Unasul à espera de Lula e Petro

Correio Braziliense
postado em 02/07/2022 00:01

O segundo semestre começa com expectativa intensa para os setores políticos que se empenham na integração política da América do Sul. Logo na primeira semana de agosto, toma posse Gustavo Petro, o primeiro presidente de esquerda na história da Colômbia. Dois meses depois, as atenções se concentram no primeiro turno da disputa presidencial no Brasil, com Lula se firmando a cada pesquisa como favorito para desalojar Jair Bolsonaro do Planalto.

A virada política em dois dos pesos-pesados consolida um rearranjo mais amplo e profundo na vizinhança. Em 2019, o nacionalismo peronista voltou ao poder na Argentina, com Alberto Fernández. No ano seguinte foi a vez de Luis Arce, eleito na Bolívia um ano depois da controversa deposição do primeiro presidente indígena, Evo Morales. Seguiram-se a vitória de Pedro Castillo, no Peru, e de Gabriel Boric, no Chile.

Em comum, na frente da política externa, todos compartilham com Lula a aspiração de retomar o processo lançado, duas décadas atrás, pelo então presidente brasileiro com os colegas da Argentina, Néstor Kirchner, e da Venezuela, Hugo Chávez. Desse impulso nasceu a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), colocada em hibernação nos últimos anos pela safra de governos de direita que reorientou a bússola diplomática do subcontinente.

Sócio novo

A chegada de Gustavo Petro, em especial, aporta densidade à esperada rearticulação da Unasul. Na altura da fundação do bloco, a Colômbia era governada pelo direitista Álvaro Uribe, aliado incondicional dos EUA — a ponto de se aliar a George W. Bush na "guerra ao terror" e aproveitar a ajuda militar americana para sua guerra local contra a guerrilha das Farc.

Dentro de um mês, a Casa de Nariño terá como titular um ex-guerrilheiro. Petro integrou o Movimento 19 de Abril (M-19), grupo armado de esquerda nacionalista que se reintegrou à vida civil em 1991, nos marcos de um acordo de paz com o governo de Cesar Gaviria. Nessas três décadas, conquistou credibilidade para sua adesão à vida política institucional, como prefeito da capital, Bogotá, deputado nacional e senador.

Mesmo com Uribe, a Colômbia não ficou à margem da Unasul, mas manteve distância prudente do bloco de esquerda que deu as cartas por década e meia. A partir de agosto, a tendência é que assuma um papel mais ativo no relançamento — à espera do retorno de Lula, com a liderança pessoal e o peso específico do Brasil.

Pré-estreia

Uma espécie de aperitivo para o que pode se desenrolar em 2023, confirmado o retorno de Lula ao Planalto, foi servido um mês atrás, na Cúpula das Américas. A reunião de Los Angeles, com Joe Biden como anfitrião, excluiu da lista de convidados Cuba, Nicarágua e Venezuela, apontados por Washington como regimes não democráticos. Em solidariedade, faltou ao encontro o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador.

Amlo, como é chamado em seu país, deu o sinal mais claro de que, ao lado da Unasul, pode voltar a campo outra cria da esquerda latino-americana na primeira década do século. A Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) foi oficialmente fundada em 2010 com o propósito de esvaziar a Organização dos Estados Americanos (OEA). Criada no pós-Segunda Guerra, sob o impulso da ascensão dos EUA como potência mundial, a OEA tem sede em Washington e, desde sempre, foi vista como braço institucional da hegemonia norte-americana no hemisfério.

Conteúdo inflamável

O time renovado da esquerda latino-americana aposta na chance de ganhar mais um reforço no Equador, onde o direitista Gustavo Lasso tem pela frente um processo de destituição aberto no Legislativo. O pano de fundo é a crise detonada por uma onda de manifestações de rua e bloqueios de estradas em protesto contra a alta dos combustíveis.

O país andino tem longa tradição de instabilidade, quase sempre com a gasolina como peça-chave. Embora produtor de petróleo, o Equador já teve a economia como um todo atrelada ao dólar, e ainda hoje sente diretamente os impactos da alta de preços no mercado internacional.

Dez anos atrás, com o esquerdista Rafael Correa na presidência, Quito foi escolhida para sediar a Unasul. Em 2018, o sucessor de Correa, Lenín Moreno, que rompeu com o antigo padrinho e começou a guinada do país para a direita, despejou a Unasul e pediu de volta o prédio público cedido para a entidade.

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