Há um argumento convincente de que o poder das nações é organizado em termos de quem conta com mais conexões. Mais do que isso, há ainda mais poder e responsabilidade em quem controla essas conexões. Governar tem a ver com as ferramentas de ligação, direcionamento e escoamento.
Em termos de alianças militares, sistema financeiro, multinacionais e tecnologias digitais de informação, os EUA detêm uma vantagem enorme. Especialmente quando esses quatro pilares se unem em torno de um objetivo, fica clara a assimetria de poder que existe no mundo.
Quando Putin decidiu usar mais uma vez a violência para afirmar a supremacia russa perto de sua fronteira, ficou exposta sua fragilidade como estado no mundo atual. Mostrou também a fragilidade de como um gigante de 45 milhões de habitantes como a Ucrânia está às expensas da agressão de um país maior e com superior poderio militar.
Mostrou, mais ainda, que estamos num mundo em que até um Estado poderoso, como a Rússia, pode ser neutralizado por quem controla mais conexões internacionais críticas. As quais são justamente alianças militares, sistema financeiro, multinacionais e tecnologias digitais de informação. Putin entrou em um beco com poucas saídas.
Afinal, a Rússia é gigante, mas, como tem muito poucas conexões e está relativamente exposta a conexões que não controla, vive a angústia de ser um gigante obsoleto. A Rússia pode sobreviver isolada, mas seria um experimento atroz para a população russa e os nervos de seus vizinhos.
Em última análise, a força é dos EUA, porque eles conseguem articular uma visão mais inclusiva, livre, respeitosa e cooperativa de ordem mundial. Agem a partir do seu sistema de alianças, mantendo melhores conexões, com clara preocupação democrática. Por isso mesmo, cuidado, não se combate autoritarismo com autoritarismo.
Nem é prudente se misturar um confronto de violência real — Rússia contra Ucrânia — com outros desconfortos, a fim de se resolver, de uma vez por todas, "tudo que está errado no mundo". A democracia pode mesmo sair mais forte desse imbróglio, desde que não passe da conta.
Na guerra atual, os EUA estão aprendendo o que querem sobre o funcionamento do mundo, enquanto os demais países aprendem o que podem.
O mundo hiperconectado padece da falta de convers, inundado de falatório demais em Twitter e afins e parco em diálogos, como se o mundo estivesse ficando mais burro.
Uma das mais alvissareiras notícias da semana é a de que altos encarregados de assuntos estratégicos da China e dos EUA se encontraram longamente em Roma. E dias depois, na sexta-feira, ocorreu uma conversa, à distância, entre Biden e Xi.
A conversa de Roma dá mais perspectiva nesse imbróglio. Conta a história que a partir de Roma, exércitos liderados por líderes de ímpeto expansionista formaram um império que se expandiu até a Grã-Bretanha. Eventualmente, foram empurrados de volta por vários povos "bárbaros" que estavam ou insatisfeitos com a invasão de suas terras ou com suas próprias índoles expansionistas afloradas. Roma viu também a fragilidade de ditadores e desavenças que resultam em cismas.
Enquanto a Rússia busca conseguir o que quer com violência, há um teste, por parte dos EUA, sobre o que é possível ser alcançado, em termos de mudança de regime e de comportamento, com sanções e punições "não-violentas". De toda forma há uma continuidade, gradações, em direção a ações mais violentas.
Apesar de a lógica ser antiga e se manifestar na estratégia dos EUA de manterem um balanço favorável de aliados militares, além da vasta superioridade militar que o país possui, é uma demonstração de como todas as conexões digitais e financeiras podem ser usadas como alavanca para parar um adversário.
A Ucrânia resiste, também, porque tem uma rede de apoio internacional que cresce, à medida que a opinião pública se inflama com notícias da desumanidade da guerra. Mas o conflito, desnecessário e destruidor, não precisa de mais envolvidos.
A China, apesar de extremamente conectada com o mundo em termos de negócios, não é um país que baseia suas relações em alianças militares. Especula-se sobre a extensão de seu acordo com Moscou, mas não parece razoável tentar "enquadrar" Pequim.
Afinal, no limite, a China também pode sobreviver isolada. Mas, por várias razões, não parece ser inteligente forçar tal situação. É, na verdade, uma oportunidade para EUA e China trabalharem juntos para resolver um problema. O problema são as barreiras à compreensão mútua.
Quando os países se entendem, ferramentas funcionam, a escassez diminui e o bem-estar aumenta. Quando a falta de entendimento impera, há um redirecionamento de recursos em direção a conflitos.
Com Henrique Delgado
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