DIPLOMACIA

Sem meias palavras

Em conversas diretas e duras, representantes dos Estados Unidos e da China debatem, no primeiro encontro bilateral do governo Biden, temas conflitantes, mas apontam pontos de convergência, como Irã, Coreia do Norte e assuntos climáticos

Correio Braziliense
postado em 19/03/2021 21:56
 (crédito: ERIC BARADAT)
(crédito: ERIC BARADAT)

Ao fim da primeira reunião bilateral após a mudança do comando na Casa Branca, no Alasca, os principais diplomatas dos Estados Unidos e da China classificaram as conversas como diretas — americanos também nominaram o diálogo como duro. Os representantes dos dois países concordaram que foram encontradas algumas áreas em que os interesses das superpotências rivais convergiram.
“Esperávamos ter conversas duras e diretas sobre uma ampla gama de temas, e foi isso exatamente o que tivemos”, disse o assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan. “O diálogo foi direto, construtivo e útil, embora ainda haja divergências importantes entre ambas as partes”, observou, por sua vez, Yang Jiechi, o mais alto funcionário do Partido Comunista chinês para a diplomacia, segundo a agência de notícias Xinhua. A delegação de Pequim partiu sem fazer comentários imediatos.
O encontro de alto nível terminou em Anchorage, após troca de críticas por ações consideradas perturbadoras da estabilidade mundial. As duas potências não mediram palavras ao expor suas diferenças irreconciliáveis. Washington, que acusa Pequim de genocídio contra os muçulmanos uigures, também externou preocupação com Hong Kong, Taiwan, ataques cibernéticos contra os EUA e coerção econômica contra seus aliados.
A postura chinesa foi igualmente incisiva, com demonstração de oposição firme à ingerência americana a assuntos considerados internos e advertência de adoção de medidas firmes em resposta. “O que precisamos fazer é abandonar essa mentalidade da Guerra Fria”, assinalou Yang Jiechi.

Defensiva

No resumo do encontro, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, disse que Washington foi franco quanto a suas apreensões sobre a atitude de Pequim com relação a Hong Kong e Taiwan e sua atuação no ciberespaço. O lado chinês, segundo ele, ficou na defensiva, como o esperado pela Casa Branca.
“Mas também pudemos ter uma conversa muito sincera durante essas muitas horas sobre uma agenda de expansão”, afirmou o chefe da diplomacia americana. Blinken ressaltou alguns dos pontos de convergência. “Sobre o Irã, sobre a Coreia do Norte, sobre o Afeganistão, sobre o clima, nossos interesses se cruzam”, afirmou.
As reuniões foram fixadas como uma troca de pontos de vista e não eram esperados acordos ou pactos. “Temos as coisas claras ao sair e voltaremos a Washington para fazer um balanço de onde estamos”, disse Jake Sullivan. “Continuaremos consultando aliados e sócios sobre o caminho a seguir”, acrescentou.

Ponto neutro

A cidade de Anchorage, no Alasca, foi considerada um ponto de encontro mais neutro do que Washington ou Pequim para a cúpula de três sessões. Desde o início, porém, as expectativas de ambas as partes eram limitadas. Biden manteve uma linha dura com a China, e Blinken afirmou, antes mesmo do encontro, que se tratava do “maior teste geopolítico dos EUA no século 21”.
Nas mesa de negociação, Jiechi criticou os Estados Unidos por quererem “impor sua própria democracia ao resto do mundo”, ao que Blinken respondeu: “O que eu ouço é muito diferente do que você descreve.”
A última reunião entre as duas potências, ainda no governo de Donald Trump, ocorreu em junho do ano passado, em nada contribuiu para descongelar a relação. O encontro encerrado ontem foi o prolongamento de uma visita do chefe da diplomacia americana ao Japão e à Coreia do Sul, dois aliados-chave na região da Ásia e o Pacífico. Em Tóquio, Blinken advertiu a China contra o uso de “coerção e comportamento desestabilizador”.
Elizabeth Economy, principal pesquisadora da Instituição Hoover da Universidade de Stanford, avaliou que, ainda que o governo Biden tenha se afastado da retórica inflamada de Trump, as relações bilaterais permanecem tensas. “Pequim não vai recuar com relação a Xinjiang ou Hong Kong; essas são questões de soberania”, disse à agência de notícias France-Presse.
“É difícil ver a China mudar de rumo em qualquer tema de importância para os Estados Unidos. Estamos em uma posição em que nossos valores centrais e nossa visão de mundo futuro estão fundamentalmente em desacordo”, assinalou a pesquisadora.

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