CIÊNCIA

Risco de internação por covid cai com apenas uma dose de vacina

Estudos na Inglaterra e na Escócia, com dados da campanha de vacinação em massa, mostram que, mesmo com uma aplicação, imunizantes reduziram em até 95% a hospitalização por covid-19. Também há evidências de queda nas transmissões

Paloma Oliveto
postado em 23/02/2021 06:00
 (crédito: AFP / POOL / Andrew Milligan)
(crédito: AFP / POOL / Andrew Milligan)

Pela primeira vez desde o início da aplicação das vacinas anticovid na população em geral, três estudos confirmam a eficácia dos imunizantes, além de indicarem a alta proteção contra a forma grave da doença — o que se mediu pela queda nas hospitalizações pelo novo coronavírus. Os estudos, ainda não publicados em revistas científicas, foram divulgados, ontem, na Escócia e na Inglaterra, que começaram a vacinação em massa no início de dezembro, e relatam resultados após a aplicação de uma dose das substâncias. Com a queda nos casos da doença e o progresso nas imunizações, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, anunciou o plano gradual de suspensão das restrições, a partir de 8 de março, dois meses depois de um severo lockdown.

Embora se trate de estudos observacionais — em que não é possível apontar diretamente uma relação de causa e efeito — e ainda precisem passar pela revisão por pares, os resultados foram bem recebidos pela comunidade científica. Na prática, eles mostram que, no cenário do mundo real, os benefícios verificados nos ensaios clínicos controlados se mantiveram.

Os resultados não incluem evidências de que as vacinas evitam completamente a transmissão, mas parte dos dados sugere que os imunizantes impedem que algumas pessoas se infectem, retardando a disseminação do vírus.

Na Escócia, pesquisadores das universidades de Edimburgo, Strathclyde, Glasgow e Aberdeen, além do Serviço de Saúde Pública do país, analisaram os dados das vacinas da Pfizer e do consórcio Oxford/AstraZeneca. Na quarta semana após a primeira dose, os imunizantes reduziram o risco de internações hospitalares por covid-19 em até 85% e 94%, respectivamente. Entre pessoas acima de 80 anos, a vacinação foi associada a uma redução de 81% na probabilidade de hospitalização no mesmo período. Os dados foram coletados entre 8 de dezembro e 15 de fevereiro, período em que 1,14 milhão de vacinas foram aplicadas e 21% da população escocesa havia recebido a primeira dose.

“Esses resultados são importantes à medida que passamos da expectativa para a evidência bem consolidada do benefício das vacinas. Em toda a população escocesa, os resultados mostraram um efeito substancial na redução do risco de internação hospitalar com uma única dose da vacina. Estamos continuando nossa avaliação e esperamos descrever os benefícios que, esperamos, virão após as segundas doses”, disse, em nota, Jim McMenamin, um dos diretores do Serviço de Saúde Pública da Escócia.

Comparações

No país, a vacina da Pfizer foi recebida por cerca de 650 mil pessoas. Quatrocentos e noventa mil foram protegidas com o imunizante Oxford-AstraZeneca. Para avaliar o desempenho da vacinação, os pesquisadores observaram os dados de saúde pública de todas as semanas do estudo — incluindo registros sobre vacinação, internações hospitalares e óbitos, além de análises de exames laboratoriais. Eles, então, compararam as análises daqueles que tomaram a primeira dose com aqueles que não receberam.

Os resultados preliminares foram postados no servidor de pré-impressão SSRN e enviados a uma revista científica para revisão por pares. Segundo os autores, embora tenha sido realizada entre a população escocesa, os resultados podem ser aplicáveis a outros países que estão usando as vacinas Pfizer e Oxford-AstraZeneca em suas campanhas. Os dados não permitem comparação entre as duas substâncias, alertaram.

“São resultados encorajadores de um estudo bem conduzido. No entanto, estudos não randomizados (observacionais) sobre os efeitos das vacinas estão sujeitos, mesmo nos mais bem-elaborados e analisados, a vieses potenciais que tornam os resultados menos certos do que a análise estatística sugere. Esses vieses podem ocorrer no início do tratamento, durante o acompanhamento e na averiguação do resultado, resultando no efeito observado parecendo maior ou menor do que o verdadeiro”, pondera o professor de farmacologia da Faculdade de Higiene e Medicina Tropical de Londres Stephen Evans.

