Conquista

Chico César, Martinália e time de peso celebram 10 anos da Lei de Cotas

Idealizado pela União Nacional dos Estudantes (UNE), trabalho conta, ainda, com participação de Fabiana Cozza e Leci Brandão

Jáder Rezende
postado em 29/08/2022 17:33 / atualizado em 30/08/2022 17:23
Cena do vídeo 'As Cotas', da UNE, que será lançado nesta segunda-feira (29) -  (crédito: Reprodução/Youtube UNE)
Cena do vídeo 'As Cotas', da UNE, que será lançado nesta segunda-feira (29) - (crédito: Reprodução/Youtube UNE)

Marcando os dez anos da Lei de Cotas, a União Nacional dos Estudantes (UNE) reuniu grandes nomes da música brasileira em um clipe lançado nesta segunda-feira (29). Com música de Chico César e letra de Carlos Rennó, o vídeo teve a maior parte das cenas gravadas no prédio histórico da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no Largo São Francisco. O clipe foi lançado na segunda-feira (29/8), no canal oficial da UNE no Youtube.

Entre os artistas que se engajaram na mobilização e atuaram no filme, figuram Fabiana Cozza, Flor Gil, Os Gilsons (Francisco Gil, João Gil, José Gil), Iara Rennó, José Miguel Wisnik, Célia Xakriabá, Edvan Fulni-ô, Leci Brandão, Letícia Sabatella, Martnália, Moreno Veloso, Teresa Cristina e Vitão.

Com o clipe “As Cotas”, a UNE quer ampliar o debate público sobre a urgência da continuidade e revisão da Lei, que tem vigência prevista até 2022, e que transformou o acesso das universidades federais.
“Temos certeza da importância dessa política pública para alcançar uma universidade popular, como a que temos hoje. Precisamos continuar avançando e aprofundando, com mais políticas de permanência, acesso às bolsas de extensão e promovendo diversidade nas formulações da universidade”, diz a presidenta da UNE, Bruna Brelaz, completando que o clipe é um manifesto audiovisual para celebrar e ampliar o debate público sobre a importância da continuidade das ações afirmativas.

“Ampliar e dar continuidade a essa política pública é um dos nossos principais desafios; universidades brasileiras popularizadas, com diversidade cultural, sendo pilares para o desenvolvimento do país e de redução das desigualdades”, observa Bruna Brelaz, presidente da UNE.

Para Fabiana Cozza, os estudantes cotistas estão transformando a universidade em "plurversidade". "Saberes e estudos nunca antes aceitos estão se tornando tema de pesquisa, gerando novas disciplinas, ampliando perspectivas e abordagens teóricas, introduzindo personalidades que há décadas discutem outros Brasis que foram sufocados pelo racismo", diz a artista. "Os saberes de povos originários e negros estão fazendo deste espaço um lugar mais arejado e mais inclusivo. Sim às cotas! As cotas abrem portas e janelas para e no mundo", completa.

Fabiana Cozza, que participa do clipe: "As cotas abrem portas e janelas para e no mundo"
Fabiana Cozza, que participa do clipe: "As cotas abrem portas e janelas para e no mundo" (foto: Divulgação)

Dirigido por Fábio Bardella e Guilherme Martins, que assinam o roteiro, juntamente com Camila Ribeiro, o clipe mostra a trajetória da população negra e indígena no Brasil, desde à colonização até os dias atuais, passando pela histórica conquista da Lei de Cotas, em 2012, como uma ação afirmativa para reparar a privação de oportunidades gerada pelos 300 anos de escravidão.

De acordo com os roteiristas, “a narrativa conduz os espectadores pelos nobres corredores do Largo de São Francisco, sede da Faculdade de Direito da USP, ocupados não mais por membros da elite, mas por povos indígenas, estudantes de pele negra, pessoas LGBTQIAP+ e toda a diversidade que agora desfila pelas universidades brasileiras”.

