Justiça britânica anula decisão prévia sobre ouro da Venezuela

Determinou-se, ainda, a continuidade da investigação sobre esse caso, que mantém Guaidó e o presidente Nicolás Maduro sem acesso ao ouro

Agência France-Presse
postado em 05/10/2020 18:21
 (crédito: VENEZUELAN PRESIDENCY/AFP e FEDERICO PARRA/AFP)
(crédito: VENEZUELAN PRESIDENCY/AFP e FEDERICO PARRA/AFP)

A Justiça britânica anulou nesta segunda-feira (5) uma decisão judicial anterior que reconheceu, em julho, o líder da oposição venezuelana Juan Guaidó como o único qualificado para determinar o destino de 30 toneladas de ouro depositadas no Banco da Inglaterra.

Determinou-se, ainda, a continuidade da investigação sobre esse caso, que mantém Guaidó e o presidente Nicolás Maduro sem acesso ao ouro.

A complexidade da sentença levou ambos os lados a reivindicá-la como uma vitória. "A decisão da justiça britânica constitui mais uma derrota" para "o bando ilegal chefiado por" Guaidó e "suas ambições de se apoderar das riquezas da Venezuela", escreveu no Twitter o ministro da Comunicação e Informação, Freddy Ñañez.

"É claro que Maduro tem medo de voltar ao mesmo tribunal em que perdeu", disse, por sua vez, a representante de Guaidó em Londres, Vanessa Neumann, apontando que "outra declaração de apoio da diplomacia (britânica para Guaidó) não seria conveniente para eles".

A porta-voz da oposição também reafirmou seu compromisso com a "defesa dos interesses dos venezuelanos" e seu apreço pela "independência da corte britânica".

Um ou dois presidentes? 

Um tribunal comercial de Londres considerou em julho que Guaidó foi "reconhecido inequivocamente" como chefe de Estado com todos os poderes pelo Reino Unido, quando Londres o considerou "presidente constitucional interino da Venezuela até que eleições presidenciais confiáveis" possam ser realizadas.

Isso lhe concedia, segundo a decisão, o controle do ouro da reserva nacional guardado nos cofres do Banco da Inglaterra e impediu o governo de Maduro de recuperar uma parte dos fundos, avaliada em US$ 1 bilhão. Maduro alega que esses recursos são necessários para combater a pandemia da covid-19.

Denunciando um "roubo de pirataria descarado", o Executivo venezuelano recorreu da decisão ao Tribunal de Apelações de Londres, que determinou nesta segunda-feira que o caso não é tão simples. Na opinião dos juízes Lewison, Males e Phillips, a declaração do então ministro britânico das Relações Exteriores Jeremy Hunt, reconhecendo Guaidó, foi ambígua.

E, antes de seguir adiante com este assunto de fortes implicações políticas e financeiras, é preciso esclarecer se algum poder foi realmente concedido a ele e qual seria este poder.

"Antes de poder dar uma resposta definitiva às questões de reconhecimento (...) será necessário determinar se o governo de Sua Majestade reconhece o senhor Guaidó como presidente da Venezuela para todos os efeitos e, portanto, não reconhece o senhor Maduro como presidente a nenhum efeito", escreveram os juízes na decisão, que devolve o caso à Corte Comercial que emitiu a sentença de julho.

Durante três dias de julgamento centrados em questões extremamente técnicas no final de setembro, os advogados de Caracas se esforçaram para demonstrar que, ao não romper relações diplomáticas com Maduro e continuar mantendo seus respectivos embaixadores, Londres "reconhece seu governo, mesmo que não aprove".

Sendo assim, os magistrados devolveram o caso à Corte Comercial, ordenando que realize uma investigação aprofundada.

Uma duplicidade problemática 

Por meio do Banco Central da Venezuela, presidido por Calixto Ortega, o governo Maduro tenta há dois anos, sem sucesso, recuperar as 30 toneladas de ouro da reserva nacional. Elas permanecem guardadas nos cofres do Banco da Inglaterra.

A Assembleia Nacional da Venezuela, dominada pela oposição e presidida por Guaidó, nomeou em julho de 2019 sua própria direção "ad hoc" do Banco Central venezuelano. Pediu a Londres que não entregasse os lingotes, com a alegação de que poderiam servir para reprimir o povo venezuelano, ou seguir para um regime que qualifica como "cleptocrata".

A instituição afirma que está no meio de dois grupos rivais que apresentam instruções contraditórias e pediu à Justiça que, antes de decidir o destino final do ouro, resolva, como uma questão preliminar, quem tem seu controle.

A existência de dois "presidentes" rivais dificulta o acesso do governo venezuelano aos fundos de que dispõe no sistema financeiro internacional.

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