EDUCAÇÃO ESPECIAL

Defensoria Pública é contra política que separa alunos especiais

Grupo de defensores públicos pede admissão em uma ação movida pelo Rede Sustentabilidade para frear decreto de Bolsonaro que incentiva isolamento de estudantes no sistema educacional. Programa é visto como retrocesso por especialistas

Sarah Teófilo
postado em 27/10/2020 06:00 / atualizado em 27/10/2020 14:39
 (crédito: André Violatti/Esp. CB/D.A Press)
(crédito: André Violatti/Esp. CB/D.A Press)

O Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias Públicas Estaduais e Distrital nos Tribunais Superiores (Gaets), que reúne defensorias públicas de 11 estados e o Distrito Federal, entrou com um pedido de admissão como “amicus curiae” (amigo da Corte) em uma ação movida pelo partido Rede Sustentabilidade na qual se questiona o decreto do governo federal que lançou a Política Nacional de Educação Especial (PNEE). A mudança, segundo os autores do pedido, incentiva o processo de segregação de estudantes com deficiência e foi vista como retrocesso.

O processo está sob relatoria do ministro Dias Toffoli, que já pediu manifestação da União sobre a medida. Como amicus curiae, o grupo de defensores auxilia o Supremo com subsídios para embasar as decisões. O pedido de ingresso foi aceito, ontem, por Toffoli.

O Gaets ressalta que a mudança viola a Constituição Federal, “que veda quaisquer formas de discriminação”, e também a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), “que traz como princípio a não discriminação das pessoas com deficiência sob alegação de deficiência, inclusive nas escolas”.

A chamada “Política Nacional de Educação Especial” elaborada pelo governo Bolsonaro prevê a educação de alunos com deficiência em salas e escolas especiais — o programa é visto como retrocesso por especialistas e possivelmente discriminatório, pois abre brechas para as escolas regulares, que hoje educam cerca de 90% das crianças com deficiência, passarem a rejeitar alunos com essas características, enviando-as para instituições especiais privadas.

Segundo os defensores, a mudança adotada pelo governo “atinge diretamente a garantia de acesso pelas pessoas com deficiência a um sistema educacional inclusivo e aprendizado ao longo de toda a vida”, além de ferir os direitos de não ser discriminado e o de participar na elaboração de políticas públicas voltadas para pessoas com deficiência.

O Gaets pontua ainda que uma decisão do Supremo sobre o assunto impactará não somente no âmbito educacional de pessoas com deficiência como também na inclusão dessa população em outros aspectos da vida em comunidade.

“Esta decisão, pelo peso e protagonismo de que é dotado seu prolator, órgão máximo do Judiciário Nacional, poderá representar avanço de revelo no caminhar do povo brasileiro em direção à eliminação de todas as barreiras — em especial as atitudinais — em relação às pessoas com deficiência”, apontam os defensores.

No pedido, os defensores apontam que, segundo dados do IBGE do Censo 2010, cerca de 23,9% da população declararam ter pelo menos uma deficiência. “A norma em questão possui elevado impacto social, de modo que a análise da sua constitucionalidade constitui matéria de inegável relevância”, frisa o grupo.

Adaptação

Defensor público no Rio de Janeiro, com representação em Brasília, Pedro Carriello afirma que o decreto “além de inconstitucional, traz prejuízos às crianças com deficiência”. “Ele altera algo que estava dando certo na socialização da criança e adaptação de um mundo real, tanto para a criança que não tem qualquer dificuldade a conviver, como para aquela que tem”.

No pedido, os defensores justificam, ainda, que a inclusão na qualidade de “amicus curiae” tem como intuito “ampliar o debate, juntar documentos e prestar informações relevantes aos convencimentos dos eméritos ministros”.

A ação foi apresentada no último dia 6 pela Rede, que questiona a política do governo que incentiva a separação de alunos com deficiência para instituições especiais. Segundo o partido, o foco da política deveria ser dar mais estrutura às escolas regulares do que direcionar verbas às instituições especiais, que vem perdendo financiamento do governo desde 2008, quando passou a vigorar a política de inclusão de pessoas com deficiência em escolas regulares.

“Serão drenados, assim, os recursos que deveriam se destinar ao aprimoramento de instalações físicas, treinamento de professores e outras medidas necessárias à consecução da política de inclusão”, apontou o Partido.

Liminarmente, a Rede pede ao Supremo que suspenda o decreto que prevê a “Política Nacional de Educação Especial” e, no mérito, considere o texto inconstitucional.

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