Afeganistão

Para Irã e Turquia, talibãs no poder é dor de cabeça

Segundo os analistas, tudo dependerá se os talibãs vão adotar uma postura mais moderada, favorável à cooperação internacional, ou se voltarão ao extremismo desenfreado.

Agência France-Presse
postado em 17/08/2021 13:31 / atualizado em 17/08/2021 13:31
 (crédito: PATRICK BAZ / AFP)
(crédito: PATRICK BAZ / AFP)

A rápida chegada do Talibã ao poder no Afeganistão pode acabar se tornando uma verdadeira dor de cabeça para Irã e Turquia, dois pesos pesados da região.

Os dois países veem como uma oportunidade para aumentar sua influência, mas nenhum deles quer uma nova chegada de refugiados em massa, especialmente no atual contexto de pandemia da covid-19.

Segundo os analistas, tudo dependerá se os talibãs vão adotar uma postura mais moderada, favorável à cooperação internacional, ou se voltarão ao extremismo desenfreado que resultou em sua derrubada após os atentados do 11 de Setembro.

"A situação representa um enorme risco para a Turquia (...). O Irã também pode perder, se os talibãs voltarem aos seus velhos hábitos e fornecerem refúgio" aos extremistas islamitas, disse à AFP a pesquisadora Asli Aydintasbas, do Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR).

Além disso, tanto Irã quanto Turquia podem ver uma chegada em massa de refugiados, muitos deles buscando ir para a Europa.

Os dois países já abrigam muitos refugiados - 3,6 milhões de sírios na Turquia; 3,5 milhões de afegãos no Irã -, e a tolerância de suas próprias populações está-se esgotando.

A pandemia também atingiu duramente o Irã, empurrando um pouco mais este país, já afetado por sanções internacionais, para uma maior crise econômica.

Já a Turquia freou seu crescimento econômico, que foi a base da popularidade do presidente Recep Tayyip Erdogan.

Na semana passada, Erdogan disse que estava disposto a se reunir com os líderes do Talibã para tentar alcançar a paz, enquanto o novo presidente de linha dura do Irã, Ebrahim Raisi, defendeu que a "derrota" militar dos Estados Unidos no Afeganistão é uma oportunidade de levar a paz ao país.

Nesta terça-feira, o ministro turco das Relações Exteriores, Mevlut Cavusoglu, falou de "mensagens positivas" dos talibãs sobre a proteção de civis e estrangeiros, e expressou sua esperança de que isso se reflita "em suas ações" no futuro.

"Bomba-relógio"

Os analistas estimam, porém, que a chegada dos talibãs ao poder privou Erdogan de uma valiosa carta estratégica que esperava jogar, com a esperança de melhorar as relações com o presidente americano, Joe Biden: garantir a segurança militar do aeroporto de Cabul.

"Toda missão turca está em perigo, assim como a ideia de usar o aeroporto de Cabul como palanque para reviver as relações da Turquia com Washington", afirma Asli Aydintasbas, para quem é "difícil de imaginar" que os talibãs deixariam a Turquia controlar o aeroporto.

"Há alguns dias, parecia uma chance de ouro para a Turquia. Agora é uma enorme bomba-relógio", diz a pesquisadora.

"A questão mais urgente" para Erdogan é a possível chegada de refugiados procedentes do Afeganistão, enquanto a presença de sírios no país nos últimos anos já está causando confusão.

"Modus vivendi"

Para o Irã, a turbulência no Afeganistão pode não ser totalmente agradável, mesmo que Teerã tenha alcançado seu objetivo de fazer com as forças dos Estados Unidos abandonarem a região, comenta Rouzbeh Parsi, diretor do programa do Oriente Médio e Norte da África do Instituto Sueco de Assuntos Internacionais.

"O apoio dos Estados Unidos aos governos afegão e iraquiano foi útil para o Irã, no sentido de que proporcionou certa estabilidade, e os Estados Unidos fizeram o trabalho pesado", estima.

Mas o Irã, que é majoritariamente xiita e compartilha uma fronteira de mais de 900 km com o Afeganistão, parece querer alcançar um "modus vivendi" com os talibãs sunitas, acrescenta.

"Faz tempo que o Irã, pragmático como sempre, aceitou que os talibãs não vão desaparecer e que nenhum estrangeiro poderá derrotá-los militarmente", afirma.

"O Irã é um país fortemente afetado pela covid-19, pela corrupção e com um economia instável. Sua capacidade e disposição para acolher mais refugiados afegãos provavelmente não será grande", completou.

Para Marc Pierini, pesquisador convidado do Carnegie Europe e ex-embaixador da UE na Turquia, a Europa observa nervosa os possíveis fluxos migratórios, depois que um milhão de pessoas chegaram a seu território, principalmente em 2015, quando o conflito sírio estava em seu apogeu.

"Enfrentar esta emergência vai exigir cooperação humanitária e confiança entre UE, Irã e Turquia, o que será difícil de alcançar", disse à AFP.

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