Trump elogia polícia e nega o racismo

EUA / Em visita a Kenosha (Wisconsin), onde homem negro foi baleado sete vezes nas costas por policial, presidente exalta o trabalho das forças de segurança, diz que a cidade foi devastada por "antiamericanos" e classifica as manifestações como "terrorismo doméstico"

Rodrigo Craveiro
postado em 01/09/2020 21:56
 (crédito: Mandel Ngan/AFP)
(crédito: Mandel Ngan/AFP)

Depois de fazer o que classificou de um “incrível” tour pelas áreas mais afetadas pelos distúrbios raciais, em Kenosha (Wisconsin), o presidente Donald Trump elogiou as forças de segurança e provocou polêmica. Ao comentar os incidentes deflagrados depois que Jacob Blake, um homem negro de 29 anos, foi baleado sete vezes pela polícia, em 23 de agosto, o republicano declarou “esses não são atos de protestos pacíficos, mas, realmente, de terrorismo doméstico”.
“Kenosha foi devastada por distúrbios antipoliciais e antiamericanos”, disse o magnata, que ignorou um pedido do governador de Wisconsin, Tony Evers, para que desistisse da viagem. Trump exaltou o “ótimo trabalho das forças de segurança e da Guarda Nacional”. “Estamos aqui para mostrar nosso apoio por Kenosha e por Wisconsin. Eu amo o povo”, acrescentou.
Em uma mesa redonda formada por policiais, pastores, congressistas, políticos locais e comerciantes, Trump foi questionado por jornalistas se acreditava que o racismo sistêmico é um problema nos Estados Unidos. Respondeu de forma evasiva. “Vocês continuam retornando ao assunto oposto. Devíamos falar sobre o tipo de violência que vimos em Portland, aqui em Kenosha e em outros lugares. É uma violência tremenda”, afirmou, acompanhado pelo secretário de Justiça, William Barr, e pelo secretário interino de Segurança Interna, Chad Wolf.
Os repórteres também interpelaram o titular da Casa Branca, aspirante a um segundo mandato nas eleições de 3 de novembro, sobre Jacob Blake. “Sinto imensamente por qualquer pessoa que passe por isso, por isso estamos honrados em encontrar os pastores. (…) Como vocês sabem, (o incidente) está sob investigação”, disse Trump, em alusão a James Ward e Sharon Ward. A presença dos dois religiosos da igreja Insight causou um cisma na família de Blake (leia nesta página).
A comitiva presidencial entrou em Kenosha às 12h50 (14h50 em Brasília). Simpatizantes de Trump gritavam “Liberte Kyle Rittenhouse”, um jovem de 17 anos que matou duas pessoas e feriu uma terceira ao disparar um fuzil AR-15 durante uma noite de distúrbios, dois dias depois da tentativa de assassinato contra Jacob Blake. Ao longo do trajeto, bandeiras do movimento Black Lives Matter (“Vidas negras importam”) misturavam-se com as da campanha republicana.
David Canon, diretor do Departamento de Ciência Política da Universidade de Wisconsin, admitiu ao Correio a gravidade das declarações de Trump em Kenosha, especialmente a referência ao terrorismo doméstico. “É um passo pior do que sua resposta ao assassinato de um manifestante em Charlottesville (Virgínia), quando o presidente disse que havia ‘gente muito boa’ em ambos os lados (incluindo os neonazistas). Agora, aparentemente, as únicas pessoas boas são aquelas que matam os manifestantes, e os próprios manifestantes são os terroristas”, ironizou. Em 12 de agosto de 2017, um homem lançou um carro contra ativistas contrários à extrema-direita, em Charlottesville, matando Heather Heyer.
De acordo com Canon, o tour de Trump pelas áreas atingidos pelos distúrbios e o distanciamento do caso Jacob Blake fazem parte de uma tática consistente com a abordagem da lei e da ordem que o presidente tem adotado. “Ele tenta chamar a atenção sobre a destruição de propriedades, sem discutir o tema subjacente aos protestos. Tal estratégia deve afastar ainda mais os eleitores negros do presidente Trump”, comentou o especialista. “Por outro lado, acho que a maioria dos eleitores de Wisconsin sabem em quem votarão, e isso não afetará em sua decisão nas urnas. Os simpatizantes de Trump aplaudirão a visita, enquanto os adversários a criticarão.”
Na segunda-feira, Joe Biden — candidato democrata à Casa Branca — acusou o republicano de fomentar a violência e qualificou-o de “presença tóxica”. Trump, por sua vez, insinuou que “pessoas que estão nas sombras escuras” comandam a campanha do opositor. O mandatário, no entanto, não apresentou provas da suposta teoria da conspiração.

Los Angeles

A execução de um homem negro por policiais de Los Angeles elevou a tensão na Califórnia. Segundo a agência France-Presse, a vítima, identificada como Dijon Kizzee, 29, andava de bicicleta na tarde de segunda-feira, quando agentes tentaram detê-lo por suposta violação de trânsito. As autoridades relataram que Dijon “fugiu correndo” e deixou a bicicleta para trás. Na tentativa de prisão, acertou um soco no rosto de um dos policiais. Foi quando os agentes dispararam várias vezes. O homem morreu na hora.

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