Desafio ao Brasil na Copa América
Os próximos dias determinarão o desfecho do movimento ensaiado pelos jogadores da Seleção Brasileira para questionar a realização da Copa América por aqui, com sintomas mais do que evidentes de uma nova onda da pandemia à espreita na próxima esquina. Discreta e cuidadosa, de início, a contestação foi encabeçada — segundo o que transpirou — pelos atletas radicados no exterior, em especial na Europa. Do ponto de vista estritamente esportivo, assim como pela ótica do marketing, são eles que praticamente monopolizam as atenções públicas na antessala do torneio.
Segundo a tabela da Conmebol, a bola começa a rolar no domingo que vem — bem aqui, no Mané Garrincha. A final está marcada para 10 de julho, no Maracanã. Ao longo dessas quatro semanas, e nas que se seguirem, estará no radar de governantes, autoridades sanitárias e da imprensa o comportamento da covid-19 no subcontinente. E também a decisão quase instantânea do presidente Jair Bolsonaro de trazer para o Brasil a competição, depois das desistências sucessivas da Colômbia, imersa em uma onda de protesto social, e da Argentina, que vive período crítico da pandemia.
Bolsonaro apostou alto ao responder de bate-pronto, e afirmativamente, ao pedido da cartolagem continental. Chamando o jogo para si, como o craque do time que bate no peito e pede a bola, ficou a descoberto, caso alguma coisa saia errado.
Espelho meu...
Por falar na Colômbia, um mês de protestos e confrontos, com mais de 50 mortos, permitiram observar um elemento inquietante, visto daqui: a presença de civis armados disparando contra manifestantes. Em meio século de conflito armado com a guerrilha de esquerda — em especial, com as Farc — , um dos subprodutos foi a consolidação de esquadrões paramilitares. Surgidos para combater os rebeldes à margem do Exército oficial, e sem os constrangimentos legais vigentes para a força pública, esses “esquadrões da morte” foram desmobilizados, formalmente, no governo de Álvaro Uribe, entre 2002 e 2010.
A persistência das chamadas “autodefesas” no cenário político colombiano esteve à mostra desde então. Nos últimos anos, particularmente, foi uma sombra que se projetou no assassinato em série de militantes e ativistas sociais, assim como de dezenas de ex-guerrilheiros das Farc desmobilizados nos marcos do acordo de paz assinado em 2018 com Juan Manuel Santos, sucessor de Uribe.
A trajetória dos paramilitares colonbianos tem alguns tantos pontos de contato com a das milícias que tomam corpo no Brasil. Observar com atenção o processo no vizinho do norte e compreender a sua evolução é um exercício crucial para blindar e preservar a democracia por aqui.
Olho nas urnas
É também na fronteira amazônica que se desenrola, amanhã, um capítulo importante para o desenho da geopolítica regional. O Peru vai às urnas para o segundo turno da eleição presidencial na expectativa de superar a instabilidade política que se prolonga desde a virada do século. Após a renúncia de Alberto Fujimori, em 2000, ao fim de 10 anos de governo de exceção, sucederam-se sete presidentes. Os cinco primeiros estiveram envolvidos em processos por corrupção, e os dois que se seguiram chegaram ao cargo como ocupantes interinos.
Desta vez, os eleitores optarão entre dois extremos. Pela direita, Keiko Fujimori, filha e herdeira política do ex-presidente. Segunda colocada na rodada inicial, ela saiu claramente atrás nas pesquisas para o tira-teima, mas veio tirando a desvantagem e chega ao pleito como uma incógnita. Tentará surpreender Pedro Castillo, o professor e sindicalista que saiu vencedor do primeiro turno e recolocou a esquerda no mapa político.
O veredito das urnas no Peru, três semanas depois da derrota do direitista Sebastián Piñera na eleição da Assembleia Constituinte, no Chile, terá impacto na reconformação do mapa político sul-americano — com desdobramentos inevitáveis para a inserção regional do governo Bolsonaro.
Pessoal, mas transferível
Causou sensação no noticiário, na semana que termina, a virada política anunciada em Israel. Uma coalizão que se estende da direita nacionalista à esquerda, passando por legendas centristas e incluindo um partido da minoria árabe, se apresenta para substituir o instável governo formado pelo premiê Benjamin Netanyahu. No poder durante os últimos 12 anos, depois de um mandato anterior de três anos (1996-1999), ele se tornou o ocupante mais longevo do cargo, superando David Ben Gurion, líder sionista e fundador do moderno Estado de Israel.
Netanyahu formou, com Donald Trump, a dupla de aliados internacionais mais sólidos de Jair Bolsonaro. À primeira vista, sua queda poderia sugerir mais dificuldades para o presidente brasileiro na frente externa. No fundamental, porém, o direitista Naftali Bennett, indicado para chefiar inicialmente o novo governo, tem posições semelhantes às do antecessor na questão mais candente para Israel, do ponto de vista diplomático: é igualmente avesso ao reconhecimento de um Estado palestino, assim como o centrista Yair Lapid, o aliado a quem deve ceder o posto dentro de dois anos.
Pela ótica do Planalto, a aliança com Israel se assenta nessa posição, em sintonia com a maioria da comunidade judaica brasileira e — principalmente — com as igrejas evangélicas neopentecostais, um dos alicerces político-eleitorais de Bolsonaro.
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