O sonho do Distrito Federal de disputar a Série C do Campeonato Brasileiro em 2024 passa pelo trabalho minucioso de profissionais discretos, quase invisíveis nos estafes dos clubes da capital. Analistas de desempenho, observadores técnicos, auxiliares, agentes secretos e até grupos em aplicativos multiplataforma de mensagens instantâneas influenciam as tomadas de decisão dos treinadores do Brasiliense e do Ceilândia. Os representantes candangos na fase eliminatória da quarta divisão estreiam neste fim de semana no mata-mata.
Os 32 classificados na etapa de grupos disputam 16 vagas às oitavas de final em duelos de ida e volta. Um dos dois invictos entre os 124 times de todas as divisões ao lado do Ferroviário-CE, o Ceilândia inicia a série contra o Vitória-ES, neste sábado (29/7), às 15h, no Estádio Salvador Costa, o Ninho da Águia. O Brasiliense receberá o Athletic-MG, no domingo (30/7), às 16h, com ingressos a R$ 10 no Serejão, em Taguatinga. Não há gol qualificado na casa do adversário. Em caso de igualdade na pontuação, os critérios de desempate são o saldo de gols e a disputa de pênaltis. Os semifinalistas sobem para a Série C.
Vitória-ES e Athletic-MG foram investigados com lupa durante a semana. Os dossiês sobre os adversários nem sempre são confeccionados nos limites geográficos do quadradinho. O time de maior investimento do DF conta com um analista de desempenho cujo escritório fica a 1.400km da capital. Morador da Cidade Baixa de Salvador, Ícaro Caldas Leite é o encarregado de estudar os adversários do Brasiliense. "Basicamente, o trabalho do analista é identificar o que a equipe ou o atleta faz em campo. Você descreve tudo. Analista de desempenho não pode viver na base do achismo ou da opinião. É com base nos fatos, é com o que ocorre em campo", diz ao Correio.
O trabalho é virtual. Ícaro Leite mantém contato diário com o estafe do clube a distância. Vem a Brasília uma vez por ano. "Eu baixo os jogos, assisto, anoto, corto os lances, edito e depois faço o upload no YouTube e envio para a comissão técnica. Estudo os padrões dos adversários, preparo o material e envio. Depois, eu com alguém da comissão técnica, fazemos uma reunião para discutir sobre os adversários: pontos fortes, fracos, possíveis escalações", compartilha.
Apesar da rotatividade de treinadores no Brasiliense, o serviço tem sido melhor que a encomenda. "Sempre tive relações maravilhosas com as comissões técnicas, uma relação saudável, respeitosa e com muita admiração. A minha relação com a diretoria é maravilhosa. Acompanho o Brasiliense por meio dos jogos e vendo matérias, inclusive seguindo muitas páginas nas redes sociais das torcidas", relata Ícaro Leite.
As avaliações sobre o Athletic são discretas. "É uma equipe muito organizada. Sabe o que fazer com e sem bola. Nós os enfrentamos esse ano pela Copa do Brasil, fora de casa. Acredito que aquele jogo não serve de referência. A comissão técnica mudou. A torcida apoia demais. Conhecemos o estádio e sabemos o que esperar", explica o especialista.
O Brasiliense amarga a Série D há 10 anos. Ícaro Leite admite a cobrança interna pelo sucesso. "Acredito que pressão seja uma palavra muito forte. Mas nós nos cobramos internamente sobre o acesso. É a conquista que mais desejamos e trabalhamos para termos êxito", projeta.
Força tarefa
Invicto na Série D, o Ceilândia estuda os adversários com uma tática implacável: a união faz a força. "Aqui, como não temos um analista, o Adelson (de Almeida, técnico) não tem folga. Na casa dele, busca todo o tempo essas informações. A diretoria também faz esse trabalho com o treinador. O Léo (Roquete, auxiliar) tem contato com analistas do Espírito Santo. Ele e o preparador físico pegaram informações. A gente procura ver todos os detalhes, principalmente se tratando de um jogo tão importante", explica ao Correio o diretor-executivo Everton Goiano.
Aplicativos de mensagem instantânea também são ferramentas de investigação. "O Whatsapp é por onde a gente mais recebe informação de cinco amigos lá do Espírito Santo. Recebemos tudo e analisamos. Quando a gente junta tudo, vê o que bate de informação. Quem mais acompanha é o Adelson (de Almeida) e o auxiliar Léo Roquete", acrescenta o dirigente.
O dossiê sobre o Vitória-ES está pronto, mas Everton Goiano pondera. "Aqui a gente trabalha de um jeito fechado, mas não adianta (esconder), no dia dos jogos, tudo é gravado. A gente pesquisa e acha todos os jogos do Vitória. Não tem como sair disso. Mas uma coisa é certa: do jeito que o Ceilândia estuda, eles também estão nos estudando", observa o executivo.
Mais do que o trabalho de espionagem, Everton Goiano valoriza o planejamento do Ceilândia. "Temos de nos preocupar com o nosso time. Nos apresentamos 34 dias antes do começo do campeonato. Isso é muito importante no futebol para se fazer um projeto. Temos colhido os frutos com uma campanha razoavelmente boa pela dificuldade da competição. Agora, é a hora de (o Ceilândia) entrar e mostrar a que vem", prega.
*Estagiário sob a supervisão de Marcos Paulo Lima
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