PRETOS NO TOPO

STF: Movimento Negro lança campanha pela indicação de uma jurista negra

Mais de 200 organizações do movimento negro se mobilizam para que o governo Lula indique uma jurista negra para o cargo de ministra do Supremo Tribunal Federal

EuEstudante
postado em 13/08/2023 06:00 / atualizado em 13/08/2023 06:00
Campanha oalizão Negra por Direitos por indicação de ministra negra ao STF -  (crédito: Divulgação )
Campanha oalizão Negra por Direitos por indicação de ministra negra ao STF - (crédito: Divulgação )
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Brasília será palco, nesta semana, de uma série de atividades promovidas pela campanha da Coalizão Negra por Direitos para que o presidente Lula indique uma jurista negra para o mais alto posto do Judiciário brasileiro: o de ministra do Supremo Tribunal Federal (STF). Estão previstas instalações de cartazes e projeções em prédios da capital.

A pressão é nacional — no domingo passado, por exemplo, foram feitas manifestações na Avenida Paulista (foto) — e também nas redes sociais — por meio das hashtags #SupremoTribunalDosBrancos, #BrancoSupremo e #MinistraNegraJá. "Em um momento de retomada democrática, ter uma mulher negra como ministra do STF é a prática necessária à transformação da nossa realidade", enfatiza Ágatha de Miranda, coordenadora de Incidência Política e Litígio Estratégico do Instituto Peregum. O instituto é uma das mais de 200 organizações do movimento negro integrantes da Coalizão.

 Ágatha de Miranda, coordenadora de Incidência Política e Litígio Estratégico do Instituto Peregum
Ágatha de Miranda, coordenadora de Incidência Política e Litígio Estratégico do Instituto Peregum (foto: Arquivo Pessoal)

Em 132 anos de atividade do STF, nunca houve a indicação de uma ministra negra. Ao todo, 167 pessoas ocuparam o posto de ministro — apenas três negros e somente três mulheres. Com a aposentadoria da ministra Rosa Weber, que completa 75 anos em 2 de outubro, aumenta a expectativa de que o presidente Lula faça história. "A importância de contar com uma mulher negra que compreende a dimensão das desigualdades que as relações sociais e raciais no Brasil hierarquizadas provocam na Corte Suprema do Poder Judiciário é enorme", afirma Ágatha de Miranda. Confira a entrevista concedida ao Pretos no topo.

Avalia que há, agora, uma pressão maior pela indicação de uma mulher negra?

Engajar o debate público sobre esse tema não é só uma pressão. Significa apresentar, novamente, caminhos para a promoção da igualdade e da justiça social e racial como um projeto de país. Em um momento de retomada democrática, ter uma mulher negra como ministra do STF é a prática necessária à transformação da nossa realidade. As mulheres negras historicamente vêm construindo a luta por uma sociedade mais justa e igualitária. Nos parece que é hora de a sociedade brasileira responder de volta a isso. A importância de contar com uma mulher negra que compreende a dimensão das desigualdades que as relações sociais e raciais no Brasil hierarquizadas provocam na Corte Suprema do Poder Judiciário é enorme. O STF tem sido uma instituição constitucional de grande relevância ao reconhecimento de direitos da população negra, de mulheres, populações indígenas, por exemplo.

E o que pode dificultar esse processo?

No Brasil, apesar de se reconhecer o racismo, há dificuldade de enfrentamento prático, com ações antirracistas. A disputa e a construção de espaços de representação política a partir de uma perspectiva antirracista é fundamental. O movimento negro, há décadas, apresenta uma proposta de democracia atrelada à promoção de igualdade sem quaisquer tipos de discriminação, inclusive racial e de gênero. Ainda que o texto constitucional de 1988 preveja o compromisso do Estado brasileiro quanto à intolerância ao racismo e na promoção da igualdade, porém, a realidade nos mostra as diversas dificuldades de que esse projeto seja materializado, inclusive através do direito e da atuação do Poder Judiciário. Na prática, um dos efeitos do racismo e do sexismo é a precarização do trabalho de mulheres negras. Não há um expoente adequado de mulheres negras em cargos bem remunerados, de formulações políticas, em cargos de poder, por exemplo. O que me faz pensar na necessidade de ter mulheres negras em espaços de formulações sobre os interesses coletivos e decisórios.

Dados do próprio Conselho Nacional da Justiça mostram que a composição do Judiciário brasileiro não retrata a nossa diversidade. De que forma a escolha de uma ministra negra pode contribuir para a construção de um sistema mais igualitário?

É importante a gente conhecer o perfil do Judiciário para além "das caras" de quem o compõe (homens brancos herdeiros, inclusive da Justiça). Observar o que ele produz enquanto direito e justiça no sentido da vida coletiva, sobretudo das populações que são historicamente prejudicadas pelo racismo operante no Brasil, é repensar seu atual modelo. Daí a contribuição que uma ministra negra pode trazer: reivindicar que promoção de direitos e construção de uma sociedade mais justa esteja centralizada em práticas antirracistas, em sentido à igualdade.

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