Belém — Richarlison atraiu um fardo pesado no início deste ciclo. "A camisa 9 já é minha, não tem o que ficar escolhendo. Fiz uma boa Copa do Mundo, mesmo não tendo o título, e acho que aqui na Seleção todo mundo sabe que eu sou o homem-gol, não tem o que ficar escolhendo camisa, a 9 é minha", disse na véspera do amistoso contra Guiné, em junho, sob o comando de Ramon Menezes.
O clichê "centroavante vive de gol" desafia duplamente o jogador de 26 anos. A transferência do inglês Harry Kane do Tottenham para o Bayern de Munique deixou o capixaba de Nova Venécia em evidência no clube inglês. Aumentou a responsabilidade. Ele tem um gol em seis jogos pelo time londrino na temporada de 2023/2024. As descobertas de atacantes promissores no futebol nacional como Endrick, Marcos Leonardo e Vitor Roque aumentam a pressão sobre Richarlison nas convocações. A substituição por Matheus Cunha, o retorno do versátil Gabriel Jesus ao grupo e o fato de o dinizismo desfrutar de uma máquina de gols no Fluminense chamada Cano ampliam o desconforto.
A convicção de Richarlison de que é o proprietário da camisa 9 contrasta com ações de marketing pessoal e atos de insegurança. Ele é disparado o jogador mais atencioso com os fãs. Autografou centenas de camisas depois do treino aberto de quinta-feira e após a goleada por 5 x 1 contra a Bolívia, no Mangueirão. Simplesmente não arrastava o pé do gramado enquanto não fizesse o último torcedor feliz. Tirou selfies. Colocou crianças no colo. Agarrava cada uma das camisas atiradas da arquibancada e assinava.
O corpo a corpo com a torcida faz dele um dos jogadores mais amados pela plateia. Os decibéis da torcida atingiram praticamente o mesmo nível de ruído do queridinho Neymar no anúncio da escalação feito no sistema do som com foto customizada no telão. Apesar dos gols desperdiçados, ele recebeu apoio dos mais de 43 mil torcedores. O único integrante do quarteto de ataque a não balançar a rede da Bolívia teve o nome gritado.
A popularidade em alta contrasta com um Richarlison emocionalmente instável. Substituído no segundo tempo por Matheus Cunha, ele chorou no banco de reservas em uma partida sem razão para desespero. A pressão é pessoal. Ele se impôs um sarrafo elevado ao se intitular sócio-proprietário da camisa 9. Perdeu o duelo à parte com o bom goleiro Viscarra, sentou-se no banco de reservas e chorou. Neymar (2), Rodrygo (2) e Raphinha fizeram os gols. Abrego também para a Bolívia. Faltou justamente o de Richarlison.
"Todo mundo acolheu o Richarlison. Ele desperta isso no torcedor brasileiro, esse carinho. A gente vai fazer de tudo para que ele possa manter a tranquilidade. É um jogador vitorioso, e a bola vai entrar a qualquer momento", ponderou o técnico Fernando Diniz na entrevista coletiva, referindo-se à medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 e ao título da Copa América em 2019, no Brasil, sob o comando de Tite.
Diniz partiu rumo ao Peru sem pretensão de sacá-lo do time titular, mas o discurso na entrevista pós-jogo estende a cobrança por efetividade a todo o elenco. "A gente vai fazer sempre o melhor para a Seleção. Eu acredito muito nele (Richarlison), é um grande jogador. A bola dele não entrou. Não é que ele jogou mal, pelo menos não na minha opinião. Uma hora a bola dele vai entrar. É um jogador que ajuda demais. Talvez vocês não tenham percebido. Eu gostei da participação dele", reforçou o treinador, mal-acostumado com o padrão de excelência de Germán Cano, centroavante dele no Fluminense.
Há um outro gatilho de ansiedade e pressão para Richarlison. Ele está cercado de parceiros capazes de assumir a função dele no papel de falso nove. Rodrygo é um deles. Neymar já fez essa função na Seleção com Tite, Dunga e Mano Menezes. Se não der uma resposta imediata contra o Peru na terça-feira, às 23h, no Estádio Nacional de Lima, pode sobrar para ele nos compromissos de outubro pelas Eliminatórias, quando Vinicius Junior estará recuperado de lesão. Quem sairia para o astro do Real Madrid entrar no time?
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