Violação de direitos

Nenhuma forma de trabalho infantil deve ser reconhecida, segundo procuradora

Há categorias de emprego que, se realizadas por uma criança, são passadas despercebidas pela sociedade. Especialistas afirmam que há outra saída, menores que não estudam não necessariamente irão roubar

Maryanna Aguiar*
postado em 12/07/2021 22:04 / atualizado em 12/07/2021 22:34
Ana Maria Villa Real, procuradora do Trabalho, coordenadora Nacional da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente -  (crédito: Arquivo Pessoal)
Ana Maria Villa Real, procuradora do Trabalho, coordenadora Nacional da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente - (crédito: Arquivo Pessoal)

Ainda mais alarmantes são os tipos de trabalho realizados por crianças e adolescentes frequentemente admitidos pela sociedade. O comércio ambulante, o guardador de carros e o guia turístico, tornando o trabalho na infância invisível, aumentando seu ciclo de aceitação.

É preciso que a sociedade reconheça os impactos e consequências físicas e psicológicas na vida de meninos e meninas que trabalham, desconstruindo assim, a falsa ideia de que o trabalho precoce é um caminho possível para o desenvolvimento humano e social. Antes de trabalhar, é direito da criança e do adolescente estudar, brincar, socializar com outras crianças.

A procuradora do trabalho do Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal, Ana Maria Villa Real registra que o perfil das crianças e adolescentes que trabalham nas ruas se encaixam bastante nas pesquisas do IBGE, quando afirmam que 66% do trabalho infantil é feito por negros, pretos ou pardos, crianças e adolescentes pobres de comunidades periféricas, de gênero masculino geralmente.

Segundo ela, a sociedade precisa se conscientizar para exercer o controle social adequado. Precisa entender que o trabalho infantil é uma grave violação dos direitos humanos, e deixa sequelas irreversíveis.

“O trabalho infantil também causa acidentes de trabalho graves. A gente tem dados assusta dores no Sinan (Sistema Nacional de Agravos e Notificações), que revelam que, em 13 anos, nós temos 290 mortes de crianças e adolescentes trabalhando, temos quase 30 mil acidentes de trabalho graves nesse mesmo período, e o que é mais alarmante é que o próprio Ministério da Saúde reconhece que o Sinan é um sistema em que há subnotificação”, lamenta.

Esses dados, portanto, não traduzem a realidade do que é vivenciado pelos adolescentes. A infância deve ser livres porque a criança ou adolescente são sujeitos a direitos, como saúde, educação, convivência comunitária, familiar, profissionalização; respeito, dignidade.

“Por isso, nós fazemos campanha de conscientização, justamente para informar a sociedade dos malefícios do trabalho infantil e é isso que temos tentado mudar, muitas vezes, as próprias famílias com desesperanças de que aquela é a única saída para o filho que é preto, de família periférica, aquele mito de que quem não trabalha ou se droga, ou vai roubar, quando na verdade não existem só essas duas alternativas para a criança, existem outras, como escolas de tempo integral ou atividades de contra turno, para que ela possa se desenvolver”, argumenta a procuradora.

Segundo ela, atividades de lazer, esportes, reforço escolar podem distanciar as crianças desse tipo de realidade, e a sociedade também precisa estar consciente que toda a infância é igual perante à Constituição Federal e o Estatuto da Crianças e do Adolescente (ECA).

Para o conselheiro tutelar Gustavo Henrique da Silva, o Brasil está enfrentando uma pandemia que trouxe uma crise econômica, na qual as famílias estão sendo obrigadas a sair de casa mesmo com a pandemia para buscar formas de sobrevivência, uma vez que os auxílios emergenciais não têm suprido às necessidades básicas da população.

Isso tem contribuído de forma significativa para o aumento do trabalho infantil: “A gente precisa ter consciência e quebrar essa construção cultural de que é melhor estar trabalhando do que na rua, quebrar esses estigmas, porque uma criança em situação de exploração de trabalho infantil normalmente abandona a escola. Quando ela ficar mais velha pode ter vários problemas de saúde dependendo do local em que esteve trabalhando” alerta o graduado em direito.

 

*Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Luisa Araujo

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