“Apesar disso, é claro que esses resultados são definitivamente encorajadores ao demonstrar uma grande redução no número de hospitalizações, algo sobre o que se tinha poucos dados até agora. Porém, será importante que a euforia — principalmente de fontes políticas que não entendem a incerteza dos valores numéricos — não faça com que decisões prematuras sejam tomadas. O otimismo cauteloso é justificado.”

Idosos

Na Inglaterra, duas pesquisas apresentadas, ontem, pelo Serviço de Saúde Pública chegaram a conclusões semelhantes à análise escocesa. O estudo Siren, realizado com profissionais de saúde com menos de 65 anos, constatou que uma dose da vacina Pfizer/BioNTech reduziu o risco de contrair o vírus em 70% — e 85% após a segunda dose. Todos os participantes foram testados para o Sars-CoV-2 a cada duas semanas, o que permitiu detectar tanto as infecções assintomáticas quanto as que apresentavam sintomas.

O governo também divulgou os resultados de testes de rotina em pessoas com mais de 80 anos, que correm maior risco de adoecer gravemente e morrer de covid. Constatou-se que, três semanas após a primeira dose, a vacina Pfizer/BioNTech foi 57% eficaz contra doenças sintomáticas, sejam leves ou mais graves. Embora muitos participantes não tenham recebido uma segunda dose, as evidências sugerem que a eficácia aumentou para 85% naquelas vacinadas com as duas doses.

Ainda nessa faixa etária, o estudo, que ainda será publicado, evidencia que o risco de morrer é menos da metade (56%) nos casos vacinados em comparação aos não imunizados, pelo menos 14 dias após receber a primeira dose. Aqueles com mais de 80 anos, que desenvolvem infecção por Sars-CoV-2 após a vacinação, têm cerca de 40% menos probabilidade de serem hospitalizados do que alguém com infecção que não foi imunizado.

“A vacina também foi igualmente eficaz contra a variante B.1.1.7, mais infecciosa (às vezes referida como a ‘variante de Kent’)”, destaca Peter English, ex-editor da revista médica Vaccines in Practice. “Essas descobertas são, obviamente, baseadas em dados preliminares. A vigilância pós-implementação contínua seguirá indefinidamente e, ao longo do tempo, a precisão das estimativas de eficácia irá melhorar”, acrescentou.

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Estados Unidos superam 500 mil mortes

 (crédito: Saul Loeb/AFP)
crédito: Saul Loeb/AFP

Enquanto, no Reino Unido, o clima é de otimismo, os Estados Unidos superaram, ontem, meio milhão de mortes pelo coronavírus. Diante desse marco sombrio, o presidente Joe Biden determinou que as bandeiras dos prédios do governo federal sejam hasteadas a meio mastro por cinco dias, anunciou sua porta-voz, Jen Psaki. “É de partir o coração”, lamentou o líder democrata.

Ao contrário de seu antecessor, o republicano Donald Trump que, muitas vezes, procurou minimizar a doença, Joe Biden fez do combate à pandemia sua prioridade. O presidente norte-americano alertou que o número de vítimas no país pode ultrapassar 600 mil. O principal conselheiro de saúde de Biden, Anthony Fauci, lembrou que os americanos podem ter de usar máscaras até 2022.

Em todo o mundo, o número de óbitos é próximo a 2,5 milhões. Os países com mais mortes depois dos Estados Unidos são o Brasil (mais de 246 mil), México (mais de 180 mil), Índia (cerca de 156 mil) e Reino Unido (mais de 120 mil).

Mas, mesmo com essa marca trágica, nos Estados Unidos como no resto do mundo, há sinais de progresso para superar a pandemia, com queda acentuada nas infecções e aumento gradual nas entregas de vacinas.

A desigualdade no acesso às imunizações, porém, levou o diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS) a acusar “certos países ricos de minar” o sistema de distribuição equitativa dos imunizantes. “Alguns países ricos estão, atualmente, abordando fabricantes para garantir o acesso a doses adicionais de vacinas, o que tem efeito nos contratos com o Covax, e o número de doses alocadas ao Covax foi reduzido por causa disso”, criticou Tedros Adhanom Ghebreyesus, durante uma coletiva de imprensa, por videoconferência, com o presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier.

O sistema Covax foi criado para tentar evitar que os países ricos obtenham todas as doses da vacina que são fabricadas ainda em quantidade muito pequena para atender a demanda global e inclui um mecanismo de financiamento que deve permitir que 92 economias de baixa e média renda tenham acesso às vacinas. Mas a escassez de doses significa que as primeiras distribuições aos países pobres só acontecerão no fim do mês. Em contrapartida, em muitas nações ricas, as campanhas de vacinação começaram em dezembro de 2020.

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