Serviço militar

Mulher como personagem principal

Conheça as histórias de duas oficiais com grandes conquistas profissionais no Exército Brasileiro

Correio Braziliense
postado em 06/03/2022 00:01
 (crédito: Ten. Fuldare/Exército Brasileiro)
(crédito: Ten. Fuldare/Exército Brasileiro)

O sucesso da gestora

Mesmo com uma família sem histórico militar, a coronel Maria Sandra Andrade, 57 anos, protagonizou uma carreira de grandes conquistas no Exército Brasileiro. Neste ano, ela completa três décadas de serviço no Exército. Foi uma das primeiras mulheres a ingressar na turma inaugural mista, em 1992.

Nascida em Aiuaba, interior do Ceará, Sandra conta que soube da abertura do concurso público para a primeira turma mista do Exército por um folheto encontrado, por acaso, na rua. Ela lembra que sua mãe sempre aconselhava os filhos a estudarem para serem independentes. Seguindo os ensinamentos da mãe à risca, resolveu, então, encarar esse desafio. A tão ansiada notícia da aprovação, recorda ela, foi recebida por telegrama. Depois, ingressou na turma da capital baiana, onde recebeu os mesmos treinamentos dispensados a militares masculinos, o que ela considerou um grande passo: "Para gente, era uma conquista", diz.

A coronel também buscava uma oportunidade profissional que a deixasse realizada. "Era ter fé de que teria uma carreira, de que iria terminar com brilho nos olhos. Depois de 30 anos, ainda tenho a vibração e o brilho nos olhos de representar essa instituição e de ter construído uma carreira de muito orgulho e satisfação", relata, confessando que sempre gostou de desafios, por isso escolheu o Exército. Hoje, dirige o Hospital Militar de Área do Recife (HMAR), onde se notabilizou como a primeira enfermeira a assumir um cargo de direção em um hospital militar do Exército Brasileiro.

Sandra revela que um dos momentos mais marcantes da sua trajetória no Exército ocorreu durante a Operação Enchente, quando foi designada a coordenar todo o apoio de saúde no hospital de campanha do Comando Militar do Nordeste. A instalação estava montada em um campo de futebol. No 15º dia de funcionamento, a equipe recebeu uma paciente especial, uma gestante que deu à luz a uma menina. De acordo com a coronel, a criança, de nome Maria Clara, nasceu saudável e "chorando alto". "Ela nasceu no hospital de campanha, instalado em um campo de futebol. Era um bebê muito lindo. Foi um momento que eu guardei com muita emoção", conta.

A militar enxerga o Exército como uma "organização de oportunidades" e diz que seu objetivo é continuar ajudando a instituição e a sociedade brasileira com seus serviços. "O Exército teve papel fundamental ao me preparar para assumir postos de liderança. Empenhei-me para ser gestora", diz. Para ela, o grande legado das pessoas que compõem o quadro do Exército é estar disponível 24 horas nos sete dias da semana para a sociedade brasileira, seja atuando interna ou externamente.

Ela acredita que sua trajetória pode incentivar outras mulheres ao redor do país e reforça que a educação é peça-chave para as jovens conquistarem seus sonhos. "Estudem, e qualquer sonho pode ser realizado", aconselha, ponderando que todas essas conquistas profissionais não a impossibilitaram de formar uma família. Sandra é casada e mãe de três filhos. E lembra, ainda, que sempre contou com o apoio do Exército durante a gravidez e que, como na corporação, sua família tem por lema a parceria. "Por isso, seguir na carreira militar não foi uma dificuldade. Meus filhos sentem orgulho da mãe e continuam apoiando meu trabalho", comemora.

Ela revela que, entre seus planos para o futuro, o principal é continuar contribuindo em conjunto com a instituição e desenvolver um Hospital Escola do Exército para oferecer atendimento médico, além de desenvolver pesquisas e estudos.

Rumo à África

Paula Maria Moretto é mais uma que optou por abraçar a carreira militar e se considera "prova viva" de que depois dos 40 existe, sim, a possibilidade de realizar sonhos ou construir uma carreira profissional. Aos 50 anos de idade, ela segue em direção ao continente africano, viagem que marca a primeira participação da agora major Paula em uma missão de paz.

Nascida em Recife, a pernambucana terá que cruzar o Atlântico para chegar ao destino da missão, Bangui, capital e maior cidade da República Centro-Africana, onde passará 12 meses ajudando a população do país. Na missão, ela representará o Brasil como oficial de Estado-Maior no Quartel General da Minusca.

O Exército conquistou, aos poucos, o coração da oficial, formada em Ciência da Computação pela Universidade de Brasília (UnB). Ela conta que, em 1998, estava em dúvida sobre qual caminho seguir na vida profissional. Decidiu, então, experimentar a vida militar. No mesmo ano, fez parte das 98 mulheres que ingressaram na turma mista de oficiais temporários, mas não demorou muito para ingressar como oficial de carreira do Quadro Complementar de Oficiais em 2001, na área de Informática. Paula revela que se encontrou no exército por ser um ambiente onde se sentiu valorizada.

Ela se considera uma pessoa altruísta e, por esse motivo, decidiu embarcar na missão para o continente africano. "Eu vejo na missão uma oportunidade de fazer a diferença, deixar lá um tijolinho de ajuda na construção de um país melhor, o que chamamos no Exército de braço forte e mão amiga" diz Paula.

O requisito básico para participar de uma missão é a habilitação no idioma exigido pela Missão Internacional de Paz. No caso da major Paula, a missão será monitorada pela Organização das Nações Unidas (ONU), que tem o inglês como o idioma principal. Com especialização em inglês e italiano, ela está se preparando para estudar francês para compreender melhor a população.

Além da formação militar básica aprendida no Exército, os oficiais que têm interesse em participar das missões de paz fazem cursos preparatórios da ONU para expandir o conhecimento sobre a abordagem em cada país a servir.

Dentro da missão, a equipe é dividida nos grupos de Observador Militar e Estado-Maior. No primeiro caso, o oficial mantém contato direto com a população e escreve relatórios para o quartel general. Aqueles que compõem o segundo grupo são responsáveis por analisar o material dos relatórios e repassar as informações para os comandantes da missão. Mesmo sendo uma missão de caráter individual, o trabalho é feito em conjunto.

Como para a coronel Maria Sandra, a maternidade não foi um problema para a major Paula. Ela confessa que tanto o marido quanto o Exército, que ela considera sua "segunda família", tiveram papel crucial para o crescimento das duas filhas. "Desafios enfrentados da mesma forma que toda mãe que trabalha", afirma a major que, em agosto. deverá estar cumprindo sua missão na África, e não esconde a ansiedade e expectativa para viver essa nova experiência. "Enfrentar esse contato multicultural me enche de alegria", diz.

O Brasil já participou de mais de 50 operações de paz e missões similares. Essas missões têm como objetivo ajudar países devastados por conflitos e, consequentemente, propiciar condições para paz. Atualmente, o Brasil participa de sete das 12 missões das Nações Unidas (ONU). Os serviços prestados são distribuição de água e comida, resgate de reféns e proteção de civis, e os oficiais não têm autorização para utilizar armamento, uma vez que o objetivo é criar um elo de confiança com as pessoas e não as intimidar. Porém o uso da força militar apenas é permitido em casos de legítima defesa.

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