Com estreia hoje (30/10), “Springsteen: Salve-me do desconhecido” é tudo o que não se espera de um dos (últimos) grandes heróis do rock. Não é uma trama para quem conhece apenas “Born in the U.S.A.” e “The river”. Ou talvez seja, pois a história lança luzes sobre um dos trabalhos mais importantes (se não o mais) de Bruce Springsteen, que o fez atingir os 76 anos com a mesma relevância de quando foi alçado ao estrelato, mais de quatro décadas atrás.
É um filme, em suma, sobre depressão. Estrelado por Jeremy Allen White, em seu primeiro protagonista de peso desde a consagração na série “O Urso”, o filme coloca Bruce Springsteen entre 1981 e 1982, mal entrado nos 30 anos, à beira do estrelato, porém esgotado.
Fita cassete
Com roteiro e direção de Scott Cooper, o longa é baseado na biografia “Deliver me from nowhere” (também o título original do longa), de Warren Zanes. O relato jornalístico acompanha o músico durante a criação do álbum “Nebraska” (1982).
É um disco acústico, cheio de referências folk e de personagens marginalizados do interior dos Estados Unidos. Foi gravado de forma precária em fita cassete pelo próprio, sozinho em seu quarto. Ou seja, “Nebraska” vai contra o que a gravadora Columbia e todos os que estavam ao redor dele queriam, pois se esperava o sucessor do disco “The river” (1980). O trabalho cheio de hits só aconteceu com “Born in the U.S.A.” (1984).
Fugindo da hagiografia de produções do gênero, “Salve-me do desconhecido” tenta mais explicar o artista e suas questões do que propriamente acompanhar a trajetória de um astro. A narrativa começa no final dos anos 1950, com imagens em preto e branco apresentando o retrato frágil da infância de Bruce.
Aos 8 anos, o garoto, com a anuência da mãe, Adele (Gaby Hoffman), ia até os bares buscar o pai, Dutch (Stephen Graham). Bêbado e violento, ele gerava tensão na mulher e no menino – as imagens em P&B aparecem de quando em vez, expressando a difícil relação do garoto com a família.
A sequência inicial é rapidamente cortada para uma explosão de cores, quando assistimos a Springsteen adulto, suado e em êxtase com sua banda em um show em Cincinnati, em 1981, já nos finalmentes da turnê “The river”. No retorno a Nova Jersey, a vida real bate como uma grande ressaca.
Springsteen quer se isolar numa casa alugada no interior, à beira do lago. Ele sabe bem o que não quer: se repetir na música. O filme acompanha seu processo de descoberta, da sonoridade e dos temas, em meio ao trabalho em gestação. Em paralelo, o vemos na vida comum, passando quase despercebido pelos cenários que conhece, a Jersey local.
A inspiração para Springsteen gerar “Nebraska” vem dos contos góticos da escritora Flannery O’Connor, textos marcados pela violência; do filme “Terra de ninguém” (1973), de Terrence Malick, sobre dois jovens namorados que entram numa espiral de assassinatos. Em busca dos próprios fantasmas, ele passa repetidamente em frente à casa, hoje abandonada, em que viveu na infância.
Seu empresário, Jon Landau (Jeremy Strong, com aquele ar de poucos amigos que carrega desde a série “Succession”), é o único mais próximo de compreendê-lo. É ele quem insiste, diante das constantes investidas da Columbia, que o disco de Springsteen só vai sair quando ele conseguir a sonoridade que almeja.
Os pensamentos sombrios que rondam a cabeça do músico por vezes são anuviados pela única presença luminosa em sua vida. Ela é Faye (Odessa Young), mãe solteira que frequenta regularmente seus shows improvisados de blues no Stone Pony, onde ele faz covers estridentes de “Boom boom”, de John Lee Hooker, e “Lucille”, de Little Richard. A personagem feminina é ficcional, foi inspirada em alguns relacionamentos de Springsteen na época.
Êxtase
The Boss, como o grande público o conhece, é visto poucas vezes. Uma delas durante a gravação de “Born in the U.S.A.”. É um momento de êxtase, de respiro do filme, o que as feições dos músicos e dos técnicos do estúdio não escondem.
Mas o Springsteen que emerge em “Salve-me do desconhecido” é muito humano – ou seja, cheio de imperfeições. Tal retrato, difícil e melancólico, é o grande acerto deste filme, que foge, o tempo inteiro, da mitificação do personagem.
“SPRINGSTEEN: SALVE-ME DO DESCONHECIDO”
(EUA, 2025, 120min.) – Direção de Scott Cooper, com Jeremy Allen White, Jeremy Strong e Odessa Young. O filme estreia nos cines Boulevard 6 (IMAX), às 13h30, 18h40, 21h15 (qui a dom e qua) (leg); Cidade 5, às 16h (dub, no sab. será leg), 20h10 (leg); Cidade 8, às 13h40 (dub); Contagem 8, às 13h30, 16h, 18h40 (dub), 21h15 (leg); Del Rey 3, às 15h40 (leg), 18h20 (dub), 21h (leg); Diamond 2, às 18h20, 21h (leg); Minas Shopping 5, às 13h30, 16h, 18h35 (dub), 21h10 (leg); Monte Carmo 1, às 15h50, 18h30 (dub), 21h10 (leg); Pátio 7, às 19h, 21h45 (exceto sab e dom), 14h15, 17h10, 20h (sab e dom) (leg); Ponteio Premier, às 16h10, 21h15 (leg); Ponteio 3, às 13h50, 18h35 (leg); Via 1, às 16h10, 20h40 (dub).
