Opinião

"Regulamentação de faculdades particulares é urgente", diz presidente da UNE

Manuella Mirella, presidente da UNE, fala em artigo sobre a qualidade dos cursos de ensino superior privado, tema discutido nesta semana pela Conferência Nacional da Educação

Correio Braziliense
postado em 30/01/2024 18:29 / atualizado em 30/01/2024 18:52
"O lobby dos grandes tubarões de ensino conseguiu aprovar controversas fusões entre universidades estrangeiras e nacionais", afirma Manuella Mirella, presidente da UNE - (crédito: Karla Boughoff/UNE)
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Assim como eu, hoje, a esmagadora maioria dos estudantes brasileiros está no ensino privado. 75,8% das matrículas em instituições de ensino superior são em faculdades particulares. É daí que vão se formar os futuros engenheiros, professores, médicos, advogados, enfermeiros, que representam a mão de obra qualificada brasileira.

Apesar da concentração nessas instituições, os dados do último ENADE (2022) evidenciam a baixa qualidade na educação superior privada. Nas instituições com fins lucrativos mais de 853 mil estudantes alcançaram o conceito 2, que caracteriza um desempenho ruim e rendimento abaixo da expectativa do exame, em uma escala que vai até 5.

A ideia da avaliação era de que cursos com nota igual ou inferior a 2 poderiam sofrer sanções negativas do Ministério da Educação caso não se comprometam em melhorar a qualidade de ensino e o desempenho de seus estudantes. Entre as 6.360 universidades privadas participantes, apenas 1,4% obtiveram a avaliação máxima.

O ministro da Educação Camilo Santana já tem declarado alerta vermelho para diversos cursos. O papel do MEC é coordenar e avaliar. O ministério deu um passo importante ao anunciar que vai investigar a alta proporção de alunos por professor em cursos de ensino à distância em detrimento à qualidade de ensino em 11 instituições particulares.

Durante a Conae (Conferência Nacional da Educação), realizada nos últimos dias e que aprovou deliberações para a construção de um novo Plano Nacional de Educação (PNE), a UNE ressaltou a urgência da pauta da regulamentação do ensino superior privado com o objetivo de proteger e gerar perspectivas para essa geração de estudantes, por meio de uma educação de qualidade.

Se o PNE é a lei que irá permear as políticas educacionais dos próximos anos, e o objetivo é que elas sejam estruturantes para o desenvolvimento nacional, as instituições de ensino superior privadas devem ser fiscalizadas conforme as mesmas exigências aplicadas à educação pública.

Muitas dessas instituições contam com recursos públicos de programas como o ProUni e Fies, por isso, é essencial que haja contrapartida quanto à qualidade dos cursos e transparência quanto aos reajustes de mensalidade.

Desde 2013, tramita no Congresso Nacional o projeto para a criação do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação do Ensino Superior – INSAES. A nova autarquia, ligada ao MEC, estaria atualizada com a política educacional vigente no país e poderia barrar a desnacionalização e mercantilização do setor.

Apesar dos nossos inúmeros esforços, ela nunca saiu do papel e até hoje quem acompanha as fusões e aquisições de universidades é somente o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômico), de um ponto de vista totalmente econômico. Ainda assim, o lobby dos grandes “tubarões de ensino” conseguiu aprovar controversas fusões e aquisições entre universidades estrangeiras e nacionais.

A UNE (União Nacional de Educação) também levou à Conae a moção pela revogação da Portaria nº 2117, de 2019, que autorizou 40% de aulas à distância em cursos presenciais, independente de indicadores de qualidade. Estudantes que ingressaram em cursos 100% presenciais viram quase metade da sua grade tornar-se on-line, sem qualquer mudança em sua mensalidade. Matérias de primeira importância estão sendo realizadas de forma remota, em salas de aula virtuais superlotadas.

O documento foi aprovado para estar na construção do PNE e assinado por mais de 20 entidades, entre elas Andifes, CNTE, CUT, Fasubra, Proife e Abruc. Sendo assim, é muito mais que uma demanda estudantil.

É necessário a criação de um órgão de Estado, com capacidade de regular, fiscalizar e que tenha mecanismos que atuem na garantia de padrões de qualidade, por uma produção de conhecimento, de ciência e inovação que sirva ao Brasil. A ideia da auto regulação dessas instituições não poderá ser aceita, quando está em jogo o futuro de uma geração inteira de profissionais. A transformação do país depende da implementação de medidas efetivas por parte do governo, do comprometimento dos grandes conglomerados do ensino privado e da fiscalização da sociedade civil.

*Manuella Mirella é presidente da UNE e estudante de engenharia ambiental na Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU).

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