Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram, por unanimidade, que obrigar escolas e bibliotecas a manterem ao menos um exemplar da Bíblia em seus acervos é inconstitucional. O julgamento teve início na noite de segunda-feira (12/4), mas só teve fim na terça (13). A decisão derrubou um trecho de uma lei do Amazonas que impunha a obrigatoriedade.
A ação direta de inconstitucionalidade foi aberta pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2015. A relatora foi a ministra Cármen Lúcia. Para ela, o Estado não pode exigir uma obra sagrada em detrimento de outras, pois precisa ser neutro e independente em relação a todas as religiões.
Exigir somente a Bíblia violaria os princípios da laicidade estatal, da liberdade religiosa e da isonomia dos cidadãos, argumentou Cármen Lúcia. “Na determinação da obrigatoriedade de manutenção de exemplar somente da Bíblia, a lei amazonense desprestigia outros livros sagrados quanto aos estudantes que professam outras crenças religiosas e também aos que não têm crença religiosa alguma”.
O professor de direito constitucional do Ceub e doutor em direito Hector Luis Vieira afirma que nessa situação é necessário observar qual a premissa da lei: "Por que obrigar uma escola a fornecer o livro sagrado de uma religião específica?”, argumenta.
A determinação do STF, no entanto, não determina que não pode haver, nas bibliotecas e no acervo de colégios, Bíblias sagradas. “O que foi estabelecido é que a obrigatoriedade desses livros sagrados é ilegal. Isso não quer dizer que um aluno não pode ler uma Bíblia na biblioteca do colégio, por exemplo”, diz Hector.
O doutor em direito também lembra que o veto da obrigação é para escolas públicas. “Em estabelecimentos particulares, se a escola quiser deixar a Bíblia na primeira prateleira da biblioteca, não há problema”.
O que é um estado Laico?
O professor Hector explica que a Constituição de 1988 é laica. “Isso significa que o Estado não pode promover nenhuma fé. Não quer dizer que o estado é contrário a uma religião, uma crença ou um ritual religioso, mas não pode levantar medidas que, de alguma maneira, beneficiem determinado seguimento religioso”, afirma.
“No estado brasileiro, a laicidade é puramente formal, ela está no texto, mas esse pressuposto de que o Estado não pode tratar nenhuma religião de maneira privilegiada ou detrimentosa, na prática não ocorre”, conclui Hector.
Pauta já vinha sendo discutida no Supremo
Na semana passada, o STF havia discutido a respeito da autoridade de estados e municípios sobre templos religiosos. Na ocasião, foi firmado que governadores e prefeitos estão aptos a suspender a realização de cultos religiosos presenciais para conter a disseminação da covid-19.
A decisão da Corte não obriga o fechamento total de templos religiosos, mas, por 9 votos a 2, a Corte valida que Estados e Municípios tomem esta decisão se for necessário.