Dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas no sábado (2/10) para defender o direito ao aborto, que é objeto de uma ofensiva conservadora sem precedentes nos Estados Unidos. "As mulheres deveriam poder decidir o que fazer com seus corpos, ponto", disse Laura Bushwitz, de 66 anos, professora aposentada que compareceu ao protesto em Washington. "Estou cansada que me digam o que posso ou não posso fazer (...) Ouviu, Suprema Corte?", completou.
Até agora haviam sido registrados poucos protestos desde que entrou em vigor, em 1º de setembro, uma lei no Texas que proíbe praticamente todos os abortos no estado, o que provocou uma guerra judicial e um contragolpe no Congresso. A dois dias do reinício das audiências na Suprema Corte de Justiça, que arbitrará a disputa, quase 200 organizações convocaram os defensores dos direito ao aborto para manifestações em todo o país.
O principal evento aconteceu em Washington D.C, onde 10.000 pessoas se reuniram e caminharam até o principal tribunal do país, que há quase 50 anos reconheceu o direito ao aborto na sentença do caso Roe vs Wade. A Suprema Corte, que teve a composição drasticamente alterada pelas nomeações de juízes conservadores pelo ex-presidente Donald Trump, parece pronta agora para alterar a norma.
O tribunal se negou a intervir em caráter de urgência para bloquear a lei do Texas e poderia aproveitar a revisão de uma restritiva do estado do Mississippi para mudar sua jurisprudência. Também foram organizados enventos nas capitais do Texas e Mississippi - Austin e Jackson, assim como em Nova York e outras 600 cidades do país, de Chicago a San Francisco. "Tentamos demonstrar que somos um grupo forte e unido de pessoas que não ficarão caladas quando surgirem proibições absurdas do aborto como a do Texas", disse Juliette O'Shea, de 17 anos, que mobilizou quase 30 adolescentes que participaram no protesto em Nova York.
"Lutamos para que o aborto não apenas seja legal, mas também acessível e sem estigmas", afirma um comunicado divulgado pela organização dos protestos. As ativistas desejam que o Congresso estabeleça o direito ao aborto na lei federal com o objetivo de protegê-lo de uma possível reversão na Suprema Corte. Um projeto de lei neste sentido foi aprovado na semana passada na Câmara de Representantes, controlada pelos democratas, mas não tem chance de triunfar no Senado, onde os republicanos podem bloquear o texto.
Desejo patriarcal
Uma primeira "Marcha das Mulheres" aconteceu em 2017, pouco depois da posse do presidente Trump e reuniu milhões de opositores do republicano, que o chamaram de sexista. Marchas posteriores tiveram menos participantes, em parte porque uma de suas promotoras foi acusada de antissemitismo. A presidente da organização Planned Parenthood, Alexis McGill Johnson, contou em Washington a história de uma mulher do Texas que teve que dirigir sozinha por mais de 2.000 quilômetros até o Colorado para abortar, por medo de que qualquer acompanhante poderia ser processado. “Onde quer que você esteja, esta luta está na sua porta hoje", disse.
Ela também denunciou que a mudança no Salão Oval (da Casa Branca) não acabou o desejo politizado, perverso e patriarcal de controlar nossos corpos", acrescenta a nota, em referência à vitória de Joe Biden na eleição presidencial de 2020, que não mudou a dinâmica nos estados. Pelo contrário, estimulados pela entrada na Suprema Corte de três magistrados designados por Trump, legisladores conservadores locais iniciaram uma verdadeira ofensiva contra o direito ao aborto: desde 1º de janeiro, 19 estados aprovaram 63 leis restritivas.
Se a Suprema Corte anular a sentença do caso Roe vs Wade, todos os estados ficariam livres para proibir ou permitir os abortos. Desta maneira, 36 milhões de mulheres em 26 estados, ou quase metade das mulheres americanas em idade reprodutiva, provavelmente perderiam o direito a abortar, segundo um relatório divulgado pela Planned Parenthood.
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