A Justiça britânica iniciou nesta segunda-feira (30) uma nova análise do papel que a poluição atmosférica pode ter desempenhado na morte, há oito anos, de uma menina que morava perto de uma estrada muito movimentada da capital da Inglaterra, um caso que pode estabelecer um precedente.
Ella Adoo-Kissi-Debrah, de nove anos, faleceu em 15 de fevereiro de 2013 vítima de uma grave crise de asma, depois de quase três anos de ataques repetidos e de mais de 30 hospitalizações relacionadas com a doença.
Uma investigação inicial de 2014 determinou que ela foi vítima de insuficiência respiratória aguda causada por asma severa. Mas os resultados foram revertidos em 2019 e uma nova investigação foi determinada após o surgimento, um ano antes, de mais evidências sobre os riscos provocados pela poluição do ar.
A segunda investigação judicial começou nesta segunda-feira e deve ter duração de duas semanas. Nela, serão examinados os níveis de contaminação, aos quais Ella foi exposta, para determinar se provocaram sua morte.
Se o legista, responsável por identificar a razão do falecimento, concluir que a poluição atmosférica provocou diretamente a morte da menina, a decisão estabelecerá um precedente. Ella seria a primeira pessoa no Reino Unido a ter a contaminação do ar como causa de morte conhecida.
- "Vínculo evidente" -
A mãe de Ella, Rosamund Adoo-Kissi-Debrah, espera "conseguir finalmente (registrar) a razão de sua morte na certidão de óbito" e pressionar as autoridades a adotarem medidas contra a poluição do ar.
"Espero que isto facilite a vida das crianças de todo mundo que respiram ar poluído", disse à AFP, antes da primeira audiência. "As crianças não deveriam morrer de asma", completou.
A menina morava a menos de 30 metros da South Circular, uma rodovia de muito tráfego e frequentemente congestionada do sul de Londres.
Em 2018, o professor Stephen Holgate, um especialista britânico em poluição atmosférica, apontou um "vínculo evidente" entre as internações de Ella nas emergências de hospitais e os picos registrados de dióxido de nitrogênio (NO2) e de partículas em suspensão (PM), os poluentes mais prejudiciais.
"Fiquei surpresa, irritada, mas também muito triste que não conseguisse fazer nada para ajudá-la", recordou a mãe de Ella.
A investigação examinará as possíveis falhas das autoridades na adoção de medidas para reduzir a poluição e informar a população sobre os riscos para a saúde.
Funcionários dos ministérios dos Transportes, Meio Ambiente e Saúde serão interrogados, assim como o professor Holgate.
- Ella "parava de respirar" -
A advogada da família Adoo-Kissi-Debrah, Jocelyn Cockburn, considerou a nova investigação uma "vitória importante".
De acordo com dados da prefeitura de Londres, 99% da cidade supera os limites recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a poluição do ar.
No mês passado, a diretora-executiva do Fundo para o Ar Limpo, Jane Burston, afirmou que "as crianças de Londres têm 4,2% mais probabilidades de internação por asma nos dias em que a contaminação por dióxido de nitrogênio é alta".
Alguns dias, Ella tinha "ataques extremamente fortes, parava de respirar", lembra sua mãe. No restante do tempo, "levava uma vida normal", tocava piano, ou violão, cuidava do irmão e da irmã mais novos e sonhava em se tornar piloto de avião.
"Ella era muito boa. Era brilhante, e vou sentir falta por toda minha vida", disse Rosamund à AFP.
O prefeito de Londres, o trabalhista Sadiq Khan, afirmou no mês passado que a qualidade do ar melhorou desde 2016, de acordo com dados oficiais.
E destacou as medidas adotadas desde sua eleição, incluindo a introdução no ano passado de uma "zona de emissões ultra baixas" (ULEZ), que exige que os motoristas dos veículos mais poluentes paguem um imposto diário para circular pelo centro da cidade.
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