Pegasus

Software pode ter vigiado jornalistas e ativistas

Programa criado por empresa israelense estaria espionando o celular de mais 50 mil pessoas — entre profissionais de imprensa e chefes de Estado, segundo grupo de mídia. Filho do presidente brasileiro já demonstrou interesse em adquirir o produto

Correio Braziliense
postado em 18/07/2021 23:03 / atualizado em 18/07/2021 23:03
 (crédito: Mohammed Alshaikh/AFP - 15/12/14)
(crédito: Mohammed Alshaikh/AFP - 15/12/14)

Mais de 50 mil pessoas, entre ativistas, jornalistas e políticos de ao menos 50 países, podem ter sido alvo de espionagem digital. A informação foi divulgada por um grupo formado por 17 organizações de mídia, que indicam que o software Pegasus, criado pela empresa privada israelense NSO e desenvolvido com o objetivo de investigar criminosos e terroristas, pode ter tido sua finalidade desviada por governos para interesses de políticos e de outros nomes poderosos. Em maio, a imprensa brasileira informou que o deputado Carlos Bolsonaro sinalizou o interesse pela compra da ferramenta, o que teria causado mal- estar com órgãos oficiais brasileiros de investigação.

O vazamento de informações foi relatado em reportagens de vários veículos de comunicação, como The Washington Post, dos Estados Unidos, The Guardian, no Reino Unido, e Le Monde, na França, que colaboraram com as investigações. Os periódicos revelaram a existência de uma lista extensa de números de telefone que foram identificados como pertencentes a pessoas de interesse de clientes da NSO desde 2016. De acordo com The Guardian, a Forbidden Stories, uma organização de mídia sem fins lucrativos com sede em Paris, e a Anistia Internacional (AI) tiveram acesso à lista e compartilharam o material com os parceiros de mídia.

Segundo o The Guardian, a presença de um número de telefone na lista não revela se o dispositivo foi hackeado ou sujeito a uma tentativa de espionagem, mas o consórcio da imprensa acredita que os dados são indicativos dos alvos potenciais dos clientes do NSO. A lista inclui números de telefone de jornalistas de empresas de comunicação de todo o mundo, como Agência France-Presse (AFP), The Wall Street Journal, CNN, The New York Times, Al-Jazeera, France 24, Radio Free Europe, Mediapart, El País, Associated Press, Le Monde, Bloomberg, The Economist, Reuters e Voice of America.

De acordo com o grupo de mídia que trouxe o caso à tona, os números da lista dos alvos do Pegasus não aparecem com identificação, mas mais de mil pessoas já teriam sido identificadas. Entre as possíveis vítimas, estão membros de famílias reais árabes, 65 executivos de empresas, 85 ativistas de direitos humanos, 189 jornalistas e mais de 600 políticos e funcionários públicos, incluindo chefes de Estado e de governo e ministros. A maioria dos possíveis espionados está concentrada em 10 países, de acordo com o Washington Post. São eles: Azerbaijão, Barein, Hungria, Índia, Cazaquistão, México, Marrocos, Ruanda, Arábia Saudita e Emirados Árabes.

O NSO, que é um dos líderes da indústria de softwares espiões privados, considerou as acusações exageradas e infundadas, também de acordo com o jornal estadunidense. Em uma carta enviada ao grupo de mídia que denunciou o caso, justificou que não pode confirmar ou negar a identidade dos clientes governamentais e destacou que “continuaria a investigar todas as alegações confiáveis de uso indevido e tomar as medidas adequadas”. A empresa informou que suas ferramentas tecnológicas são vendidas para 60 clientes em 40 países, mas não revelou a identidade deles.

Assassinatos
Também constam na lista vazada mais de 15 mil números do México e mais de mil da Europa, além de dois telefones pertencentes a mulheres próximas ao jornalista saudita Jamal Khashoggi, morto por um esquadrão saudita em 2018. Há ainda o número do jornalista independente mexicano Cecilio Pineda Birto, assassinado em um lava-jato, em 2017. Seu telefone nunca foi encontrado, e não está claro se o aparelho foi hackeado.

Outro nome que compõe a lista de possíveis hackeados é o de Edwyn Plenel, um dos mais conhecidos jornalistas da França, ex-diretor do jornal Le Monde e fundador do site Mediapart.

A Anistia Internacional (AI) fez uma perícia forense em 67 smartphones com suspeitas de ataques hackers e constatou que 23 foram invadidos e 14 sofreram uma tentativa de hackeamento. Nos 30 aparelhos restantes, a avaliação foi inconclusiva devido a atualizações dos dispositivos eletrônicos. Para ter acesso aos dados dos celulares, o Pegasus precisaria apenas enviar um vídeo para um grupo do WhatsApp ou uma chamada de voz no mesmo aplicativo.

O programa espião ocupa as manchetes desde 2016, quando investigadores apontaram que ele era usado para espionar um dissidente nos Emirados Árabes. O Citizen Lab, centro de pesquisas da Universidade de Toronto, no Canadá, informou, em dezembro último, que dispositivos móveis de mais de 30 jornalistas da rede Al-Jazeera, do Catar, haviam sido atacados pelo malware.

Já a AI comunicou, em junho de 2020, que autoridades marroquinas usaram o programa de hackeamento para coletar dados do celular de Omar Radi, jornalista condenado por uma postagem nas redes sociais. Naquela época, a NSO disse que estava “profundamente preocupada com as acusações” e que analisaria a informação.

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Investimento milionário

Em maio, o portal de notícias UOL informou que o deputado Carlos Bolsonaro comandava articulações políticas em prol da compra do aplicativo Pegasus. O pedido de licitação foi publicado em um edital do Ministério da Justiça, informando a possibilidade de gastos de mais de R$ 25 milhões para a aquisição do malware. A ação seria uma tentativa de diminuir o poder de militares e órgãos de inteligência, indicou o portal O deputado não se pronunciou sobre o tema ao ser procurado.

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