Estudo

Perda de aprendizagem na pandemia gera incertezas ao futuro de estudantes

Pesquisa realizada pelo Instituto Unibanco, revela que cada aluno do terceiro ano do ensino médio já perdeu meio por cento de seus salários futuros por causa de déficit no aprendizado

Maryanna Aguiar*
postado em 11/06/2021 16:29 / atualizado em 11/06/2021 16:45
Na ausência de um computador, Hellen acompanha as aulas pelo telefone -  (crédito: Arquivo Pessoal)
Na ausência de um computador, Hellen acompanha as aulas pelo telefone - (crédito: Arquivo Pessoal)

Os resultados do estudo feito pelo Instituto Unibanco são preocupantes, de acordo com ele o impacto da pandemia sobre os alunos que devem concluir o Ensino Médio em 2021 é grande. Segundo a pesquisa, os estudantes já perderam 10 pontos em matermática e na língua portuguesa. Nos três anos eles precisam alcançar no mínimo 20 e 15 pontos, respectivamente, de acordo com a escala Saeb – Sistema de Avaliação da Educação Básica. Cada aluno do terceiro ano já perdeu R$ 20 mil ao longo da vida em razão do aprendizado deficitário. 

Desde março de 2020, quando toda a rede de ensino do país precisou suspender as aulas presenciais, devido à pandemia do coronavírus, alunos de todos os estados foram migrados para plataformas on-line e meios digitais. Essa mudança, porém, foi estendida em razão das incertezas de um retorno às atividades presenciais.

Manter um fluxo de aprendizagem dos estudantes foi pontuado como um grande problema que desafia todos os envolvidos.


A escarces de equipamentos tecnológicos e do acesso à internet para acompanhar as atividades on-line, bem como a rotina doméstica e a ausência de condições adequadas para estudo em casa, foram grandes impeditivos para que esses jovens pudessem se dedicar totalmente. A menor socialização e os problemas emocionais e socioeconômicos de suas famílias também contribuíram para o baixo engajamento dos estudantes, como aponta o estudo realizado pelo instituto.

 

Para o doutor em psicologia educacional e pesquisador em educação Afonso Galvão os dados divulgados são alarmantes, mas esperados, uma vez que o ensino a distância não é adequado para o ensino básico. Isso explícita o prejuízo causado pela pandemia tanto no seguimento público, quanto no privado — no qual os danos foram reduzidos, segundo ele, pelo aparato técnico à disposição dos estudantes.


“Nós teremos então uma população menos qualificada ainda para a força de trabalho, para o desenvolvimento de tarefas de trabalho e quando falamos de sociedade do conhecimento, cuja a estrutura de riqueza envolve o modo como o estado organiza e distribui informação e conhecimento, nós temos uma situação onde o Brasil vai ficando para trás”, reconhece Galvão.


A aluna Hellen Cristine Ribeiro Batista, 17 anos, estudante do terceiro ano do ensino médio do Centro de Ensino Médio 03 de Taguatinga – DF, relata que as suas aulas estão sendo difíceis por conta da diferença de educação presencial para a EAD. Ela diz que não consegue, muitas vezes, entender o conteúdo por ter dificuldade de manter a concentração, e acredita que a forma que os temas são passados influencia na aprendizagem.


“Eles poderiam passar um conteúdo aos alunos de uma forma mais dinâmica para que pudéssemos aprender mais e nos concentrar melhor”, constesta a jovem.

O estudo mostra que é possível mitigar entre 35% e 40% das perdas em proficiência devido à pandemia. Para isso, no entanto, seria preciso dobrar o engajamento dos estudantes, adotar ensino híbrido ao longo de todo o 2º semestre e assegurar uma eficácia 50% maior, combinando a otimização do currículo com ações voltadas para a aceleração do aprendizado.


Em resposta ao estudo, o Ministério da Educação (MEC) diz que vem apoiando os estados e o DF nas ações que buscam reduzir os danos nos processos de ensino em decorrência da pandemia. “O MEC orienta aos Estados e ao DF na implementação de estratégias de busca ativa com objetivo de combater a evasão escolar. Já foram repassados R$ 527.406.657,57 por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) Emergencial, com destinação de recursos financeiros para adequação das estruturas físicas e aquisição de materiais necessários para seguir protocolos de biossegurança, com vistas à reorganização do calendário escolar e à retomada das atividades presenciais”.


Segundo o pesquisador educacional Afonso Galvão, para resolver a questão da defasagem na aprendizagem, seria necessário um esforço de estado que atravessasse diferentes governos. "Temos que rever a situação do professor enquanto profissional e a situação física das escolas. Temos que rever as bases curriculares e o modo como acompanhamos a escola pública. É uma tarefa multitarefa que o Brasil só dará conta se for um esforço de toda a sociedade brasileira”, diz.


Com a defasagem no ensino, o estudo pode ser um apontamento do futuro de milhares de jovens, principalmente aos alunos do ensino médio, como afirma Laura Muller Machado, 33 anos, professora no Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa.


“Quando fizemos a transição para o remoto tivemos uma perda significativa de aprendizagem, principalmente do terceiro ano. Aqueles que estão no fundamental, o sistema de ensino vai ter mais tempo para mitigar perdas, mas o ensino médio é o que tem menos tempo para reparar o dano”.


Segundo Laura, o cenário atual refletirá de forma negativa no que diz respeito à vida profissional dos alunos. “Olhando para o ensino médio, um estudante deviam alcançar 15 pontos em matemática e 20 em português nos três anos. Só no ano passado, por conta da dificuldade de acesso, a gente já perdeu dez pontos, em um ano perdeu metade do que deveria aprender, é bem grave para esses jovens, porque para cada ponto a menos eles recebem meio por cento a menos nos seus salários”.

Ela destaca que cada aluno já perdeu em torno, R$ 20 mil do que ganhariam ao longo da vida, sendo calculado isso em unidade escalar, R$ 700 bilhões. A pesquisadora ainda comenta que essa pessoa deixará de receber uma porcentagem no salário, mas também vai ter dificuldades básicas de entendimento e raciocínio analítico, além do fato de que serão trabalhadores menos qualificados.


“A gente está causando, com esse problema da pandemia, um dano em 35 milhões de pessoas que são aquelas que tem déficit escolar, se não for mitigado esse dano elas terão conhecimento muito inferior. Isso tem impacto em todas as esferas, mas nas incapacidades de produção principalmente. É preciso começar a pensar como irá reverter isso, pensar numa forma de fazer com que esses alunos não percam ainda mais pontos”, recomenda Laura.

*Sob a supervisão da subeditora Ana Luisa Araujo

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