Nos cartazes, frases como “Não vamos entregar a soberania, nem a independência da nação”. A bandeira de Cuba e as fotos de Fidel Castro estampavam os carros — muitos deles cinquentenários, como os das marcas Lada (ex-União Soviética) e Geely (China) — que desfilavam ao longo do Malecón, o famoso calçadão à beira-mar de Havana.
Sob o lema “Amor, paz e solidariedade”, o protesto organizado pela União dos Jovens Comunistas (UJC), a juventude do Partido Comunista Cubano, ocorreu sem o assédio da polícia. Ao contrário de manifestações que se espalharam pela ilha caribenha, em 11 de julho, e foram reprimidas pelas forças de segurança.
A Suprema Corte de Cuba anunciou, ontem (5/8), que 62 pessoas foram julgadas por crimes cometidos durante as manifestações de 26 dias atrás. “As pessoas colocadas à disposição dos tribunais são aquelas cuja conduta constituiu um crime”, declarou Joselín Sánchez Hidalgo, magistrado do Supremo Tribunal Popular, ao jornal oficial Granma.
De acordo com Hidalgo, 53 condenados foram denunciados pelo delito de desordem pública, mas também estão presentes crimes como resistência à prisão, desacato à autoridade, instigação à delinquência e danos. A lei cubana estabelece penas de até um ano de privação de liberdade e/ou multa de 300 pesos (cerca de R$ 65). Dos 62 manifestantes julgados, 22 compareceram ao tribunal acompanhados de um advogado; um foi absolvido e 21 tiveram a liberdade condicional revogada por descumprirem obrigações impostas pela lei. Quarenta e cinco réus apresentaram recurso de apelação.
Os números reais de presos durante ou horas após os protestos de 11 de julho seguem controversos. As organizações sociais cubanas estimam que elas passem de 700. Familiares dos condenados apontam falta de garantias processuais, como dificuldade de acesso a advogados. “Podemos garantir que nos processos judiciais tramitados até o momento se manteve uma observância estrita de cada uma das garantias individuais, em particular o direito à prática de provas e a exigência de demonstrar responsabilidade dos acusados nos fatos a eles imputados”, comentou o juiz.
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“Em Havana, tivemos, até o momento, 20 julgamentos sumários, os quais ocorrem em grupos. Cada um envolve entre 10 e 12 réus. As sentenças variam de 4 meses a 15 meses de prisão”, explicou ao Correio a jornalista e escritora cubana Maria Matienzo Puerto, 41 anos, aliada do Movimento San Isidro — coletivo de artistas que exige liberdade de expressão e artística em Cuba. Segundo ela, os familiares dos presos enfrentam a angústia por não saberem quando serão levados a julgamento. “Ainda vemos muitos policiais em cada esquina da capital, que vive um clima de tranquilidade aparente. Eu mesma estou sitiada pelas forças de segurança. Seis agentes estão na esquina de minha casa”, disse Maria.
Ontem, a organização não governamental Anistia Internacional (AI) publicou uma carta aberta endereçada ao presidente Miguel Díaz-Canel Bermúdez e à procuradora-geral da República, Yamila Peña. No documento, assinado pela diretora da AI para as Américas, Erika Guevara Rosas, a ONG solicita “informações relacionadas ao número de pessoas que foram detidas em 11 de julho no contexto dos protestos em todo o país”. A AI também demanda “dados sobre o total de pessoas que, até o momento, foram colocadas em liberdade, que permanecem sob custódia do Estado e em processo de investigação”.
Simbolismo
A manifestação organizada pela (UJC), em Havana, coincidiu com o 27º aniversário do Maleconazo, o único ato multitudinário enfrentado por Fidel Castro depois da Revolução Cubana, em 1959. “Fiquei motivada a participar da convocação e tentar dar paz e tranquilidade. É disso que precisamos!”, disse à agência France-Presse Odalys Izquierdo, de 29 anos, motorista de bicicleta-táxi elétrica amarela.
Enquanto isso, Díaz-Canel participava de um evento na Universidade de Havana que reuniu estudantes e camponeses. “Sempre é gratificante voltar à universidade, falar com os estudantes, escutar suas propostas e sugestões para melhorar as coisas. (…) Eles nos deixaram tarefas, e vice-versa”, disse o presidente cubano.
» Pressão pelo fim de Guantánamo
Congressistas dos Estados Unidos pediram ao presidente Joe Biden que feche imediatamente a prisão de Guantánamo e liberte ou julgue em tribunais federais os 39 detidos na “guerra contra o terrorismo” ainda reclusos neste centro de detenção na ilha de Cuba.
Ao se aproximar o 20º aniversário dos atentados de 11 de setembro, 75 legisladores democratas assinaram uma carta na qual afirmam que a prisão administrada pela Marinha americana na Baía de Guantánamo, em Cuba, está em mau estado, é cara e representa uma vergonha para os direitos humanos no país.
Eles afirmaram que o centro recebeu 800 prisioneiros, dos quais restam atualmente 39, “muitos envelhecidos e cada vez mais doentes”, e que o custo anual de funcionamento do local supera os US$ 500 milhões (cerca de R$ 2,6 bilhões).
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