EUA

11 de setembro: 20 anos da tragédia que o mundo não esquece

Há duas décadas, 19 terroristas da rede Al-Qaeda, munidos de estiletes, sequestraram quatro aviões comerciais e os utilizaram como armas contra os Estados Unidos. O maior atentado da história estremeceu a influência da superpotência no planeta

Rodrigo Craveiro
postado em 05/09/2021 06:00 / atualizado em 05/09/2021 11:08
Sob pressão das famílias dos quase 3 mil mortos na tragédia, o presidente norte-americano, Joe Biden, ordenou a divulgação de documentos secretos da investigação governamental sobre os atentados -  (crédito: SETH MCALLISTER/AFP)
Sob pressão das famílias dos quase 3 mil mortos na tragédia, o presidente norte-americano, Joe Biden, ordenou a divulgação de documentos secretos da investigação governamental sobre os atentados - (crédito: SETH MCALLISTER/AFP)

Há 20 anos, quando as Torres Gêmeas do World Trade Center, em Nova York, ruíram e o Pentágono foi atingido, em Washington, a maior potência do planeta viu-se humilhada. Comandos terroristas suicidas sequestraram quatro aviões comerciais e lançaram três deles contra os símbolos do poderio econômico e militar. A outra aeronave caiu em descampado da Pensilvânia, depois de uma rebelião dos passageiros, provavelmente a caminho do Capitólio ou da Casa Branca. A rede Al-Qaeda, comandada pelo dissidente saudita Osama bin Laden, expôs a vulnerabilidade dos Estados Unidos, naquela manhã ensolarada de terça-feira, 11 de setembro de 2001.

As cenas de civis saltando para a morte do alto de arranha-céus, da fumaça espessa sobre Manhattan e dos semblantes de pavor nas ruas chocaram o planeta e mostraram que a fortaleza do Ocidente poderia ser transposta. Sinais de alerta difusos e crescentes tinham sido captados pela inteligência dos EUA, mas sem precisão sobre a ameaça.

Sob pressão das famílias dos quase 3 mil mortos na tragédia, o presidente norte-americano, Joe Biden, ordenou a divulgação de documentos secretos da investigação governamental sobre os atentados. A desclassificação dos dossiês deverá ocorrer em seis meses. “Nunca devemos esquecer a dor duradoura das famílias e entes queridos dos 2.977 inocentes que foram mortos durante o pior ataque terrorista de nossa história”, declarou, na última quinta-feira. Para analistas, o 11 de Setembro é um ponto de inflexão na influência norte-americana sobre a geopolítica internacional.

Diretor do Centro para Estudos do Afeganistão da Universidade de Nebraska (EUA), o afegão Sher Jan Ahmadzai afirmou ao Correio que os ataques contra Nova York e Washington representaram um imenso desafio aos esforços dos Estados Unidos para manterem a condição de potência global, especialmente no Oriente Médio. “Com a perseguição à Al-Qaeda e ao Talibã, aliado de Bin Laden que comandava o Afeganistão até 2001, os norte-americanos mostraram-se capazes de reagir a agressões em qualquer lugar do planeta. Os países da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) apoiaram a operação, e isso mostrou a dimensão dos EUA na reunião de nações contra um inimigo em comum”, avaliou.

A volta do Talibã ao poder, em Cabul, e a retirada do Afeganistão indicaram um ângulo diferente. “Isso provou que o poder dos Estados Unidos é limitado, e que a política global mudou nos últimos 20 anos. Há potências emergentes, como a China e a Rússia, além de outras menores no Oriente Médio: Irã, Paquistão e Índia”, disse o afegão.

Desmoralização

Ahmadzai prefere não falar em desmoralização. “Os EUA foram machucados pelo que ocorreu em 11 de setembro de 2001. O país mantinha o status de potência global. Nas últimas duas décadas, com o envolvimento nas guerras do Afeganistão, do Iraque, da Líbia e da Síria, a situação se modificou um pouco.”

