Subnotificação

Desmonte de políticas

Critério defasado de contagem é contestado por entidade que atua com crianças e adolescerntes. Projeto do Executivo federal que reduz de 16 para 14 anos a idade mínima para o trabalho é rechaçado

postado em 12/06/2022 00:01

Reflexo de investimento em pesquisa e em sistemas de monitoramento capazes de interligar as diversas áreas relativas à infância e à adolescência, a subnotificação de pesquisas chama a atenção da secretária Executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), Katerina Volcov, que defende a melhoria de sistemas de fiscalização integrados.

"Infelizmente, as subnotificações são uma realidade brasileira em muitas áreas. É urgente a necessidade de um sistema de monitoramento das políticas voltadas à infância e à adolescência, bem como das distintas violações contra crianças e adolescentes", diz Volkov, observando que um sistema de monitoramento integrado facilitaria o trabalho da rede de proteção e possibilitaria um acompanhamento pormenorizado e especializado da criança e do adolescente em condição de vulnerabilidade ou em extrema vulnerabilidade.

Volkon engrossa o coro dos que consideram urgente mais investimento em políticas públicas de proteção social e que garantam dignidade a todos os cidadãos. "Na atual conjuntura de fome e miséria, para que consigamos erradicar o trabalho infantil é imprescindível que políticas de transferência de renda, principalmente, junto a crianças e adolescentes, sejam implementadas", afirma.

Coordenador do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Evandro Valadão, é mais um a alertar para a necessidade urgente de ações efetivas no combate ao trabalho infantil. "É imperativo exortar o Estado para o combate à erradicação desse tipo de trabalho. A sociedade não cumpre o que estabele a própria Constituição. O que observamos é o lado da crueldade humana. A falta de políticas públicas eficazes traz desesperança e infelicidade", diz.

Idade mínima

A proposta do Executivo federal de reduzir a idade mínima para o trabalho, de 16 para 14 anos, é outro ponto criticado pelo ministro. "Querem alcançar dois nítidos resultados, estimular a aprendizagem e a empregabilidade, mas são coisas distintas, que podem se chocar. Se aumenta a empregabilidade sem dar condições de capacitação, não adianta nada", avalia, observando que as mesmas regras se aplicam ao Programa Jovem Aprendiz, que também pode ser descaracterizado pelo governo. Para Valadão, a permanência de crianças e adolescentes nas salas de aula são fatores prioritários.

A assessora de Políticas Públicas da Fundação Abrinq, Marta Volpi, considera que a fixação da idade mínima para o trabalho aos 16 anos foi um grande avanço da legislação nacional, impulsionado pelo movimento internacional pela proteção a crianças e adolescentes e que a redução da idade mínima para admissão viola o compromisso assumido pelo Brasil como a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

"O trabalho precoce acarreta em diversas consequências, desde físicas até psicológicas, que podem se perpetuar por toda a vida. A criança que trabalha pode apresentar cansaço excessivo, distúrbios de sono, irritabilidade, alergias e problemas respiratórios. Em casos com um alto esforço físico, as consequências podem ser prejudiciais ao crescimento e até ocasionar lesões na coluna ou deformidades. Também são comuns casos de amputações, fraturas, ferimentos com objetos cortantes e até queimaduras", afirma, ponderando, ainda que as consequências psicológicas e sociais podem se manifestar na capacidade de aprendizagem e até mesmo na forma da criança se relacionar.

"Além disso, o trabalho precoce favorece a evasão escolar e ela, por sua vez, perpetua o ciclo de pobreza, porque a baixa escolaridade e a pouca formação profissional impelem, na maioria das vezes, à baixa remuneração, à informalidade e à baixa competitividade no mercado de trabalho em consequência do próprio trabalho."

Por todas essas razões, afirma Volcov, a Fundação Abrinq, manifesta sua preocupação e sua posição contrária à PEC nº 18/2011, e defende a manutenção da atual redação do artigo 7º, inciso XXXIII, da Constituição Federal.

"Entendemos que a discussão que o Brasil deve fazer é quais medidas econômicas e quais reformas são necessárias para gerar postos de trabalho para os mais de 11,9 milhões de desempregados que estão na força de trabalho, além dos 4,6 milhões de desalentados, propiciando aos adultos meios para garantir o próprio sustento e o cuidado com suas crianças e adolescentes, cuja ocupação deve ser aquela que contribui com seu desenvolvimento integral. É essencial que crianças e adolescentes estejam na escola ou realizando atividades culturais, esportivas, de complementação à escola, que contribuam para o seu desenvolvimento." (JR)

 

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