte, uma das capitais do golfe nos Estados Unidos. São normalmente 1.500 crianças competindo. É uma loucura, a cidade fica lotada, os hotéis também. São sete ou oito campos sediando, simultaneamente, os jogos. É uma experiência absurda, uma quantidade de gente, um ambiente inimaginável. O filme da Netflix “The Short Game” fala exatamente desse Mundial. Ele conta as histórias, é um documentário super famoso no meio do golfe e mostra essas crianças competindo. O preparo antes, como elas chegam lá, a pressão que sofrem até chegar no resultado.

E a experiência?

Foi maravilhoso o que passamos quando ela ganhou pela primeira vez. Nós levamos um coach do Brasil, o Bruno, ele faz a parte de treinamento de crianças na Federação Paulista, em São Paulo. Ele veio com a gente no ano passado e em 2019 para ajudar nesse treinamento da Bella. Durante a pandemia, nós ficamos treinando juntos e ele foi o cab da Bella no campeonato do ano passado e neste ano também. Só que, no ano passado, eu não conseguia ver. Toda vez que ela ia dar uma tacada, eu me escondia atrás da árvore. Ano passado, ela ganhou por uma tacada, no último buraco. Esse ano ela ganhou mais sossegada, foi com 10 tacadas de diferença da segunda colocada.

E o último torneio dela?

O torneio Regional (PGA Invitation) está dentro do U.S. Kids. O U.S. Kids tem o local tour, o Estadual, o Regional e o Mundial. O Regional fica embaixo do Mundial, é um torneio importante, porque eles contemplam uma região inteira dos Estados Unidos. Esse pegou toda a região sul. O torneio foi realizado na PGA Village, que é uma área com vários campos de golfe ligados à PGA — que é o Professional Golf Association. Dentro dos torneios da U.S. Kids, ele tem um alto grau de importância e a visibilidade também é grande.

O próximo torneio que a Bella vai participar tem uma data definida?

No final deste mês, mas estamos em dúvida. Sobre o que eu falei de quando paramos para analisar custos. Temos um torneio no Rio de Janeiro, o South America, que é jogado no Campo Olímpico no Rio. Hà crianças de toda América Latina indo para o Brasil. Queremos ir, mas ficamos naquela de “vamos ou não vamos?”, porque as viagenzinhas para o Rio são cada vez mais uma fortuna. 

Você acredita que as Olimpíadas de Brisbane-2032 podem ser uma realidade para Bella?

Eu, como pai, tenho que acreditar. Não vejo nada menos para ela do que as coisas acontecendo. Inclusive, conversando com os treinadores e com outras pessoas sobre a Bella, as expectativas são altas. Mas não podemos ficar com a expectativa tão alta, porque sabemos que tem aqui uma menina de oito anos. Então, temos que ser mais pé no chão. Ao mesmo tempo, queremos acreditar em muita coisa e passar o filme lá para frente para podermos saber o que vai acontecer com ela. Hoje, no nível de crianças, ela está no topo aqui nos Estados Unidos, com as estadunidenses e as coreanas. Para todas elas, que estão no topo, a Bella virou uma referência. Acreditamos que a primeira porta para ela nem é a Olimpíada, mas o U.S. Open, que é um dos maiores torneios dos Estados Unidos.

*Estagiária sob supervisão de Marcos Paulo Lima

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