Inquérito

Professora é acusada de injúria por outdoor com críticas a Bolsonaro

Docente da UFRPE, ela prestou depoimento na última quarta-feira (10). Universidade considera que a abertura da investigação é inconstitucional e inadmissível

Gabriella Castro*
postado em 12/03/2021 19:50 / atualizado em 13/03/2021 12:11
 (crédito: Adurferpe / Divulgação)
(crédito: Adurferpe / Divulgação)

Professora da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) é alvo de inquérito da Polícia Federal (PF) por conta da instalação de outdoors com críticas ao governo Jair Bolsonaro (sem partido). Érika Suruagy prestou depoimento pela internet em primeiro de março*.


Aberto em 29 de janeiro, o inquérito investiga a professora pelo crime de injúria, descrito no Artigo 140 Código Penal como “ofender a dignidade ou o decoro de alguém”. A pena é de detenção, de um a seis meses, ou multa. No caso de injúria contra o presidente da República, a pena é aumentada em um terço.


Os outdoors foram colocados ainda em 2020, quando o país atingiu 120 mil mortes. Na época da instalação, Érika era presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal Rural de Pernambuco (ADUFERPE). Atualmente, ela ocupa a vice-presidência.


Com imagem de Jair Bolsonaro de capuz e foice, como é representada a figura da morte, o expositor trazia as frases: "O senhor da morte chefiando o país. No Brasil, mais de 120 mil mortes por Covid-19". Também continha a hashtag #ForaBolsonaro.


Veja os pronunciamentos das instituições


Em nota oficial, a UFRPE prestou solidariedade à professora, lotada no Departamento de Educação. A universidade defendeu “o direito legítimo a manifestações públicas, sejam de origem do movimento sindical ou de qualquer outra”. Ainda descreveu o caráter da investigação como “inconstitucional e inadmissível” e disse se tratar de censura.

 


A ADUFERPE declarou que a investigação é “uma tentativa de calar opiniões e intimidar o legítimo e livre exercício da atividade associativa”. Segundo a associação, a abertura do inquérito e convocação de Érika para depoimento são “de inteira responsabilidade de Jair Bolsonaro”.

 

 
 
 
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Procurada, a associação de professores ainda chamou a solicitação de absurda e comparou o número de mortes da época com o atual. Confira na íntegra:

"É um absurdo o presidente solicitar abertura de inquérito à Polícia Federal, diante de uma manifestação legítima, respaldada na Constituição, que é a liberdade de expressão. Na época dos outdoors, o número era de 120 mil pessoas mortas por Covid-19 no Brasil. Hoje, estamos chegando a quase 300 mil mortos. É uma tentativa de silenciamento, censura e intimidação aos professores, como foi o caso recente da Universidade de Pelotas (RS) e também com cientistas, artistas e intelectuais que se colocam contrários as políticas do governo Bolsonaro".


A Polícia Federal afirma que a apuração foi aberta por requisição do ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, “para apurar eventuais crimes contra a honra do presidente da República”. “O inquérito foi relatado sem indiciamento, por parte da Polícia Federal, por se tratar de infração de menor potencial ofensivo e regularmente encaminhada ao Poder Judiciário, nos termos da legislação”, afirma a instituição.


O Conselho Universitário da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) também se manifestou em defesa da “autonomia universitária, da liberdade de cátedra, de pensamento e de criação que se encontram na essência do caráter da universidade”. Segundo a instituição, a medida foi uma forma de intimidar sindicalistas, cientistas, professores, servidores públicos, artistas e cidadãos que discordem do governo e, por extensão, que se indignem com as mais de 260 mil mortes no País”.


Também a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) repudiou a abertura da investigação. “Lembramos, ainda, que a universidade federal é instituição de Estado e, por isso, não é subserviente deste ou daquele governo, sendo portadora de autonomia didático-científica, conforme a Carta Magna afirma”, declarou a universidade.


Outras acusações de censura nas universidades


Ainda em março, mais casos considerados censura envolvendo o presidente ganharam repercussão. Em 2 de março, dois professores da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) foram advertidos por "manifestação desrespeitosa e de desapreço direcionada ao Presidente da República”.


O docente Eraldo dos Santos Pinheiro e o ex-reitor da universidade, Pedro Rodrigues Curi Hallal, tiveram que assinar um termo de ajustamento de conduta (TAC) após criticarem Jair Bolsonaro em uma live transmitida pela UFPel. O termo de autoria da Corregedoria Geral da União (CGU) foi publicado no Diário Oficial.


Também repercutiu um ofício enviado pelo Ministério da Educação (MEC) a dirigentes da Rede de Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes) em 7 de fevereiro. No documento, o órgão pede providência das instituições para “prevenir e punir atos político-partidários em instituições públicas de ensino”.

 

*O trecho foi alterado devido a um erro de informação. Antes, o trecho informava que a professora depôs na última quarta-feira (10).

*Estagiária sob supervisão da editora Ana Sá

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