Má qualidade

OAB quer barrar abertura de novos cursos de direito

Presidente da Ordem encaminhará ao MEC pedido para suspensão de novas graduações por cinco anos. Segundo ele, é necessário aprofundar a discussão sobre a imprescindibilidade de aperfeiçoar, constantemente, o ensino jurídico

Jáder Rezende
postado em 18/12/2022 06:00 / atualizado em 18/12/2022 06:00
Simonetti: A visão mercantilista do ensino celebra o fato de chegarmos a 1,3 milhão de advogados e advogadas no Brasil, mas não presta contas da qualidade do ensino
Simonetti: A visão mercantilista do ensino celebra o fato de chegarmos a 1,3 milhão de advogados e advogadas no Brasil, mas não presta contas da qualidade do ensino" - (crédito: Reprodução/TSE)

A cinco anos do bicentenário do ensino jurídico no país, o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Beto Simonetti, defende a interrupção, por cinco anos, da abertura de novos cursos de direito e todo o território nacional, sob o argumento de que apenas 10% deles receberam o selo OAB Recomenda, concedido pela entidade às instituições de ensino consideradas de excelência. Para Simonetti, o dado configura a má qualidade do ensino jurídico e justifica o alto índice de reprovações no Exame de Ordem.

O Brasil conta com mais faculdades de direito do que todos os países no mundo juntos, com cerca de 1,8 mil graduações e mais de 700 mil alunos matriculados, segundo levantamento da OAB. Para se ter uma ideia do crescimento desordenado do ensino jurídico, em 1995, eram 235 cursos em funcionamento. Hoje, são mais de 1,9 mil autorizados pelo MEC, um ritmo de cinco por mês.

"É necessário aprofundar a discussão sobre a imprescindibilidade de aperfeiçoar, constantemente, o ensino jurídico. Para a advocacia, a qualidade de seus quadros é um dever constitucional, uma vez que os cidadãos têm nas advogadas e nos advogados, muitas vezes, o único meio de buscar a solução de seus conflitos", diz Simonetti.

Ainda segundo ele, a despeito dos esforços da Ordem, é preocupante a disseminação de cursos de péssima qualidade que recebem parecer desfavorável da OAB, mas são aprovados pelo Ministério da Educação (MEC).

O dirigente da OAB nacional observa que a carreira jurídica atrai, todos os anos, milhares de alunos e que a média de novos advogados aprovados nas últimas dez edições do Exame Unificado de Ordem é de quase 30 mil profissionais a cada prova. No último exame totalmente finalizado pela OAB (o 33º EOU), cerca de 50 mil pessoas se tornaram aptas para advogar. A média de aprovação é de um a cada cinco candidatos. ou seja, 80% não foram considerados aptos a exercer a profissão.

O motivo da alta reprovação, aponta Simonetti, é a baixa qualidade dos cursos, uma vez que não há limite de vagas e cada candidato só concorre consigo mesmo. A última edição do Selo OAB Recomenda, que sejam analisados todos os cursos de Direito do país a cada três anos. A última análise resultou em apenas 192 graduações recomendadas, perfazendo pouco mais de 10% do total.

"É urgente frear esse modelo que priorizou a multiplicação de instituições de ensino superior, mas pouco exigiu delas em termos de qualidade. Boa parte dos graduados nessas más instituições não passa no Exame da OAB nem chegará ao mercado de trabalho. A visão mercantilista do ensino celebra o fato de chegarmos a 1,3 milhão de advogados e advogadas no Brasil, mas não presta contas da qualidade do ensino", diz.

Pente-fino

Além da solicitação da suspensão da abertura de novos cursos, a OAB vai propor uma espécie de raio-x dos já existentes, processo que deverá durar cerca de dois anos. Essa avaliação deve ocorrer sem custos ao governo federal. Finalizado o processo, a OAB elencará as instituições que oferecem bons cursos, as que precisam melhorar, sem risco de suspensão de aulas, e, por fim, as que deverão fechar as portas.

"Nesses quase dois séculos, a atuação da advocacia foi determinante para o desenvolvimento de um Brasil independente, soberano, republicano e democrático. Tal importância, no entanto, não seria a mesma, não fosse a excelência na formação jurídica, qualidade que, hoje, como exposto, é cada vez mais rara. Repensarmos o ensino jurídico no Brasil é, acima de tudo, zelar pelo Estado Democrático de Direito", conclui Simonetti.

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