FESTIVAL LED

História sobre indígenas ensinada nas escolas não nos representa, diz ativista

Sâmela Sateré Mawé afirma que o ensino sobre os povos originários nos currículos escolares brasileiros mantém o olhar estereotipado sobre essa parte da população

Talita de Souza
postado em 08/07/2022 23:01 / atualizado em 08/07/2022 23:08
 (crédito:  Reprodução/Instagram)
(crédito: Reprodução/Instagram)

A ativista indígena Sâmela Sateré Mawé reprovou, nesta sexta-feira (8/7), o ensino dos fatos históricos que envolvem os povos originários nas escolas brasileiras. Segundo a comunicadora, o currículo escolar que fala sobre esta parte da população não representa a realidade e mantém no imaginário brasileiro um olhar colonizador e estereotipado sobre os indígenas, entendidos como criaturas selvagens ou inadequadas ao tempo atual.


“Desde novos ao sairmos da aldeia vemos que há um ensino errado sobre nós. Desde que nos matriculamos na escola, somos ensinados uma história em que nós, indígenas, não nos reconhecemos. Isso faz com que as pessoas ainda tenham uma ideia estereotipada sobre indígenas no Brasil. Isso nega a nossa identidade”, repudiou a ativista.


Sâmela participou do Festival Led - Luz na Educação em uma mesa sobre ativismo on-line. O evento é uma iniciativa da Rede Globo e da Fundação Roberto Marinho e objetiva fomentar a discussão sobre uma educação do futuro.

Mais de 520 anos depois do que se credita ser “o descobrimento do Brasil”, os currículos escolares brasileiros ainda contam o início da história do país com um descobridor português que encontrou pessoas “criaturas” que viviam em um território “sem dono”. A falácia tem sido combatida por intelectuais indígenas, mas ainda não foi institucionalizada, ou seja, não foi colocada no lugar da ensinada erroneamente.


O ensino é visto, pelos indígenas, como uma forma de dificultar, inclusive, a luta por territórios demarcados. Se Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil e os indígenas foram vistos não como donos ou moradores e sim como um acessório para utilizar – o que ocorreu com a escravização desta população durante a colonização –, então eles não têm direito às terras em que sempre moraram.

Sâmela participou da mesa Construir um futuro melhor, ao lado do tiktoker Raphael Vicente (de branco à direita) e da influenciadora trans Giovanna Heliodoro (de rosa)
Sâmela participou da mesa Construir um futuro melhor, ao lado do tiktoker Raphael Vicente (de branco à direita) e da influenciadora trans Giovanna Heliodoro (de rosa) (foto: Oxidany/Globo)


“Cansamos de ter gente que fala por nós e ainda fala errado. Por este motivo, entramos nas redes sociais, durante a pandemia, para ocupar este espaço e mostrar realmente nossa história, nossa causa e quem somos realmente, nossa identidade”, pontua Sâmela. A indígena afirma que o grupo que ingressou nas plataformas sociais criou até mesmo agências de notícias on-line, como a Mídia Índia, para publicizar um conteúdo feito totalmente por eles.


Para ela, ocupar o território on-line é uma forma de educar, agora, feita totalmente por eles. “Na aldeia, temos a educação indígena, que é a que aprendemos desde o nascimento, pela oralidade e também pela experiência que vemos nossos mais velhos fazendo. Agora, fazemos algo parecido na internet. Nós e outras minorias usam para mostrar mais a realidade e a história delas”, pontua.


Sâmela diz que essa é uma forma, também, de honrar a luta dos ancestrais pelo acesso à educação, já que é por meio dela que eles podem, agora, ocupar novos horizontes. “Utiizar as redes sociais é uma ferramente de luta e resistência. Nossos ancestrais, quando lutaram para nós termos acesso a universidade pelas cotas, eles usaram as ferramentas que tinham, a mobilização, os protestos pelo legislativo”, lembra.

“Agora, nós temos a educação, o conhecimento e a internet é uma forma de comunicar para todos as injustiças que vivemos. É com a internet que denunciamos o assassinato de criança indígena, quando há invasão nos territórios. Conseguimos mais visibilidade e quando a temos, sofremos menos violações, porque estamos, de certa forma, protegidos pelos olhos de todos”, conta.


Movimento LED

O Festival que ocorre nesta sexta e sábado é um dos três pilares da iniciativa Movimento LED, promovida pela Globo e a Fundação Roberto Marinho para reconhecer, incentivar e fomentar práticas inovadoras de educação no país.


Além do festival, o Movimento LED conta com uma premiação feita por meio de um edital anual para acelerar seis novas formas de ensinar e aprender na educação básica, técnica e profissional, e educação não-formal — cada iniciativa vencedora recebe R$ 200 mil.


Dez iniciativas feitas por estudantes universitários que apresentem soluções criativas para problemas vividos dentro de escolas ou em universidades também receberão um incentivo de R$ 300 mil, que será dividido entre elas, no Desafio LED - Me dá uma luz aí.


O último pilar do Movimento LED é voltado a oferecer, de maneira gratuita, uma plataforma de aprendizado on-line, chamada Comunidade LED, disponível para pessoas que estão envolvidas ou querem aprender mais sobre novas metodologias, tecnologias disruptivas, experiências de sala de aula e educação inovadora.


Todo o movimento é acompanhado de perto por um conselho consultivo formado por diversas instituições de ensino, como a Unesco, Unicef, Todos pela Educação, CIEB (Centro de Inovação para a Educação Brasileira), ITS (Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio), Vale do Dendê e Porto Digital.

 

A repórter participa do Festival Led, no Rio de Janeiro, e viajou a convite da Globo e da Fundação Roberto Marinho. 

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