A imagem de caças e helicópteros sobrevoando instalações das estruturas críticas da Ucrânia e disparando mísseis como um videogame, sem nenhuma resistência de tropas em terra, não é percebido emocionalmente por nossa população.
É natural, pois são mais de 10.000km entre Brasília e Kiev, e a distância se transforma em um escudo físico que aplaca temores. Ainda assim, quando temos contato com as notícias de que um estado europeu ataca outro estado europeu, após mais de 70 anos de fim da Segunda Guerra Mundial, resta uma inquietação sobre os fatos e a pergunta: o que os levou a um enfrentamento que já faz correr sangue de ambos os lados?
Analistas de relações internacionais tentam montar o quebra-cabeça, mas lhes faltam peças para concluir o quadro. O mundo do século 21 foge dos parâmetros sob os quais nos acostumamos a viver após a vitória aliada em 1945.
Meio século de Guerra Fria, com o esfacelamento da URSS, a queda do muro de Berlim e a abertura do canal diplomático com a República Popular da China sinalizaram o sucesso da águia americana. Segundo Francis Fukuyama, o fim da história.
Com a virada do século, a Organização das Nações Unidas (ONU) foi perdendo relevância, as nações começaram a se voltar para seus interesses internos e um nacionalismo que estava adormecido ressurgiu como inspiração a cada uma delas.
A China assume o posto de rival dos Estados Unidos em todos os campos do poder, e a bipolaridade, adormecida, novamente se faz presente com as cores das bandeiras trocadas. A Rússia, ferida em seus brios e espírito dominador, encontra em Vladimir Putin o renascimento de uma liderança que a leve a se projetar globalmente.
Como prova da virilidade como nação, ela encaminha sua diplomacia rumo ao acirramento das relações com o Ocidente e a uma trégua com a China. Diante da liberdade de ação conquistada, a Rússia avança sobre o território perdido em 1991, testando as respostas que o mundo terá para oferecer.
A tomada da Crimeia em 2014, que ficou sem revide pelo Ocidente, serviu para estímulo à invasão que assistimos agora. Até o momento, Putin tem obtido êxito em suas investidas. Precisaremos aguardar e identificar se haverá um limite para essa expansão, e quem o imporá.
É nesse contexto que o Brasil precisa encontrar uma postura equilibrada para continuarmos buscando uma hegemonia ao menos regional e com certa influência nas decisões de âmbito mundial.
Cientes, resignadamente, de que as nossas potencialidades ainda não nos permitem enfrentar esses atores poderosos que hoje dominam o cenário mundial da geopolítica.
As bombas continuam a serem jogadas sobre a Ucrânia e distintos movimentos são percebidos em todos os quadrantes do globo. A favor ou contra, mas ninguém está imóvel. Trata-se apenas do primeiro capítulo da história.
Nós, como nação que aspira relevo, não devemos pagar para ver cartas contra as quais não temos fichas para bancar. Precisamos construir com as nossas próprias potencialidades a estrada pavimentada que nos levará ao futuro em benefício da nossa sociedade. Com um olho no gato e outro no rato. Paz e bem!
*Otávio Santana do Rêgo Barros - General de Divisão da Reserva
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