“Comprovadamente, após dez anos, o perfil dos estudantes mudou, graças à política de cotas. E essa é a principal narrativa do filme, que busca contar a história de estudantes que tiveram suas vidas e de suas famílias transformadas por essa ação afirmativa. O vídeo funciona ainda como um estímulo visual para defender a ampliação das cotas e sua renovação nas instituições de ensino”, diz Bardella.

Segundo ele, a escolha da locação não foi aleatória. “O Largo de São Francisco, além de ser palco de grandes manifestações pela democracia, como no caso do ato que reuniu milhares de pessoas no dia 11 de agosto, na leitura da Carta pela Democracia, também representa um símbolo da elite intelectual, que por muitos anos foi composta apenas de homens brancos.”

Com o lançamento do filme, a UNE quer contar uma nova história, protagonizada por Letícia Chagas e Bruna Brelaz, primeiras presidentas negras do Centro Acadêmico XXI de Agosto e da União Nacional dos Estudantes, respectivamente. Ambas são mulheres negras que, juntas, demonstram a mudança nas salas de aula das universidades.

Além disso, no ano passado a instituição concedeu a outorga do título de doutor honoris causa póstumo a Luiz Gama, um dos principais militantes no movimento abolicionista no Brasil. “As verdadeiras estrelas do filme são, de fato, os novos rostos da universidade brasileira: negros, mulheres, indígenas, pessoas LGBTQIAP+ e toda a gente que chegou à sala de aula graças às cotas”, diz Brelaz.

As Cotas (música de Chico César, letra de Carlos Rennó)

O preto, o pardo, o indígena, no final das contas,
O pobre, o excluído, foi levado em conta,
E o colorido das escolas tomou conta,
Num não à colonização e numa afronta
À escravidão e à exclusão escrotas,
Com as cotas.

E de orgulho renovou-se a nossa cota,
E de alegria que revive e não se esgota
E que resgata o sonho, a esperança morta.
E campi renovaram-se com outras
Visões e perspectivas, percepções e óticas,
Com as cotas.

As cotas abrem portas e comportas
Duma represa de potências que brotam,
E mudam mundos, mudam vidas que importam
E que já não hão de passar incógnitas,
E na nação hão de brilhar indômitas,
Com as cotas.

As cotas
Abrem portas...

Pra corrigirmos nosso rumo, nossa rota,
E interrompermos um rosário de derrotas,
E sermos hexa, sermos hepta, sermos octa,
E afirmarmos uma força apoteótica,
E escrevermos uma história de quem opta
Pelas cotas.

As cotas
Abrem portas.

O empenho do cotista dá na vista, isto se nota,
E o desempenho é igual ao que é geral em média e nota.
E é isto que revela cada estudo, cada amostra.
Nas salas, corredores e no campus, tudo mostra
As cores do país do povo de que a gente gosta;
As caras do Brasil que a gente aprova e no que aposta.
E a prova da aprovação das cotas, a resposta
De tal questão, nas universidades tá exposta:
Que racial e socialmente mesmo só se dota
De um corpo discente justo justo se se adotam
As cotas,
As cotas.

As cotas
Abrem portas.

E já que a vil desigualdade nos revolta,
E já se viu que há de vir reviravolta,
E a biodiversidade humana nos exorta,
E um plano de oportunidades mil aporta
E deixa a casa-grande e a branquitude atônitas,
Com as cotas...

E um mero rato de um meritocrata arrota
Seu ideário ideal de ideias rotas,
O deputado que é de fato e que denota
Que é democrático, que não é um hipócrita,
Um bosta, um lambe-botas, não se obsta
E não boicota e não sabota, e vota
Pelas cotas.

As cotas
Abrem portas.

O filho do pedreiro, a filhota
Da faxineira vão ter cota,
E já que nossas cotas são anticaóticas
E antirracistas, dignas de nota,
E antidistópicas porém não são exóticas,
Já que são tópicas e utópicas, são ótimas
Nossas cotas.

As cotas
Abrem portas.

 

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