E o salário?

Correio Braziliense
postado em 17/10/2020 00:32

Apresentar a remuneração como motivo para não aceitar uma proposta ou o fato de ter recebido uma oferta financeiramente mais atrativa pode queimar seu filme? Para Flávio Pestana, CEO da Odgers Berndtson, a resposta é “não”. “Se você disser para o recrutador que se interessou pela vaga, mas, por exemplo, o salário está aquém do que você precisava ou imaginava ganhar, isso não vai te prejudicar com a empresa”, justifica.

“Na hora de pedir demissão, é importante ser transparente. Você pode dizer, por exemplo, que recebeu uma proposta que te interessa muito porque oferece um salário ou posição melhor. Por mais que isso possa gerar uma irritação momentânea no empregador, ele vai entender que cada profissional precisa buscar o que é melhor para ele”, completa.


Cuidado: transparência tem limite!

Ao participar de processos seletivos de trabalho enquanto você está empregado, pode surgir a seguinte dúvida: “devo contar ao meu chefe?”. Afinal, dessa forma, ele estaria preparado para um possível desligamento. Na opinião de especialistas em RH, no entanto, a resposta é “não”. Aqui, realmente, vale a máxima melhor um pássaro na mão do que dois voando. Ao avisar o líder da intenção de sair, a pessoa corre o risco até de ser mandada embora, de passar a ser boicotada ou se prejudicar de outra forma. “Uma vez que a chefia sabe que o funcionário está participando de outra seleção, ela provavelmente ficará desconfortável com a situação”, explica Flávia Alencastro.

“E o profissional não sabe qual será o resultado da seleção. Ele pode correr um risco desnecessário”, completa. “Eu recomendo não comentar”, diz Flávio Pestana. “Transparência tem limite”, brinca. De acordo com o especialista em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV), ao comunicar essa informação para a empresa, o profissional demonstra que está insatisfeito com o ofício. “O chefe vai pensar: ‘por que manter aqui alguém que não quer trabalhar quando tanta gente quer?’. E é importante lembrar que há tanto uma chance de ser aprovado quanto de o contrário acontecer.”


Quando rejeitar uma promoção?

Pode parecer estranho, mas nem sempre a oportunidade de subir de cargo é a mais adequada. O bom senso diz que os profissionais agarrem as oportunidades que surgem no horizonte, afinal, “um raio não cai duas vezes no mesmo lugar”, correto? Porém, sempre há exceções. Em algumas situações, não aceitar uma promoção pode ser o melhor para o profissional.

O time de analistas da consultoria de carreiras e RH Thomas Case & Associados preparou uma lista de reflexões para a hora de avaliar uma proposta do tipo. A mesma análise também pode ser adotada quando receber uma oferta de emprego. Seja qual for a proposição que se coloca sobre a mesa, mesmo quando há um salário maior envolvido, é importante avaliar o cenário para tomar a melhor decisão.


Antes de aceitar um cargo mais alto, avalie...

» Se você se julga efetivamente preparado para a nova função;

» Se o desafio envolvido é, de fato, interessante;

» Se o interesse na promoção se resume à remuneração;

» Se há sinergia entre os valores da empresa e os seus;

» Se o novo cargo será realmente motivador;

» Qual será o tamanho do impacto à sua vida

pessoal no caso de aceitar a proposta;

» Qual rotatividade esse cargo apresentou anteriormente.

» E, se, por fim, você decidir recusar a promoção, existe chance de se queimar? Segundo a Thomas Case & Associados, isso vai depender do jeito que você declinar da oportunidade. Além disso, nem todas as empresas são iguais e o ponto mais importante é como a proposta de promoção foi colocada à sua frente. Total mudança de responsabilidades, necessidade de mudança de cidade ou de país e o fato de herdar a posição de um colega são exemplos compreensíveis que podem levar à recusa da ascensão corporativa.

Artigo

O autoconhecimento e a honestidade ao declinar de uma proposta

Por Mylena Cuenca

“Ter um bom currículo e reunir as principais competências que estão sendo demandadas pelo mercado de trabalho tornam alguns profissionais muito disputados entre as empresas. A maioria dos candidatos com esse perfil, quando está em busca de uma recolocação ou mesmo de fazer uma transição de carreira, acaba participando de vários processos seletivos e, por isso, em algum momento, precisa declinar de algumas propostas. O problema é que a maioria dos profissionais não sabe como ou quando dizer não para uma oferta de trabalho. Essa atitude acaba gerando um tremendo desconforto em todos os envolvidos no processo seletivo.

