SOCIEDADE

Análise: o perigo da proposta de Milei de apagar o feminicídio da legislação

Com o argumento de que não há motivo para diferenciar homicídios de mulheres e homens, a gestão Milei ignora uma triste realidade. Nossos vizinhos registraram, em média, uma morte a cada 32 horas e 48 minutos no ano passado — em números absolutos foram 267 feminicídios em 2024

Idolatrado pela direita no Brasil, principalmente por conta da condução da economia, Milei vê no feminismo uma
Idolatrado pela direita no Brasil, principalmente por conta da condução da economia, Milei vê no feminismo uma "distorção da igualdade" - (crédito: Evaristo Sá/AFP)

A proposta do governo de Javier Milei de excluir o crime de feminicídio do Código Penal na Argentina é um retrocesso perigoso, e os desdobramentos precisam ser acompanhados com atenção por nós, brasileiros, sob o risco de inviabilizar o combate à violência de gênero.

Com o argumento de que não há motivo para diferenciar homicídios de mulheres e homens, a gestão Milei ignora uma triste realidade. Nossos vizinhos registraram, em média, uma morte a cada 32 horas e 48 minutos no ano passado — em números absolutos, foram 267 feminicídios em 2024.

O primeiro ponto a destacar é que, em comparação com o Brasil, a Argentina se mostrou pioneira. Desde 2012, três anos antes do que nós, o crime de feminicídio está tipificado na legislação portenha. Se a ideia de Milei avançar, nossos vizinhos estarão ao lado de Cuba e Haiti como os países da América Latina que não criminalizam a violência de gênero.

O segundo é que é mais um capítulo na escalada de Milei contra o direito das mulheres. Semana passada, em Davos, durante o Fórum Econômico Mundial, o presidente argentino disse que a figura do feminismo "legaliza de fato que a vida de uma mulher vale mais que a de um homem".

Idolatrado pela direita no Brasil, principalmente por conta da condução da economia, Milei vê no feminismo uma espécie de "distorção da igualdade". Mas uma pergunta necessária e que precisa ser feita é: ignorar o assassinato de mulheres não seria uma distorção da realidade?

Retirar o feminicídio do Código Penal terá um impacto imediato, apontam especialistas. Tornará o crime menos visível e, ao mesmo tempo, enfraquece a luta por justiça e políticas públicas eficazes.

Fechar os olhos para essa questão significa legitimar a barbárie. A luta contra a violência de gênero é uma responsabilidade de todos. Abandoná-la em nome de uma suposta neutralidade jurídica é, no mínimo, um ato de negligência criminosa.

No Brasil, temos avançado na legislação, e não podemos deixar essa onda argentina chegar por aqui. Reforçar políticas de proteção às mulheres, fortalecer canais de denúncia e investir em educação para a igualdade de gênero são os caminhos a serem trilhados.

Sabemos ainda que o machismo enraizado na sociedade brasileira é um dos focos que precisam ser combatidos com urgência. A misoginia existe e deve ser atacada sempre. Se um amigo faz um comentário machista, critique. Não tenha medo de tentar reconfigurar a mente das pessoas.

 

Roberto Fonseca
postado em 31/01/2025 06:00
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