Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (órgão executivo da União Europeia), escolheu a dedo o figurino para fazer um anúncio simbólico. Vestida de amarelo e azul, as cores da bandeira ucraniana, ela sinalizou apoio à candidatura de Kiev para a adesão ao bloco. "Ucrânia, Moldávia e Geórgia compartilham a forte e legítima aspiração de aderirem à União Europeia (UE). Estamos enviando a eles um sinal claro de apoio às suas aspirações", declarou.
"A Comissão recomenda ao Conselho Europeu, em primeiro lugar, que dê à Ucrânia uma perspectiva europeia e, em segundo lugar, que lhe conceda o estatuto de candidata. (...) Nós confirmamos que o povo da Ucrânia pertence, em devido tempo, à UE. Os próximos passos estão nas mãos de nossos países-membros", acrescentou Von der Leyen. "Sabemos que os ucranianos estão dispostos a morrer para defender suas aspirações europeias. Queremos que vivam conosco, pelo sonho europeu."
Horas depois do anúncio em Genebra, o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, visitava Kiev pela segunda vez desde o início da invasão, em 24 de fevereiro. O líder britânico chegou de surpresa à capital ucraniana, onde se reuniu com o presidente Volodymyr Zelensky. Johnson se ofereceu para lançar um grande programa de formação das forças ucranianas, com a previsão de formar até 10 mil soldados a cada 120 dias. Em entrevista coletiva, Zelensky afirmou que ambos discutiram a situação atual no front, no leste e no sul da Ucrânia, assim como as capacidades de proteção do país ante a "ocupação russa". "Em particular, falamos sobre a necessidade de aumento do suprimento de armas pesadas. A principal coisa, hoje, é fornecer defesa aérea para a Ucrânia. Começamos a mover nessa direção", comentou Zelensky. Na quarta-feira, o chanceler alemão, Olaf Scholz; o presidente francês, Emmanuel Macron; e o primeiro-ministro da Itália, Mario Draghi, também estiveram em Kiev.
Zelensky reagiu às declarações de Von der Leyen por meio do Twitter. "Estou grato pelos líderes da UE pela fé no futuro europeu da Ucrânia", escreveu, ao classificar a decisão como "histórica". Na próxima quinta-feira, os 27 países-membros da UE se reunirão, em uma cúpula de dois dias, para apreciar o pedido de candidatura da Ucrânia, o qual precisa ser aprovado por unanimidade. Caso isso aconteça, abre-se um período de longas negociações entre Kiev e Bruxelas para a adesão.
Na quinta-feira, Scholz, Macron e Draghi externaram apoio à adesão. "A Ucrânia faz parte da família europeia", afirmou o chanceler alemão. "Nós apoiamos o status de candidato imediato à adesão", complementou o francês.
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Prematuro
Para Peter Zalmayev, diretor da ONG Eurasia Democracy Initiative (em Kiev), é cedo para avaliar o significado do apoio da Comissão Europeia à candidatura da Ucrânia. Ele crê que o organismo buscará adiar a discussão e esperar que algum país-membro, como a Hungria, bloqueie a adesão da Ucrânia. Ele lembra que a Holanda também demonstra ceticismo en relação a uma possível candidatura ucraniana. "Do ponto de vista simbólico, é um sinal importante de que a Europa está pronta para ressignificar a Ucrânia como parte da civilização ocidental", afirmou ao Correio.
Zalmayev defende que o processo de adesão da Ucrânia à UE deveria ser acelerado. "Isso não vai acontecer. Uma coisa é afirmar que a Ucrânia possui uma candidatura. Outra coisa é dizer que será aceita. Tivemos um precedente que retrata a dificuldade do processo. A Turquia assinou um acordo de união aduaneira com a UE em 1995. Dez anos depois, apresentou a candidatura para entrada no bloco. Passaram-se quase três décadas e a adesão foi rejeitada", acrescentou.
Anton Suslov — analista da Escola de Análise Política (naUKMA), em Kiev — aposta que o status da Ucrânia como candidata deve ser aprovado pelo Conselho Europeu (órgão decisório da UE) em uma semana. "Não tenho dúvidas de que a decisão será positiva. O histórico anúncio da Comissão Europeia de apoiar a candidatura é da maior importância, tanto para Ucrânia quanto para a UE", disse.
De acordo com Suslov, os pontos de inflexão na história recente da Ucrânia envolveram o movimento da Rússia em relação ao Ocidente. "Na guerra, nossos homens perderam a vida pelos valores da liberdade e da democracia. A integração européia não é apenas um conjunto de reformas políticas e econômicas, mas uma escolha pela civilização", comentou o ucraniano.
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"As visitas de chefes de Estado e de governo da Europa a Kiev são um sinal de consciência sobre a necessidade de defender a Ucrânia. Ao mesmo tempo, à exceção do Reino Unido, outras nações têm mostrado relutância em fornecer o tipo e a quantidade de armamentos solicitados pela Ucrânia. A ida a Kiev de Olaf Scholz, de Emmanuel Macron, de Mario Draghi e de outros líderes é uma espécie de viagem de culpa, uma penitência. Por exemplo, a Alemanha não anunciou remessa de armas, durante visita de Scholz."
Peter Zalmayev, diretor da ONG Eurasia Democracy Initiative (sediada em Kiev)
"Não temos nada contra", diz Putin
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, assegurou que seu país não tem "nada contra" uma eventual adesão à União Europeia. "Não temos nada contra, aderir a uniões econômicas é uma decisão soberana (...). É um assunto seu, um assunto do povo ucraniano", disse o chefe do Kremlin, durante sessão plenária do Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo. "Ao contrário da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), a UE não é uma aliança militar", continuou. "No que diz respeito à integração econômica, a escolha é deles", insistiu Putin. No entanto, ele também afirmou que, se a Ucrânia for admitida na UE, "se tornará uma semicolônia" dos países ocidentais. "Esta é a minha opinião", afirmou.