Após um fim de semana sem avanços diplomáticos para evitar uma invasão russa à Ucrânia, líderes ocidentais buscam novas alternativas para aumentar a pressão sobre o presidente Vladimir Putin e aliviar o clima de tensão acerca de iminentes confrontos militares. Alemanha e Reino Unido devem, nesta semana, aumentar os esforços em prol de uma desescalada das tensões. Os Estados Unidos, por sua vez, sustentam a informação de que a invasão deve acontecer "a qualquer momento" e garantem que ele e os aliados responderão "rapida e decisivamente" às investidas de Moscou.
Em conversa, ontem, com o colega ucraniano, Volodimir Zelensky, Joe Biden concordou em insistir em "diplomacia e dissuasão" frente à Rússia e firmou o seu compromisso "com a soberania e a integridade territorial da Ucrânia", informou a Casa Branca, em comunicado. De acordo com Kiev, durante o telefonema de 50 minutos, também foi feito um convite para que o presidente americano visite o país nos próximos dias, em mais uma demonstração de apoio ao povo ucraniano. Washington não confirmou a informação.
A conversa entre Biden e Zelensky ocorreu um dia depois de um telefonema entre o presidente americano e Vladimir Putin cujo teor não despertou "motivos para otimismo", segundo a Casa Branca. Antes, Putin havia conversado com o presidente francês, Emmanuel Macron. Na ligação, o russo acusou os Estados Unidos de estarem fazendo "especulação provocativa" e reclamou "das entregas em larga escala de armamento moderno a Kiev".
Washington nega estar fazendo "histeria", como classificou também o Kremlin. De acordo com informações divulgadas em meios de comunicação americanos, autoridades do governo acreditam que a próxima quarta-feira será um "dia-chave", quando provavelmente serão iniciadas as hostilidades. O dado teria vazado de relatórios de espionagem. Autoridades como Jake Sullivan, o conselheiro de Segurança Nacional, e John Kirby, porta-voz do Pentágono, se recusaram a confirmar a data. Kirby, porém, garantiu, em entrevista à rede de televisão americana Fox, que o ataque russo à Ucrânia ocorrerá "a qualquer momento".
"Ponto crítico"
Sem sinais de consenso, o governo britânico anunciou que o primeiro-ministro Boris Johnson "fará um novo esforço diplomático, durante esta semana, para desativar a crise". Johnson, que há duas semanas visitou Kiev em demonstração de apoio, manterá conversas com outros líderes e está interessado especialmente em dialogar com os países nórdicos e bálticos, segundo comunicado de seu gabinete. "A crise na fronteira da Ucrânia chegou a um ponto crítico", declarou um porta-voz do primeiro-ministro, em nota. "Toda a informação que temos sugere que a Rússia estaria planejando uma invasão da Ucrânia a qualquer momento. Isso teria consequências desastrosas tanto para a Ucrânia quanto para a Rússia", acrescentou.
O anúncio foi feito horas depois de o ministro da Defesa britânico, Ben Wallace, comentar, ao jornal The Sunday Times, que alguns países ocidentais não têm sido suficientemente duros com Moscou. Além disso, Wallace afirmou que havia um "cheiro de Munique" nos esforços diplomáticos para tentar desescalar a crise, em alusão ao acordo que permitiu à Alemanha nazista anexar os Sudetos em 1938, mas fracassou em evitar a guerra.
A declaração enfureceu Kiev. "Não é o melhor momento de ofender nossos parceiros no mundo", enquanto "há pânico por todos os lados, tanto na população quanto nos mercados financeiros", reagiu o embaixador ucraniano no Reino Unido, Vadim Pristaiko. No sábado, o presidente Volodimir Zelensky criticou o clima de pânico criado por informações sobre a iminência da invasão, mas não descartou que se prepara para um possível ataque russo.
O ministro da Defesa ucraniano, Oleksii Reznikov, informou, ontem, em sua página oficial do Twitter, que Kiev, até então, havia recebido quase 1.500 toneladas de munição de aliados entregues em 17 voos, incluindo cerca de 180 toneladas dos Estados Unidos. Nos dois últimos finais de semana, civis receberam treinamento militar para que reajam caso ocorra a invasão. A estimativa é de que haja mais de 100 mil soldados russos na fronteira com o país.
No sábado, o governo americano anunciou a retirada de quase todos seus soldados que estavam na região. No mesmo movimento, ontem, o Ministério canadense da Defesa declarou que decidiu "realocar temporariamente" para outra área da Europa parte de seu pessoal militar destacado na Ucrânia. Em um comunicado, o órgão informou que a transferência "não significa o fim da missão" dos militares canadenses, mas permite ao país "reorientar" seus esforços sem deixar de garantir a segurança de suas tropas.
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Alemanha entra em campo
Com viagem para Kiev prevista para hoje e ida a Moscou marcada para amanhã, o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, vai se somar aos esforços diplomáticos para impedir uma invasão russa à Ucrânia. Criticado por, até o momento, não ter se posicionado firmemente sobre a crise internacional, o governo alemão deve pressionar o presidente russo, Vladimir Putin, a recuar. Scholz advertiu, ontem, que a situação é "crítica e muito perigosa" e, caso o ataque aconteça, a reação do Ocidente será "imediata".
"Uma agressão militar, que poria a soberania e a integridade territorial da Ucrânia em risco, levaria a sanções duras, que preparamos cuidadosamente e poderemos aplicar imediatamente com nossos aliados na Europa e na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte)", alertou. A declaração foi dada logo após confirmada a reeleição do presidente Frank-Walter Steinmeier. O social-democrata, que é próximo a Scholz, manteve o tom firme contra Moscou. "Lanço um apelo ao presidente Putin: afrouxe a corda do pescoço da Ucrânia! E busque conosco a forma de preservar a paz na Europa", afirmou.
Na Alemanha, o cargo de presidente é sobretudo protocolar, mas o fato de seu titular, uma figura respeitada, fazer esse tipo de afirmação também é uma tentativa de deixar clara a posição do país, por vezes acusado de ser complacente com Moscou. "Já é hora de a Alemanha tirar seus óculos russos em (...) sua política em relação à Ucrânia, pois turvam a visão", criticou, também ontem, o embaixador ucraniano em Berlim, Anrij Melnyk, durante entrevista à rádio pública alemã.
Diálogo firme
Fazendo alusão a um "distanciamento" crescente da Rússia em relação à Europa, Steinmeier, que esteve à frente da diplomacia alemã durante anos, pediu firmeza frente a Moscou. "Como vemos, a paz não pode ser dada como certa. Sempre se tem que agir para preservá-la, no diálogo. Mas, quando for necessário, é preciso dizer as coisas claramente, mostrando dissuasão e determinação", frisou o presidente.
Sob condição de anonimato, uma fonte oficial do governo alemão disse à imprensa que a preocupação quanto a uma eventual invasão à Ucrânia aumentou nos últimos dias. "Pensamos que a situação é crítica, que é muito perigosa (…) Muitos elementos apontam, de forma muito preocupante, na direção dos temores atuais", disse. A Alemanha se nega a enviar armas "letais" à Ucrânia, sob o argumento de que respeita política instaurada, no país, após a Segunda Guerra Mundial que proíbe esse tipo de vendas em áreas de conflito.