A votação sobre a criação de um sindicato em um depósito da Amazon no Alabama, que seria o primeiro dos Estados Unidos, acaba nesta segunda-feira (29/3) após mais de cinco meses de uma campanha de Davi contra Golias, considerada histórica independentemente do resultado das urnas.
"Nossas relações pessoais estão à beira do desastre. Estamos esgotados, mas estou orgulhoso da equipe e dos trabalhadores da Amazon que se mobilizaram", afirmou Joshua Brewer, presidente local do RWDSU, sindicato da distribuição que representará os 5.800 funcionários da sede de Bessemer, caso o voto decida a favor de sua criação.
"O pior medo da Amazon já se concretizou: 3.000 funcionários disseram que não podem trabalhar nessas condições", acrescentou em declarações à AFP.
Desde o outono passado (primavera no Brasil), membros do sindicato ficavam dia e noite na entrada deste imenso e moderno complexo para reunir acordos de princípio suficientes (conseguiram 3.000) e para convencê-los depois a colocar em prática. A contagem dos votos deve começar na terça-feira.
Os resultados não são aguardados antes do fim de semana no mínimo, em função do número de votos (por formalidades como assinaturas em local inadequado ou profissão incorreta, entre outros).
Para Brewer, que espera complicações legais, a Amazon tentará atrasar o assunto "por todos os meios possíveis".
"Precisamos ser tratados com respeito e igualdade", resume Jennifer Bates, uma das trabalhadoras envolvidas no movimento. "Isso significa condições de trabalho seguras, estabilidade de emprego e melhores salários".
A Amazon anunciou nesta segunda-feira que a quantidade de aderentes ao sindicato RWSDSU "está caindo há duas décadas, mas esta não é uma razão (...) para distorcer os fatos".
"Nossos funcionários sabem a verdade: salário de 15 dólares por hora ou mais, cobertura de saúde e um local de trabalho seguro e inclusivo. Incentivamos todos os nossos funcionários a votar", disse a porta-voz da empresa.
Funcionários falam de um panorama diferente. Quando foi contratada, Lafonda Townsend, outra funcionária, estava "contente com o salário".
"Mas foi antes de ver como é difícil. A sala de descanso fica muito longe e é preciso comer como um prisioneiro, super-rápido, para voltar a tempo porque se você chega um minuto atrasado, conta como uma hora que não te pagam", relatou.
Poder
A gigante do comércio online fez muitas contratações em 2020 e quase dobrou seu lucro líquido para 21 bilhões de dólares graças à explosão da demanda em tempos de pandemia.
A Amazon, segundo maior empregador dos Estados Unidos (800.000 trabalhadores), está envolvida em uma luta de poder pela comunicação.
Seus porta-vozes atacaram recentemente no Twitter os legisladores que apoiam o sindicato. Também negaram que os funcionários tenham que urinar em garrafas de plástico por não terem tempo nem para ir ao banheiro, ao contrário do que mostram declarações e fotos publicadas por diferentes mídias.
No depósito, o grupo recorreu a todos os tipos de estratégias de dissuasão, com imagens destacando os benefícios sociais e cartazes nos banheiros.
De acordo com os funcionários, durante "reuniões de informação" a Amazon quis enfatizar as altas contribuições dos sindicatos (de quase 500 dólares por ano), além de suas tarifas atuais de ao menos 15 dólares por hora - mais que o dobro do salário mínimo neste estado pobre.
Mas Joshua Brewer destaca que "outros depósitos na região pagam 18-20 dólares por hora". Para este ex-pastor e vários observadores, a questão não é tanto o dinheiro, mas o controle absoluto que a Amazon tenta exercer.
"Como a maioria dos empregadores americanos, a Amazon quer manter seu poder sobre tudo e garantir que os trabalhadores não possam negociar nada", analisou Rebecca Givan, professora de Relações Sociais na Rutgers University.
Inspiração
De acordo com Givan, o grupo de Seattle poderia realizar "gastos quase ilimitados" para "demonstrar que qualquer tentativa de organização está condenada ao fracasso e desencorajar outros funcionários".
Mas a Amazon não tem apenas detratores em Bessemer. Sua chegada, há um ano, foi elogiada como sendo um fator de atração e "o maior projeto de investimento na história da cidade", segundo seu prefeito, Kenneth Gulley.
"Se toda essa negatividade e histórias horríveis fossem verdadeiras, isso significaria que existem 5.800 idiotas que trabalham no edifício. E eu não trabalho com nenhum idiota, nem sou idiota", observa Dawn Hoag, gerente de qualidade do depósito, de 43 anos.
Para ela, os colegas não precisam de representantes para se fazerem ouvir e mostra o orgulho de ter perdido cerca de cinquenta quilos, sobretudo graças aos quilômetros que percorre todos os dias no depósito.
Darryl Richardson, trabalhador na origem do movimento, conta que perdeu peso nos últimos meses como consequência do cansaço e do estresse.
"Meu corpo não vai mais aguentar (este ritmo)", diz este afro-americano de 51 anos. "Me perguntam por que não procuro outro emprego. Mais fácil falar do que fazer! Sou muito velho, não tenho uma 'boa imagem'. É hora de lutar".
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