Quebra de confiança

Afastamento do emprego com atestado fake culmina em demissão sumária

Empresas brasileiras fecham cada vez mais o cerco a funcionários que apresentam atestado médico falso

Jáder Rezende
postado em 03/07/2022 06:00 / atualizado em 03/07/2022 06:00
Especialista em direito do trabalho, o advogado André Leonardo Couto elenca vários motivos para a justa causa -  (crédito: Heberton Lopes)
Especialista em direito do trabalho, o advogado André Leonardo Couto elenca vários motivos para a justa causa - (crédito: Heberton Lopes)

Com o auxílio de redes sociais, empresas podem, agora, monitorar os passos dos empregados e constatar se o pedido de afastamento corresponde aos argumentos apresentados. Recentemente, a 5ª Turma do TRT-2 manteve decisão de 1º grau que condenou por justa causa um empregado que apresentou atestado médico e foi à praia. Para os desembargadores, a conduta do colaborador foi grave o suficiente para quebrar a confiança da empresa no funcionário.

No processo, o funcionário pedia a reversão da justa causa por improbidade, alegando perseguição, argumento que não foi comprovado. Ele também não contestou os "prints" do Facebook do passeio, ocasião em que "dança e realiza atividades incompatíveis com a recomendação médica", conforme os termos utilizados pela empresa empregadora, que comprovou que o vendedor obteve licença médica e foi ao litoral comemorar os 15 anos de casados com a esposa.

"Não se sustenta a alegação de que a ré já tinha ciência da viagem, tampouco que a publicação no Facebook deu-se após o horário do expediente, pois o fato é que apresentou atestado médico que prescrevia afastamento do trabalho por um dia e, neste mesmo dia, foi viajar", resumiu a relatora Ana Cristina Petinati.

Dessa forma, foram negados todos os pedidos na ação, incluindo o de indenização por danos morais. Com a justa causa, o trabalhador perdeu direitos como aviso prévio, seguro-desemprego e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

Coordenador Adjunto de Direito e Processo do Trabalho da Escola Superior de Advocacia, o advogado André Leonardo Couto considera correta a decisão do TRT-2. Segundo ele, quando um empregado apresenta um atestado médico na empresa e, na verdade, não está doente e ainda utiliza do atestado médico para poder ir para praia, não há como negar a gravidade dos fatos. Além disso, observa que o elemento "fidúcia", que deve unir as partes no contrato de trabalho, foi quebrado abruptamente pelo empregado, sem se preocupar com a necessidade da empresa.

Essa postura caracteriza justa causa por improbidade, ou seja, ele está gerando um prejuízo financeiro para o empregador, além de outra tipificadora para a pena de justa causa, que é a incontinência de conduta ou mau procedimento", avalia.

Couto lembra o artigo 482 da CLT, que elenca vários motivos para a justa causa, sendo as mais comuns relacionadas a improbidade, que caracteriza atentado contra o patrimônio do empregador; incontinência de conduta (perda da respeitabilidade ou bom conceito, comportamento desordenado em público) e mal procedimento, quando qualquer ato do empregado considerado grave impossibilite a continuação do vínculo empregatício.

O especialista em direito do trabalho observa ainda que, constitucionalmente, é assegurado a todos o Direito de Ação. "O empregado que entender que a justa causa foi aplicada indevidamente, pode recorrer à Justiça do Trabalho para tentar reverter a justa causa aplicada e, obtendo êxito, pode receber as mesmas verbas da dispensa sem justa causa e até mesmo uma indenização por danos morais", diz.

Couto lembra de ações semelhantes à julgada recentemente pelo TRT-2, que manteve a justa causa do empregado que apresentou atestado médico e foi à praia, como a de uma monitora de uma escola infantil que tratava mal as crianças, a maioria com menos de 2 anos de idade. A justa causa aplicada a essa monitora foi mantida pela Justiça. Em outra ação, um grupo de empregadas que se uniu na segunda e terça-feira de carnaval e nenhuma foi trabalhar no telepizza de uma conceituada pizzaria, o que gerou um enorme prejuízo financeiro para a empresa. Todas foram demitidas por justa causa, recorreram e a maioria perdeu a ação na justiça.

O especialista em direito trabalhista observa ainda que a situação mais polêmica da justa causa recai sobre o empregado que se recusa a, injustificadamente, tomar a vacina covid-19. "A maioria das decisões é no sentido que se pode aplicar, sim, a justa causa nesta situação, porque se consubstancia em descumprimento às diretrizes gerais de saúde e segurança no ambiente do trabalho, constituindo, portanto, ato de indisciplina."

 

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