Crise internacional

Manobra de Putin acirra a tensão

Presidente russo reconhece a independência de duas repúblicas separatistas no leste da Ucrânia e autoriza o envio de soldados à região para garantir a paz. EUA anunciam as primeiras sanções, e União Europeia promete respostas firmes

Correio Braziliense
postado em 22/02/2022 00:01

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, deu novo passo que dificulta um desfecho diplomático à crise instalada com líderes ocidentais e o governo ucraniano. Depois de acompanhar, no domingo, exercícios nucleares com mísseis balísticos, o dirigente russo reconheceu a independência das repúblicas separatistas pró-Rússia de Donetsk e Lugansk, áreas que saíram do controle de Kiev em 2014 e são cenário de confrontos desde então, e ordenou o envio de mais homens à região alegando que eles trabalharão pela manutenção da paz.

Para países ocidentais, essa pode ser uma manobra de Moscou para intensificar os combates já acirrados na região e usar isso como pretexto para invadir o vizinho. Por isso, líderes reagiram imediatamente à decisão de Putin, anunciada em rede nacional de televisão. Os Estados Unidos divulgaram as primeiras sanções, com possíveis impactos econômicos, e a França pediu uma reunião de emergência do Conselho de Segurança das Nações Unidas para discutir o que classifica como uma "violação unilateral dos compromissos internacionais da Rússia e uma violação da soberania ucraniana". Até o fechamento desta edição, a data da reunião não havia sido decidida. A presidência rotativa do Conselho é ocupada atualmente pela Rússia.

A avaliação de Kiev e de líderes do Ocidente é de que a decisão de Putin viola os acordos de Minsk, firmados em 2015 entre ucranianos e russos, sob intermediação de Alemanha e França, para garantir a paz na fronteira entre os dois países, o que, segundo especialistas, nunca aconteceu de fato. Ontem, ao declarar a independência das áreas separatistas e assinar "acordos de amizade e ajuda mútua" com elas, Putin pode ter enterrado a saída pacífica.

Isso porque o dirigente russo também autorizou o envio de mais homens à região — há mais de 190 mil na área, segundo os EUA e aliados —, sinalizou planos de construir bases militares nesses locais e falou abertamente sobre o acirramento dos confrontos. "Quanto àqueles que tomaram o poder em Kiev e o mantêm, exigimos que parem imediatamente as operações militares. Caso contrário, toda a responsabilidade por mais derramamento de sangue recairá sobre a consciência do regime em território ucraniano", disse.

Segundo o dirigente, a Ucrânia tem um "governo fantoche" do Ocidente e representa uma ameaça à Rússia. Ele justificou a decisão tomada usando uma série de argumentos históricos e alegou que as terras ancestrais do leste ucraniano são russas. "A Ucrânia é parte integrante da nossa história", enfatizou, afirmando, em seguida, que Kiev não foi capaz de formar um estado sólido desde o fim da União Soviética e que, por isso, depende de países estrangeiros.

Frente internacional

O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, convocou o Conselho de Segurança e Defesa Nacional e conclamou uma reunião "imediata" do Conselho de Segurança da ONU. Em uma frente internacional, a França, que é membro do conselho, fez o mesmo pedido, e o presidente Emmanuel Macron defendeu a aplicação de "sanções europeias seletivas" contra Moscou. Macron e o chefe de governo alemão, Olaf Scholz, assumiram o papel de mediadores no conflito do leste da Ucrânia e têm conversado com Putin sobre a crise internacional nos últimos dias. Segundo o Kremlin, o presidente os comunicou sobre a decisão de ontem, e eles "expressaram decepção" com o anúncio.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, afirmaram, pelo Twitter, que a União Europeia (UE) reagirá "com firmeza" ao que considera uma "flagrante violação do direito internacional". Após uma reunião de chanceleres em Bruxelas, o chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, afirmou que vai colocar "o pacote de sanções na mesa dos ministros europeus".

O Reino Unido prometeu para hoje a ativação de sanções contra a Rússia em resposta à "violação do direito internacional e ataque à soberania e à integridade territorial da Ucrânia", disse a chefe da diplomacia britânica, Liz Truss. Na avaliação do primeiro-ministro Boris Johnson, a decisão de Putin não é um bom "presságio" para a atual crise internacional e há "indícios de que as coisas evoluem em uma direção ruim na Ucrânia".

Foco econômico

Mais rápido nas retaliações, Washington anunciou as primeiras sanções contra as regiões separatistas da Ucrânia. Entre elas, estão a proibição de "novos investimentos, comércio e financiamento por parte de americanos de, para ou nas regiões" pró-russas de Donetsk e Lugansk, segundo a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki. Em caso de invasão à Ucrânia, essas medidas serão somadas a outras mais "severas" que têm sido preparadas em coordenação com os aliados, completou Psaki. A Casa Branca também qualificou como "violação flagrante" dos compromissos internacionais a decisão anunciada por Putin.

O presidente Joe Biden conversou, por telefone, com Volodimir Zelensky e, segundo a Casa Branca, "reafirmou o compromisso dos Estados Unidos com a soberania e a integridade territorial" da Ucrânia. O líder americano também atualizou o ucraniano sobre as sanções que estão sendo definidas e garantiu que vai responder "rapida e decisivamente, em sintonia com seus aliados e parceiros, a novas agressões russas contra a Ucrânia". Os EUA também se mostraram abertos a uma solução diplomática à crise até que a Rússia inicie a invasão à Ucrania.

Em paralelo ao anúncio do Putin, os moradores das regiões separatistas relatam as consequências do acirramento dos confrontos. "É a guerra, a verdadeira", disse Tatiana Nikulina à agência AFP. A mulher de 64 anos está entre os evacuados da região de Donetsk para a cidade russa de Taganrog. A saída dos civis da região foi recomendada por Moscou na semana passada e também é avaliada por especialistas como um forte indicativo da decisão russa de invadir a Ucrânia.

 

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