» RODRIGO CRAVEIRO
No segundo dos quatro dias de sabatina pelo Comitê Judiciário do Senado, a juíza Amy Coney Barrett, 48 anos, avisou que não será usada como uma espécie de peão nas eleições, disse que sua fé católica não determinará suas decisões na Suprema Corte dos EUA e se negou a opinar sobre a legalização do aborto e do casamento homossexual. “Os juízes não podem levantar uma manhã, dizer: ‘Tenho uma agenda, amo ou odeio armas de fogo, amo ou odeio o aborto’ e agir como uma rainha, impondo sua vontade”, desconversou.
Barrett — candidata do presidente Donald Trump a substituir a falecida magistrada Ruth Bader Ginsburg — cometeu uma gafe ao usar o termo “preferência sexual” e recusou-se a revelar se concordava que a união entre casais do mesmo sexo é um direito constitucionalmente protegido. “Eu não tenho agenda. Quero deixar claro que nunca discriminei com base na preferência sexual, e jamais discriminaria com base na preferência sexual. Assim como o racismo, acho a discriminação algo horrível”, destacou. Segundo o jornal The New York Times, a juíza denominou-se “textualista estrita e originalista”. “Isso significa que interpreto a Constituição como uma lei”, explicou.
Em entrevista ao Correio, Mary Ziegler — professora de direito da Universidade Estadual da Flórida e autora de Abortion and the law in America: Roe v. Wade to the present (“Aborto e a lei na América: De Roe versus Wade ao presente”) — afirmou que as respostas de Barrett foram “absolutamente padronizadas para um candidato à Suprema Corte. “Sua meta foi evitar pré-compromisso com qualquer posição e evitar qualquer dano às suas chances de confirmação. Suas declarações sobre o Obamacare e sobre sua fé podem muito bem ser precisas, mas não refletem necessariamente o que ela fará no tribunal”, avaliou. “Barrett foi escolhida por Trump, em parte para reverter os direitos ao aborto e o Obamacare. É provável que adote posições conservadoras sobre tais temas.”
Supermaioria
Para Ziegler, com a confirmação de Barrett, a Suprema Corte terá uma supermaioria conservadora. “Isso significa que a Corte provavelmente tomaria decisões conservadoras, mesmo se um dos juízes conservadores rompesse com os colegas. Barrett cria uma espécie de apólice de seguro para os conservadores. Ela poderia unir-se à ala mais à direita, a qual pressionaria por mudanças mais rápidas e abrangentes”, explicou. A especialista entende que a confirmação da magistrada é desenhada para reunir sua base, especialmente os cristãos conservadores que ficaram desiludidos depois que a Suprema Corte lhes entregou uma série de derrotas surpreendentes neste verão.
Por sua vez, Mark Tushnet, professor de direito da Universidade de Harvard, disse acreditar que Barrett seja mais conservadora do que vários outros candidatos apontados pelo Partido Republicano. “Se ela exibisse seu conservadorismo plena e rapidamente, a Corte tornar-se-ia mais conservadora no curto prazo. A experiência mostra que, nos dois ou três primeiros anos, os juízes exibem seus compromissos ideológicos com menos vigor; parecem ‘moderados’ em relação ao que realmente acreditam”, afirmou ao Correio.
Tushnet admite que a confirmação de Barrett, antes das eleições de 3 de novembro, representaria uma vitória para Trump, independentemente do resultado das urnas. “Seus partidários ficariam mais entusiasmados com a reeleição e, assim, poderiam aumentar o comparecimento nas urnas. Se Trump perder, o argumento de permitir que a voz do povo fosse ouvida tornar-se-ia substancialmente mais poderoso”, disse.
» Tabus e polêmicas sobre a mesa
Como a magistrada abordou temas espinhosos durante a sabatina
Aborto
Ante os senadores, a juíza Amy Coney Barrett negou-se a opinar sobre a sentença da Suprema Corte dos Estados Unidos que legalizou a interrupção da gravidez. “Os juízes não podem levantar uma manhã e dizer: ‘Tenho um objetivo na minha vida, amo ou odeio armas de fogo, amo ou odeio o aborto’ e impor sua vontade como figuras da realeza”, afirmou.
Casamento gay
Ao ser interrogada sobre a legalização do casamento gay em todo o país, ela se recusou a afirmar se a decisão foi errada. “Não tenho agenda e quero deixar claro que nunca discriminei com base em preferência sexual e não discriminaria com base em preferência sexual”, respondeu.
Eleições
A juíza afirmou esperar que os membros do Comitê Judiciário do Senado “tenham mais confiança” na integridade dela do que pensem que Barret permitir-se-ia ser “usada como um peão para decidir a eleição para o povo americano”.
Fé católica
Barrett foi questionada pelo senador Lindsey Graham se ela deixaria de lado as crenças católicas para julgar um assunto. “Sim, estou fazendo isso como juíza (do tribunal federal de apelações de Chicago), e, se me confirmarem, continuarei a fazê-lo” na Suprema Corte, prometeu. No entanto, ela comentou que a fé é importante para a sua família.
Obamacare
Amy Coney Barrett disse que “não é hostil” à Lei de Cuidados Acessíveis (ACA, pela sigla em inglês), como é chamado o Obamacare — programa de subsídio de atenção à saúde lançado pelo governo de Barack Obama. O presidente Donald Trump é opositor ferrenho do Obamacare. “Eu não estou aqui em uma missão para destruir o ACA. Estou aqui apenas para aplicar a lei e para aderir ao Estado de direito”, disse a magistrada.
Posse de armas
A juíza revelou aos senadores que possui uma arma e disse que os senadores podem julgar um caso envolvendo a posse de armamentos com isenção.
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