Eu, Estudante

ARTIGO

O Brasil no centro do mapa-múndi e a importância do novo atlas do IBGE

Pela primeira vez, os povos indígenas e quilombolas são considerados na demografia brasileira

Neste mês, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) lançou o novo Atlas Geográfico Escolar. A reedição deste tradicional Atlas produzido pelo IBGE não é novidade, já que periodicamente isso ocorre. Então, por que esse lançamento está repercutindo nos meios acadêmicos e escolares?

Porque há elementos diferenciados e importantes nessa nova publicação. O atlas foi disponibilizado em versões física e digital. A versão física pode ser adquirida pela loja virtual do IBGE e a digital pode ser acessada de graça no site do instituto. A versão digital, agrega recursos que a tecnologia permite, como QR Codes que dão acesso a gráficos interativos, vídeos e links com informações complementares. Mas isso não chega a ser impactante, pois a linguagem digital já nos proporciona essas interações há algum tempo.

A principal inovação em relação às versões anteriores é a visibilidade dada para as populações antes pouco consideradas na demografia brasileira, como os povos indígenas e os povos quilombolas. Os mapas “Povos e Comunidades Tradicionais” apresentam a distribuição de pessoas indígenas e de pessoas quilombolas (dados de 2022) em porcentagem, por Estado, além de indicar, por meio de gráficos, o quantitativo dessas populações que habitam terras indígenas ou quilombolas, bem como o quantitativo que se encontra fora dessas terras próprias. Destacam-se, também, em outros gráficos, os Estados que têm mais municípios com população indígena e quilombola.

Esses dados permitem uma abordagem didática mais precisa sobre o tema das Comunidades Tradicionais, bem como a ampliação das discussões políticas e culturais que envolvem a presença e a distribuição territorial dos povos indígenas e quilombolas na população brasileira. Esse destaque é uma conquista das lutas por Direitos Humanos e respeito à diversidade que marcaram movimentos sociais, permearam políticas públicas, nas últimas décadas e que, finalmente, chegam a um material didático escolar da envergadura do Atlas Geográfico.

Outro elemento muito importante e inovador presente no Atlas é o mapa-múndi com a América do Sul e o Brasil no centro. No âmbito da Geografia, são antigas as discussões sobre as relações de poder que as representações cartográficas trazem. Tradicionalmente, o Mapa-múndi trazia a Europa no seu centro, com destaque para todos os países daquele continente, reforçando a pretensão civilizatória e a chamada europeização do mundo desde o processo colonizador.

Qualquer configuração diferente do mapa-múndi só era justificada pelo uso de projeções cartográficas diversas e, diga-se de passagem, sem discussão sobre as distorções de área, que também carregam uma dimensão política de relação de poder entre os países. Pois bem, colocar o Brasil no centro do mapa-múndi é uma atitude política importante, que abre essa discussão das relações internacionais e estimula abordagens críticas sobre as dominações na era da globalização e as heranças do colonialismo.

Por todos esses aspectos, pode-se afirmar que esse Atlas Geográfico Escolar se configura como um material didático alinhado com pautas sociais e de direitos humanos. Além de apoiar e fundamentar intervenções didáticas também nesta direção nas escolas brasileiras.

Maria Eneida Fantin. Mestre em Tecnologia. Docente dos cursos de Bacharelado e Licenciatura em Geografia da Área de Geociências do Centro Universitário Internacional Uninter.