JAPÃO

Entenda por que o premiê japonês renunciou ao cargo

Yoshihide Suga desiste de concorrer à eleição interna do governista Partido Liberal Democrata, o que implica no abandono do cargo de primeiro-ministro. Decisão causa surpresa em Tóquio e ocorre em meio aos Jogos Paralímpicos

Rodrigo Craveiro
postado em 04/09/2021 07:00
 (crédito: Kazuhiro NOGI / AFP)
(crédito: Kazuhiro NOGI / AFP)

A insatisfação pessoal com a resposta à pandemia da covid-19 levou o primeiro-ministro japonês, Yoshihide Suga, a desistir de comandar o seu Partido Liberal Democrata (PLD) nas eleições internas de 29 de setembro. Com a decisão, ele também deixará o cargo de premiê. “Quero me concentrar nos esforços para combater o coronavírus e é por isso que não vou concorrer às eleições”, afirmou Suga. “Percebi que não poderia fazer as duas coisas; tive que escolher”, acrescentou o chefe de governo, em referência ao combate à pandemia e aos esforços pela releição no PLD. A opção de Suga foi anunciada aos líderes de seu partido e provocou um terremoto político em Tóquio, a dois dias do fim da Jogos Paralímpicos.


“Honestamente, estou surpreso”, reagiu Toshihiro Nikai, número dois do PLD. “É realmente lamentável, mas ele fez o que acreditava ser melhor, após uma longa reflexão”, acrescentou. Suga foi alçado à chefia de governo em 14 de setembro de 2020, depois da renúncia do primeiro-ministro Shinzo Abe, acometido por problemas de saúde. Segundo a agência de notícias France-Presse (AFP), como não existe nenhum outro partido capaz de rivalizar com o PLD (direita nacionalista), o novo líder da legenda será quase que automaticamente nomeado primeiro-ministro.


Subdiretora do Programa de Liderança Estratégica EUA-Japão do Centro para Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS, em Washington), Yuko Nakano explicou ao Correio que existiam indícios de que Suga enfrentava uma batalha árdua, incluindo a contínua tendência de queda do índice de aprovação do gabinete, o aumento nos casos de infecção pela covid-19 e a derrota nas eleições locais. “Além disso, muitas das facções dentro do PLD não puderam anunciar o apoio à reeleição de Suga como presidente do partido, embora os líderes delas tivessem expressado, anteriormente, apoio ao premiê”, admitiu.


Nakano lembrou que somente o ex-chanceler Fumio Kishida (veja quadro) anunciou sua candidatura, enquanto outros se abstiveram de fazê-lo, enquanto se esperava que Suga se postulasse à reeleição. “Agora, o cenário político mudou. Taro Kono, ex-ministro das Relações Exteriores e da Defesa sob o governo do premiê Shinzo Abe, atualmente na supervisão do programa de imunização contra a covid-19, está considerando se participará da disputa. Outros nomes incluem os ex-ministros Shigeru Ishiba (Defesa) e Sanae Takaichi (Comunicações). É preciso superar 20 cossignatários para ser nomeado candidato, o que é um grande obstáculo”, disse a estudiosa. “Nós esperamos ver muitos movimentos até 29 de setembro. Os candidatos à posição de liderança do PLD apresentarão formalmente a candidatura até 17 de setembro, quando a campanha oficialmente começará.”


A decisão de Yoshihide Suga, 72 anos, lembra as adotadas por outros chefes de governo anteriores. Segundo a AFP, o premiê era considerado o principal nome para comandar o partido por mais um mandato, ainda que as pesquisas apontassem um aumento de sua impopularidade. No fim de agosto, tinha apenas 26% de opiniões positivas, apontou o jornal Mainichi — um recorde negativo.

Covid-19


O prestígio político de Suga foi afetado após decisões durante a gestão da pandemia da covid-19, pelas quais o premiê recebeu muitas críticas. Nos últimos três meses, o Japão registrou índices altos de casos da doença, chegando a 20 mil diários. O primeiro-ministro foi lento na implementação de uma campanha de imunização e chegou a decretar estado de emergência em várias oportunidades. A decisão de não adiar a Olimpíada e os Jogos Paralímpicos também custou-lhe popularidade — a maioria da população japonesa se opunha à realização dos eventos.


Experiente e pragmático, Suga não descuidou do impulso econômico obtido durante a gestão de Abe. Também manteve foco nas questões ambientais e preservou a diplomacia do antecessor. Filho de um fruticultor e de uma professora, Suga foi criado na zona rual de Akita, no norte do Japão, e trabalhou em uma fábrica para custear os próprios estudos. A carreira política começou em 1987, quando foi eleito membro da Câmara Municipal de Yokohama e ingressou no Parlamento em 1996.

» EU ACHO...

“Havia o receio, especialmente entre os membros mais jovens do Partido Liberal Democrata (PLD), de que a presença de Yoshihide Suga na chapa levaria a uma batalha muito dura na eleição da Câmara Baixa. O anúncio de que ele não disputará a reeleição surpreendeu muitos japoneses.”
Yuko Nakano, subdiretora do Programa de Liderança Estratégica EUA-Japão do Centro para Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS, em Washington)


“Quero me concentrar nos esforços para combater o coronavírus e é por isso que não vou concorrer às eleições”
Yoshihide Suga, primeiro-ministro do Japão

 
» Prováveis sucessores

Quem são os potenciais nomes para ocupar o cargo do Partido Liberal Democrata (PLD), após as eleições de 29 de setembro

Fumio Kishida, o moderado
Aos 64 anos, foi o primeiro, e até o momento o único, a anunciar oficialmente sua candidatura à presidência do PLD. Ex-ministro das Relações Exteriores (2012-2017), considerado pouco carismático e favorito do então primeiro-ministro Shinzo Abe, disputou a última eleição interna do PLD há um ano, que terminou com a vitória de Suga. A condição de “moderado” o coloca como favorito.

Taro Kono, o comunicativo
Ex-ministro das Relações Exteriores (2017-2019), da Defesa (2019-2020) e atualmente titular da pasta da Reforma Administrativa, Taro Kono, 58 anos, é um usuário entusiasta do Twitter. Sua conta em japonês é seguida por 2,3 milhões de assinantes. Formado pela prestigiosa American University of Georgetown, ele se comunica confortavelmente em inglês, uma raridade no mundo político japonês. É apreciado pelos círculos empresariais e esteve à frente da campanha nacional de vacinação.

Shigeru Ishiba, o populista
Ex-ministro da Defesa (2007-2008) e especialista em assuntos militares, já ocupou outras pastas e foi secretário-geral do PLD entre 2012 e 2014. O ex-banqueiro de 64 anos tem o apoio da opinião pública, mas, dentro do seu próprio partido, alguns não apreciam as suas frequentes mudanças de lado e as suas declarações a portas fechadas. Como Kishida, Ishiba foi um candidato na eleição interna anterior do PDL em setembro de 2020.

 

 

 

 

 

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação