Considerado um dos pontos mais polêmicos, o trabalho aos domingos vem sendo muito debatido entre especialistas. A ideia não é nova. Já havia sido tratada na Medida Provisória 905, em 2019. Porém a medida foi rejeitada pelo Senado, que concedeu a autorização apenas para algumas categorias.
O estudo propõe o trabalho aos domingos, desde que uma folga a cada sete semanas recaia nesse dia. A medida altera o artigo 67 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e determina que todas as categorias possam realizar o descanso semanal de 24h em qualquer dia da semana e não, obrigatoriamente, no domingo.
Segundo o relatório, hoje, para se trabalhar aos domingos, é necessário estar na lista de atividades autorizadas pela Secretaria Especial do Trabalho ou contar com autorização de entidade sindical, mediante convenção ou acordo coletivo.
A proposta prevê a reversão das altas taxas de desemprego e a diminuição da burocracia para contratar empregados que trabalhem aos fins de semana.
Atualmente, o trabalho dominical é autorizado nas atividades do comércio, desde que, a cada três semanas trabalhadas o descanso semanal remunerado coincida com o domingo. Além disso, o empregador deve estabelecer uma escala de revezamento, mensalmente organizada, e disponibilizá-la para os empregados de forma antecipada.
A advogada trabalhista Karolen Gualda considera, ainda, que a proposta amplia muito as regras da CLT e que pode ser vista como um retrocesso nas lutas pelos direitos trabalhistas. "Tudo que o trabalhador conseguiu lá atrás, garantindo seu domingo de folga, pelo menos, a cada mês, seria dar um passo para trás", diz.
Já para a especialista em Compliance Trabalhista Érika de Mello, esse não é o "pior" dos problemas da proposta, tendo em vista que o trabalho aos domingos já é flexibilizado por norma coletiva. Ela pontua que a jornada tradicional vem sendo quebrada há algum tempo e muitos trabalhadores até preferem descansar em outros dias da semana. "Para algumas pessoas, faz todo sentido, pois são rotinas diferentes e faz parte da realidade".
Segundo a especialista, a melhor forma de solucionar a questão é compreender a demanda social. Para isso, seria necessário ouvir todos os envolvidos, por meio de consulta pública, e encontrar uma possibilidade equilibrada.
Da mesma forma, o juiz do Trabalho Otavio Calvet acredita que a linha seguida pelo estudo é de que, em uma economia enfraquecida, como a do Brasil, incentivar a atividade econômica é mais importante do que manter a tradição do descanso aos domingos. "É uma medida drástica, que mexe com a nossa cultura de descanso aos domingos, mas também pode ajudar o mercado a se desenvolver", considera. "É, realmente, questão de escolha da sociedade. É importante lembrar que, na proposta, a questão biológica do repouso continua igual, uma vez por semana. O que mudaria é essa cultura do descanso aos domingos", diz.
Desburocratizar para empregar?
Em novembro de 2017 foi promulgada a Lei 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista. Com o intuito de multiplicar os empregos no país, a nova lei apostava na flexibilização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Contudo, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de desempregados subiu de 12,4 milhões, em 2017, para 13,4 milhões no terceiro trimestre de 2021.
Karolen Gualda, advogada e especialista em Direito do Trabalho, destaca que a reforma trouxe muita flexibilização da legislação, tanto é que alguns pontos ainda estão sendo questionados. Para ela, o novo estudo visa flexibilizar e facilitar as contratações, sinalizando o interesse do governo. "Fazendo com que o empregado não fique tão caro, seria possível fazer mais contratações e criar novas vagas de emprego", analisa.
A especialista ressalta, no entanto, que não foi isso que se observou, na prática, já que uma reforma trabalhista não seria capaz de criar, automaticamente, vagas de emprego. "Já se comprovou que a flexibilização das normas não trouxe esse aumento do número de vagas", destaca. Para Karolen, vaga de emprego se cria com a economia mais forte e com uma política tributária diferenciada. "Não vejo muito sentido e acho que enfrentaremos novas batalhas judiciais", prevê.
Ela espera que um debate amplo envolva as principais partes interessadas, empregadores e empregados. "O estudo é aprofundado, mas é um tanto polêmico por não ter havido debate. Se for aprovado assim, a chance de insegurança jurídica é ainda maior", afirma. O ponto principal, para Karolen, é que o assunto seja de ciência de todos que serão afetados.(KH)