Para Alan Dershowitz, professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard, o fato de 19 terroristas — comandados pelo egípcio Mohamed Atta e armados com estiletes — terem provocado tantos danos, sem que a maior potência militar e de inteligência os detivesse, desmoralizou uma nação inteira. “A realidade de que o Talibã venceu uma guerra de 20 anos enfraqueceu o poder dos EUA”, disse à reportagem.

Dave DesRoches, professor do Centro para Oriente Médio e Sul da Ásia da Universidade da Defesa Nacional (em Washington), explicou ao Correio que o 11 de Setembro mostrou aos EUA que problemas em outras nações podem afetá-los. “Os atentados revelaram que, se um país fracassar (com o Talibã no poder e o abrigo à Al-Qaeda), isso pode ter implicações para a segurança dos EUA. Os americanos tendem a atravessar ciclos de engajamento e de isolacionismo. O 11 de Setembro marcou o começo de um período de engajamento. Depois dos atentados, houve um ressurgimento do patriotismo.”

Em 7 de outubro de 2001, o presidente George W. Bush ordenou o ataque a posições da milícia fundamentalista Talibã e da Al-Qaeda. Tropas invadiram o Afeganistão para caçar Bin Laden. O regime talibã ruiu, e os EUA mantiveram a ocupação por 20 anos. Bin Laden foi morto em 2011, em Abbottabad (Paquistão).

Na última terça-feira, 18 dias após a retomada do poder pelo Talibã, os Estados Unidos abandonaram o Afeganistão. Mais uma vez, o Tio Sam viu-se acuado. Um atentado suicida reivindicado pelo Estado Islâmico-Khorasan (ISIS-K) matou 10 fuzileiros navais (marines) e acelerou a retirada. Biden anunciou uma “virada de página na política externa” e prometeu abandonar a política de polícia do mundo. “Temos que aprender com nossos erros.”

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  • Seth Mcallister/AFP
    Seth Mcallister/AFP Foto: Seth Mcallister/AFP
  • Depois do 11 de setembro, a política dos EUA ficou mais dura quanto aos direitos individuais
    Depois do 11 de setembro, a política dos EUA ficou mais dura quanto aos direitos individuais Foto: Seth Mcallister/AFP - 11/9/01

Agressão às mulheres

 (crédito: Razia Barakzai/Divulgação)
crédito: Razia Barakzai/Divulgação

A imagem dos Estados Unidos também foi maculada ante as mulheres do Afeganistão, que foram reprimidas com violência pelo Talibã, durante protesto, ontem, em Cabul. “Eles tinham que cumprir com o pacto de segurança e proteger nossas vidas, até o fim, do Talibã. Mas, saíram e nos deixaram à mercê de selvagens”, desabafou ao Correio a professora universitária e feminista Razia Barak Haidari, 26 anos, uma das organizadoras da manifestação pelos direitos das mulheres. “Eles (norte-americanos) sabiam que o Talibã odeia mulheres e que as nossas vidas estariam em perigo.”

O ato, que começou às 9h (1h30 em Brasília), reuniu cerca de 50 delas, em frente ao Palácio Presidencial de Cabul e à sede do Ministério da Defesa, perto da Ponte Mahmoud Khan, no Sexto Distrito de Cabul. “Eles (talibãs) nos cercaram e nos golpearam. Utilizaram Tasers (pistolas de choque elétrico), spray de pimenta, gás lacrimogêneo e chicotes. Três mulheres ficaram bastante feridas. “Os talibãs também nos dirigiram ofensas, nos ameaçaram de morte e disseram: ‘Vão para casa ou atiraremos em vocês’”, disse Razia. “Não queremos ser dominadas como escravas, nós lutamos para sobreviver”, desabafou.

Narges, amiga de Razia, ficou ferida ao receber uma chicoteada na cabeça. “Ela está amedrontada porque foi ameaçada de morte pelos talibãs”, relatou a ativista, que também contou ter sido agredida. “Eles me deram um soco no ouvido. Estou com fortes dores.” Razia apela por ajuda à comunidade internacional. “Pedimos que não reconheçam o governo do Talibã e que nos apoiem. Em breve, os talibãs apedrejarão todas as mulheres ativistas e educadas do Afeganistão.”.

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