Antes de pensarmos sobre qual a melhor forma de recusar uma oferta, é importante destacar que o profissional precisa conhecer profundamente os motivos que o estão direcionando para essa movimentação na carreira. Se o candidato não sabe o que espera conseguir, se não tem um plano de carreira bem definido, o processo de decisão entre uma vaga e outra acaba sendo muito confuso. O autoconhecimento, portanto, é o primeiro passo para os profissionais que participam de mais de um processo seletivo. É muito importante entender profundamente cada oportunidade, cultura, valores e se, de fato, aquela oportunidade combina com você e está dentro das suas habilidades técnicas. Se você optar pela oportunidade ‘errada’, irá se arrepender logo nos primeiros dias.

O segundo passo, não menos importante, é a transparência, ou seja, a honestidade com os recrutadores desde o início do processo. Deixar claro para as empresas que você está participando de mais de um processo seletivo é indispensável para que você construa um elo de confiança e profissionalismo com as pessoas que podem ser seus futuros empregadores. Você deve ser transparente em todas as situações. Obviamente não irá comentar com seu líder que está buscando novas oportunidade fora, mas deve deixar sempre claro nos feedbacks mensais ou semestrais o que realmente busca, e o que está esperando dentro da cadeira em que está e o prazo em que isso deve acontecer para evitar surpresas.

Alguns candidatos me perguntam qual é o melhor momento para desistir de um processo seletivo e o que eu digo é: o quanto antes. Ou seja, assim que o profissional souber com clareza que aquela vaga não está dentro de suas expectativas. Isso pode acontecer em vários momentos. Para aqueles que têm um plano de carreira definido, muitas vezes, no contato telefônico com o headhunter, assim que a oportunidade é apresentada, consegue-se discernir se aquela vaga está ou não dentro de suas expectativas. Para outros, isso acontece apenas na entrevista de emprego, quando são apresentadas as expectativas, os desafios da vaga e o pacote de remuneração. Esse é um momento importante para dizer ‘não’ ou para apresentar suas expectativas para o recrutador.

No entanto, em alguns casos ocorre que o profissional espera até a última etapa do processo seletivo para aí, sim, declinar da proposta, o que se torna muito frustrante para o futuro empregador e para o recrutador da posição. Esse tipo de caso costuma gerar um grande mal-estar entre todos aqueles que se envolveram na seleção. É claro que pode acontecer de o candidato estar verdadeiramente interessado na proposta, nos desafios e na remuneração e, nos 45 do segundo tempo, mudar de ideia. Mas, certamente, se ele tivesse maior clareza sobre seus motivadores de carreira, isso dificilmente aconteceria.

Nesses casos mais críticos, o profissional sai do processo seletivo marcado negativamente e acaba por se prejudicar com a empresa e com o recrutador, principalmente se não tiver sido transparente sobre as suas intenções desde o início. É importante recusar uma oferta pelos verdadeiros motivos que te fazem declinar. Se no início do processo você disse para o headhunter que seu principal motivador é a mudança de carreira, alertando que o salário ou o pacote de remuneração não são o foco nesse momento, é incoerente recusar uma proposta dizendo que recebeu uma contraproposta salarial na sua atual posição.

É claro que para que o profissional seja transparente sobre suas intenções, o recrutador tem que dar abertura e criar um ambiente de confiança. Nós, brasileiros, temos medo de parecermos prepotentes ao dizer que estamos buscando uma remuneração mais alta. Parece mais nobre dizer que queremos outras oportunidades e desafios de carreira, mas não se chega a lugar nenhum omitindo suas reais intenções. O recrutador precisa dar essa abertura para que o candidato se abra verdadeiramente.

Quando o profissional finalmente decidir encerrar sua participação, é educado fazer isso de maneira pessoal e humana. Uma ligação para os recrutadores, incluindo headhunter e gestores da empresa, explicando seus reais motivos, é imprescindível. Em alguns casos, quando existe essa abertura e quando se construiu um canal de confiança, o candidato pode, inclusive, indicar outros colegas de profissão para fazer parte do processo seletivo.

Por fim, aconselho que você siga todos esses passos de maneira empática, demonstrando gratidão e revelando os motivos que o fazem desistir da proposta. Tratar o assunto com a delicadeza e atenção que ele merece mostra para os recrutadores que você tem profissionalismo e senioridade. Essa postura não só fortalece a relação de confiança como também o deixa no radar para as próximas oportunidades. Saber declinar de uma proposta de forma ética e correta até ajuda a construir um marketing pessoal que acrescenta ainda mais valor ao seu perfil profissional.”

Por Mylena Cuenca, headhunter na consultoria Trend Recruitment e formada em administração de empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie

 

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