Rússia

Navalny é preso ao desembarcar em Moscou

Principal opositor de Vladimir Putin volta da Alemanha, onde se tratou de um envenenamento que atribui ao presidente russo, e é detido por violar as regras de uma sentença de 2014. Líderes internacionais pedem a soltura imediata do ativista

Correio Braziliense
postado em 17/01/2021 22:14
 (crédito: Kirill Kudryavtsev/AFP)
(crédito: Kirill Kudryavtsev/AFP)

Uma das principais vozes de oposição a Vladimir Putin, Alexei Navalny, 44 anos, foi preso ontem, assim que chegou ao Aeroporto de Sheremetievo, em Moscou. O também ativista anticorrupção vinha da Alemanha, onde se tratou de um envenenamento que, segundo ele, foi operado pelos serviços especiais russos (FSB) a pedido do presidente. De acordo com autoridades locais, Navalny violou as condições de uma pena de prisão suspensa recebida em 2014 e, por isso, foi detido. Pelas regras, ele teria que se apresentar pelo menos duas vezes por semana à administração penitenciária. O líder opositor, porém, deu entrada em hospital de Berlim, em 22 de agosto, para se recuperar da suposta tentativa de assassinato ocorrida dois dias antes.

A bordo da aeronave que o deixou em Moscou, Navalny disse a jornalistas que não tinha medo de ser preso. “Serei preso? É impossível, sou inocente”, afirmou. A detenção ocorreu quando o ativista estava ao lado de sua esposa, Yulia, prestes a entregar seu passaporte no controle de fronteira. Segundo os serviços penitenciários russos (FSIN), ele ficará preso “até a decisão do tribunal”. “Alexei foi detido sem explicações (...) Eles não deixaram eu me aproximar dele depois de cruzar a fronteira”, denunciou sua advogada, Olga Mijailov.

O plano inicial era de que o avião em que estava o líder opositor desembarcasse no Aeroporto Internacional de Vnukovo, também em Moscou. Segundo jornalistas da agência France-Presse (AFP) que estavam na aeronave, o piloto do avião anunciou, em um primeiro momento, um atraso de 30 minutos no voo devido a um “problema técnico”. Depois, informou que o destino seria alterado para Sheremetievo.

Dezenas de aliados aguardavam Navalny em Vnukovo, acompanhados de perto pela polícia de choque. Alguns foram presos. Entre eles, Liubov Sobol, uma figura em ascensão na oposição russa, que foi solto horas depois. A Justiça havia alertado sobre os riscos de participação de um “evento público” não autorizado no aeroporto. Segundo a imprensa local, ativistas que sairiam de São Petersburgo para Moscou com o objetivo de se reunir com o opositor foram detidos antes de iniciar a viagem. A organização não governamental (ONG) OVD-Info calcula que 65 pessoas foram presas nas duas cidades.

O principal inimigo de Vladimir Putin anunciou sua intenção de retorno à Rússia na quarta-feira e conclamou seus apoiadores a recebê-lo. Segundo ele, a possibilidade de detenção era uma tentativa de amedrontá-lo. “Aqui estou em casa. Não tenho medo (...) porque sei que tenho razão e que os processos contra mim são completamente montados. Não tenho medo de nada e vocês não devem temer nada”, disse Navalny ao chegar a Moscou, pouco antes de sua prisão.

Silenciamento
A reação internacional à detenção do ativista foi imediata. Para a ONG Anistia Internacional, a prisão fez dele um “prisioneiro de consciência”, vítima de uma “campanha implacável” das autoridades russas para “silenciá-lo”. Pelo Twitter, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, pediu a Moscou a libertação “imediata” de Navalny e classificou sua prisão como “inaceitável”.

O chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell, por sua vez, pediu às autoridades russas que “respeitem os direitos” de Navalny e exigiu sua “libertação imediata”. “A politização do sistema judicial é inaceitável”, acrescentou o ex-chanceler espanhol. A Lituânia solicitou a “discussão de novas sanções” contra a Rússia e a Polônia instou uma “resposta rápida”.

Futuro assessor de segurança nacional do presidente eleito dos Estados Unidos Joe Biden, Jake Sullivan escreveu, na mesma rede social, que “os ataques do Kremlin contra o senhor Navalny não são só uma violação dos direitos humanos, mas uma afronta ao povo russo que quer que sua voz seja ouvida”. Sullivan também pediu a soltura imediata do líder opositor. Segundo ele, “os autores do escandaloso ataque à vida de Navalny têm que prestar contas.

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Veneno soviético

Moscou segue recusando a abertura de uma investigação para descobrir o que aconteceu com Alexei Navalny em 20 de agosto. No sábado, Berlim anunciou que transmitiu ao governo russo todos os elementos de sua investigação judicial sobre o caso, especialmente as atas dos interrogatórios feitos com o líder opositor e “amostras de sangue e tecido, assim como pedaços de roupa”, na expectativa de que as autoridades “resolvam o crime”. Ontem, a porta-voz da diplomacia russa, Maria Zajarova, confirmou que recebeu os documentos enviados pela Alemanha, mas disse que eles “não têm nada realmente” do que a Rússia queria.

A principal figura da oposição russa entrou subitamente em coma quando retornava de uma viagem à Sibéria. Inicialmente, foi hospitalizado em Omsk, uma grande cidade da região, e, após pressão de familiares e apoiadores, foi transferido para um hospital de Berlim. Três laboratórios europeus concluíram que ele foi envenenado com um agente nervoso do tipo Novichok, desenvolvido na época soviética. A conclusão foi confirmada pela Organização para a Proibição de Armas Químicas (OIAC). Moscou, por sua vez, nega as afirmações e atribui o envenenamento a serviços secretos ocidentais e até aos hábitos de higiene de Navalny.

Apesar de praticamente ignorado pela imprensa nacional e sem representação no Parlamento, Navalny continua a ser a voz principal da oposição, em parte graças ao seu canal no YouTube, que tem 4,8 milhões de assinantes, e à sua organização, o Fundo de Combate à Corrupção (FBK), que denuncia a corrupção das elites. Apesar das buscas, da pressão e das penas de prisão de Navalny e seus aliados, ele conseguiu organizar várias manifestações seguidas nos últimos anos e causou vários revezes ao poder nas eleições locais. Desde o fim de dezembro, o opositor também é alvo de uma investigação de fraude, sob suspeita de ter gasto 356 milhões de rublos (cerca de US$ 4,8 milhões) em doações para seu uso pessoal.

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