EUROPA

Um rei emérito em fuga

Juan Carlos anuncia a partida da Espanha cercado por escândalos de corrupção e em meio a investigações por tribunais do país e da Suíça. O filho e atual monarca, Felipe VI, expressa "respeito e gratidão" pela decisão e reforça a importância histórica do pai

Correio Braziliense
postado em 03/08/2020 21:41
 (crédito: Jame Reina/AFP)
(crédito: Jame Reina/AFP)

Símbolo da democracia espanhola, com décadas de popularidade por seu papel na transição pós-ditadura de Franco, o rei emérito Juan Carlos teve sua imagem manchada por suspeitas de corrupção que o pressionaram a deixar o país. Seis anos depois de abdicar, o rei emérito, Juan Carlos I, está em uma situação complicada. Ele é investigado pelos tribunais suíço e espanhol e enfrenta um crescente clamor para deixar o Palácio da Zarzuela e salvar a monarquia, sob comando de seu filho Felipe VI. “Vossa Majestade, querido Felipe, com a mesma ânsia de servir a Espanha que inspirou meu reinado e diante da repercussão pública que certos eventos passados em minha vida privada estão gerando (...) Comunico a você minha ponderada decisão de sair nesse momento da Espanha”, escreveu o soberano emérito citado em comunicado da Casa Real.
Nos últimos meses, os espanhóis tomaram conhecimento dos detalhes sobre a gestão pouco transparente do dinheiro cedido pela Arábia Saudita ao ex-chefe de Estado. Os US$ 100 milhões teriam sido depositados secretamente em uma conta na Suíça e em paraísos fiscais, em 2008. Os problemas de Juan Carlos não são novos. Eles começaram com a investigação de corrupção contra seu genro Iñaki Urdangarin e sua filha caçula, a infanta Cristina, acusada em 7 de janeiro de 2014 por suposta fraude fiscal e lavagem de dinheiro no caso contra o marido.
A notícia chegou no pior momento. No dia anterior, o monarca se apresentou de uma forma muito diferente da habitual. Convalescente de sua nona cirurgia em menos de quatro anos, um rei fisicamente fraco e, gaguejante, leu um breve discurso em um ato militar. Juan Carlos parecia ainda mais cansado do que em 18 de abril de 2012, quando surpreendeu o país ao pronunciar um pedido de desculpas histórico na televisão: “Sinto muito. Eu errei e isso não acontecerá novamente”.
Alguns dias antes, surgiram controvérsias sobre uma caçada a elefantes em Botsuana, de onde foi repatriado com uma fratura no quadril, acompanhado por sua então amante, a alemã Corinna Larsen, a quem teria presenteado com 65 milhões de euros, segundo a imprensa. Outra aparição na televisão, 31 anos antes, marcou o auge de seu reinado: em 23 de fevereiro de 1981, o monarca em uniforme militar ordenou que os oficiais que ocupavam o Congresso retornassem ao quartel, tornando-se o salvador da jovem democracia espanhola.


Importância

No comunicado enviado ontem, a Casa Real assegura que Felipe VI “deseja enfatizar a importância histórica do reinado de seu pai, como um legado e trabalho político e institucional de serviço à Espanha e à democracia; e ao mesmo tempo ele deseja reafirmar os princípios e valores nos quais se baseia, dentro da estrutura de nossa Constituição e do resto do sistema jurídico”. O rei Felipe transmitiu a seu pai “seu sincero respeito e gratidão por sua decisão”, segundo o texto.
A imprensa ecoou as investigações da procuradoria de Genebra e as declarações de um advogado suíço, Dante Canonica, que diz ter sido encarregado de “criar uma estrutura” para ocultar os fundos enviados por Juan Carlos. Até o próprio governo de Pedro Sánchez mudou de tom no começoa de julho, após andar na ponta dos pés por meses. “Estamos testemunhando, toda a população espanhola, informações perturbadoras que também nos perturbam a todos”, disse Sánchez na época. Corinna Larsen teria dito ao Ministério Público de Genebra que Juan Carlos transferiu cerca de 65 milhões de euros para ela “por gratidão e por amor” e não para esconder a quantia.

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Morre John Hume, Nobel da Paz

 (crédito: Cesar Rangel/AFP)
crédito: Cesar Rangel/AFP

O político John Hume, um católico moderado, vencedor do Prêmio Nobel da Paz em 1998 por seu papel na reconciliação da Irlanda do Norte, morreu, ontem, aos 83 anos. “John faleceu durante a madrugada após uma curta doença”, afirma um comunicado divulgado pela família, que agradeceu aos funcionários da casa de repouso de Londonderry onde o ex-líder católico nacionalista passou os últimos meses de vida.
Hume foi o idealizador do acordo da Sexta-Feira Santa assinado em 1998 com o líder protestante do Partido Unionista do Ulster (UUP) David Trimble. Os dois receberam no mesmo ano o Nobel da Paz em reconhecimento a “seus esforços para encontrar uma solução pacífica a 30 anos de conflitos” que deixaram mais de 3.500 mortos.
As homenagens a este partidário da reunificação da Irlanda vieram do lado britânico e do irlandês. “John Hume foi um titã político, um visionário que se recusava a acreditar que o futuro deveria parecer com o passado”, afirmou Tony Blair, que era o primeiro-ministro britânico no momento da assinatura do acordo da Sexta-Feira Santa entre Londres, Dublin e as partes protestantes e católicas. O premiê irlandês, Micheal Martin, o chamou de “grande herói e um verdadeiro artífice da paz”.

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