Ao discursar ontem na abertura da reunião virtual do Fórum para o Progresso da América do Sul (Prosul), o presidente Jair Bolsonaro criticou a prisão de Jeanine Áñez, ex-presidente interina da Bolívia, e de autoridades de seu governo. Logo no início de sua fala, Bolsonaro classificou como “totalmente descabida” a alegação para a detenção, ocorrida no último sábado. Pesa contra Jeanine Añez a acusação de ter participado de um golpe de Estado contra o então presidente, Evo Morales.
Logo no início de sua fala, Bolsonaro externou preocupação com a situação no país vizinho, assinalando que “a defesa e a promoção da democracia são princípios basilares” do Prosul. Idealizado pelo presidente chileno, Sebastián Piñera, o grupo de países da região, que não inclui a Venezuela, foi criado em 2019.
“Nesse sentido, preocupam-no os acontecimentos em curso na Bolívia, nosso vizinho e país-irmão, onde a ex-presidente Jeanine Áñez e outras autoridades foram presas sob alegação de participação em golpe, que nos parece totalmente descabida”, enfatizou o presidente brasileiro, acrescentando:. “Esperamos que a Bolívia mantenha em plena vigência o Estado de Direito e a convivência democrática.”
Também o Ministério das Relações Exteriores externou apreensão em nome do Planalto, que apoiou e reconheceu o governo transitório de Jeanine Áñez (2019-2020). Em nota, o Itamaraty declarou “esperar que o Estado de Direito seja plenamente respeitado na Bolívia no processo movido” contra a ex-presidente e outras autoridades.
“A posse da presidente Jeanine Áñez se deu de maneira constitucional, reconhecida pelas instituições bolivianas”, assinalou ainda o comunicado. Por último, o Itamaraty enfatizou que a ex-presidente “convocou e realizou eleições livres e transferiu pacificamente o poder” para Luiz Arce, apoiado por Morales.
Processo
A Justiça boliviana impôs a Jeanine, no último domingo, quatro meses de prisão preventiva, enquanto ela aguarda julgamento. A ex-presidente, de 53 anos, foi levada na segunda-feira para a penitenciária de Obrajes, em La Paz. Ela está sendo processada por rebelião, terrorismo e conspiração. Ela deixou o poder em novembro, após a vitória eleitoral de Luis Arce, apoiado por Morales.
Dezenas de milhares de pessoas foram às ruas da capital, La Paz, depois da transferência de Jeanine Áñez para Obrajes. “Não foi golpe. Foi fraude”, diziam cartazes exibidos por manifestantes que, mesmo com a pandemia, marcharam até a frente do Ministério Público. Também houve mobilizações pacíficas em praças das cidades de e Santa Cruz (leste), Cochabamba (centro), Sucre (sudeste) e Trinidad (noroeste), onde a ex-presidente foi presa.
Em Santa Cruz, capital econômica da Bolívia e bastião da oposição, a concentração, na noite de segunda-feira, reuniu cerca de 40 mil pessoas na praça Cristo Redentor, emblemático lugar de reuniões públicas da direita, segundo estimativas de autoridades locais.
As acusações também são dirigidas contra o líder civil de Santa Cruz e governador eleito, Luis Fernando Camacho, que venceu as eleições em sua região com mais de 55% dos votos. Camacho ressaltou que Áñez e seus colaboradores são presos políticos.
“Não vamos deixá-los sozinhos”, prometeu, conclamando seus seguidores a permanecerem mobilizados e a fazer com que o governo do esquerdista Luis Arce pare com as prisões. O governo do Peru informou que Roxana Lizárraga, ex-ministra de Áñez, solicitou asilo. A oposição de direita e de centro acusa a Justiça de estar subordinada ao governo de Arce, o herdeiro político de Morales.
Alertas
A comunidade internacional reagiu à prisão de Áñez, ocorrida em Trinidad, capital do departamento amazônico de Beni (nordeste). Washington foi o último ator internacional a expressar sua preocupação, como fizeram a Comissão Europeia e a Organização das Nações Unidas (ONU).
“Os Estados Unidos estão acompanhando com preocupação os desdobramentos relacionados à recente prisão de ex-funcionários pelo governo boliviano”, disse Jalina Porter, porta-voz adjunta do Departamento de Estado. Por sua vez, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, destacou que “o sistema judicial boliviano não está em condições de oferecer as garantias mínimas de um julgamento justo” e pediu a liberação dos detidos.
Pelo Twitter, Morales respondeu a Almagro afirmando que “ele também deve ser julgado por promover o golpe e por crimes contra a humanidade”. Um relatório da OEA encontrou irregularidades nas eleições de 2019, que Morales rejeitou.
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Sucessão no Equador
Começou ontem a campanha para o segundo turno da eleição presidencial de 11 de abril. Em meio às crises saúde da saúde e da economia, o direitista Guillermo Lasso e o esquerdista Andrés Arauz vão disputar os quase 5,7 milhões de eleitores que não conquistaram em fevereiro.
Depois de um primeiro turno marcado pelo atraso dos resultados e por uma denúncia de fraude, que levou ao pedido de recontagem de votos, a reta final da campanha, que termina no próximo dia 8, começa com confrontos entre apoiadores e críticos do ex-presidente socialista Rafael Correa (2007-2017).
Cerca de 13,1 milhões dos 17,4 milhões de equatorianos vão eleger o sucessor do impopular governante Lenín Moreno, 67 anos, cujo mandato de quatro anos termina em 24 de maio. Herdeiro político de Correa, Arauz saiu na frente no primeiro turno, com 32,72% dos votos. ,
Lasso, um ex-banqueiro conservador de 65 anos, obteve 19,74%, após brigar voto a voto com o líder indígena de esquerda Yaku Pérez, que conquistou 19,39%. A ínfima diferença na votação levou Pérez a denunciar a fraude na votação, que não foi confirmada.
“É um desafio muito grande para esses dois candidatos finalistas conseguirem canalizar esse desencanto e essa crise que os cidadãos vivem e converter em voto”, opinou a consultora política e professora Wendy Reyes, acrescentando: “O público está bastante desanimado sobre o significado da política e a credibilidade das instituições. Há muitos problemas econômicos e de saúde em cima disso.”
A pandemia da covid-19 deixou mais de 16,2 mil mortos no país. Com a crise econômica, mais um milhão de pessoas perderam seus empregos. No fim do ano passado, 32,4% da população vivia na pobreza e a taxa de trabalho informal era de 22,3%.
Para o analista Paolo Moncagatta, a luta entre correísmo e anticorreísmo “vai se fortalecer” na campanha. “Tudo indica que será uma eleição apertada”, disse.