A menos de um ano para a realização do pleito presidencial, os eleitores franceses dão um sinal de alerta para Emmanuel Macron, atual líder do país, e sua principal rival nas urnas em 2017, Marine Le Pen. O primeiro turno da disputa regional francesa teve como principal vencedor uma coligação de direita do qual nenhum dos dois faz parte. O Reagrupamento Nacional (RN), grupo ultradireitista de Le Pen, ficou em segundo lugar na disputa, ao contrário do que era apontado pela maioria dos especialistas. Já o partido do chefe de Estado, a República em Marcha (LREM), ficou fora do “pódio”, com apenas 13% dos votos. Além do resultado inesperado, as eleições foram marcadas pelo alto índice de abstenção.
“Claro que estamos decepcionados com esse resultado”, declarou o chefe do partido presidencial, Stanislas Guerini, à rádio francesa RTL. O LREM ficará de fora das disputas de segundo turno, marcadas para o próximo domingo, nas regiões de Occitane, Auvergne-Rhône-Alpes e Hauts-de-France. Com quatro anos de existência, a sigla não conseguiu se impor em nível local, mas pode ser decisiva para impedir a ascensão da ultradireita na próxima etapa do pleito. Embora o Executivo tenha afirmado que não se submeteria aos resultados, a questão de uma reformulação ministerial volta à mesa, principalmente porque 15 ministros eram candidatos.
Le Pen, por sua vez, descreveu o baixo comparecimento como um “desastre cívico” e conclamou os eleitores a comparecerem às urnas na próxima etapa do pleito. “Se você quer que as coisas mudem, você deve votar”, disse a líder da ultradireita em um breve discurso, segundo o jornal britânico The Financial Times. Apontado como favorito, o RN obteve um resultado inferior ao das eleições regionais de 2015, em que venceu em seis regiões. O partido vai para o segundo turno em um número importante de regiões, mas não parece ter condições de vencer nenhuma delas. “Faço um chamado por um sobressalto”, declarou a líder. O partido enfrenta, há décadas, a hostilidade de outras siglas, que costumam criar uma frente unida contra ele sempre que há segundo turno.
O maior vitorioso do pleito francês foi o direitista Xavier Bertrand, que recebeu entre 39% e 46% dos votos em Hauts-de-France. A disputa era pelo controle em 13 regiões francesas. As pesquisas indicam que, em nível nacional, a oposição de direita obteve cerca de 29% dos votos, à frente da ultradireita (18,5%) e dos socialistas (18%). Os ecologistas (EELV), que tiveram um bom desempenho nas eleições municipais de 2020, somaram 12% dos votos.
Pandemia
Para a líder ultradireitista, a falta de fé dos eleitores no sistema de escolha de líderes impactou no resultado das urnas. “Sejamos realistas, os resultados foram marcados por uma abstenção torrencial, e também histórica, de quase 70%, devido à desconfiança do sistema eleitoral, que deixa o eleitor com a sensação de que nada pode mudar, que tudo está confiscado”, justificou.
Os centros de votação foram abertos às 8h de ontem (3h, em Brasília) para os 48 milhões de eleitores registrados. Embora a pandemia da covid-19 esteja em declínio no país, um protocolo sanitário foi posto em prática, e os votantes tiveram que respeitar uma distância segura, usar máscara e álcool em gel. Apesar dos cuidados, a votação foi marcada por uma abstenção recorde: de ao menos 67%, segundo pesquisas de boca de urna. A baixa adesão ao pleito também foi considerada “preocupante” pelo ministro do Interior, Gérald Darmanin, em uma declaração feita no fim do dia.
“Podemos falar em um colapso da participação eleitoral”, resumiu o cientista político Bruno Cautrès, pesquisador do Cevipof, à Agência France-Presse (AFP) de notícias. Para o especialista, “há um efeito covid muito importante, mas há também a ausência quase total de uma campanha sobre os temas de regionalização”. “É um tapa na cara de toda a classe política”, declarou, também à AFP, Philippe Moreau-Chevrolet, professor de comunicação política na escola Sciences Po.
A alta abstenção era esperada por especialistas, que apostavam também que o fenômeno poderia beneficiar a extrema direita. “Quanto mais a abstenção aumenta, em termos de número de votos, os extremos do espectro político vencem”, justificou à AFP Pierre Lefebure, cientista político da Universidade Sorbonne em Paris.
Os ultradireitistas lideravam as pesquisas em seis das 13 regiões metropolitanas, impulsionados pela rejeição aos partidos tradicionais e pelo medo causado pelos ataques extremistas. Caso essa previsão tivesse se cumprido, seria a primeira vez na história que o grupo teria tanto poder no país. A expectativa era usar esse trunfo para se fortalecer na disputa presidencial do próximo ano, prevista para abril.
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